Sabia que, duas vezes por dia, o solo debaixo dos nossos pés sobe e desce ligeiramente? Embora seja impercetível para nós, este movimento chama-se maré terrestre e resulta das mesmas forças gravitacionais que criam as marés dos oceanos. Saiba mais neste artigo acerca deste fenómeno na Terra.
Um fenómeno silencioso, mas constante
É um fenómeno silencioso e discreto, mas constante. Tal como a água do mar, também a crosta terrestre responde à atração da Lua e do Sol, ainda que de forma muito mais subtil. A rigidez da litosfera faz com que esta oscilação seja mínima — apenas alguns milímetros ou, em certos casos, até 30 microns, sensivelmente a espessura de um cabelo humano.
Este efeito quase invisível no planeta Terra pode ser detetado apenas com tecnologia extremamente sensível, refere a ZAP. Um dos locais onde isso é possível é o Advanced Photon Source (APS), um acelerador de partículas localizado no Laboratório Nacional de Argonne, nos Estados Unidos. Trata-se de uma instalação científica com um anel circular de mais de um quilómetro, onde eletrões viajam quase à velocidade da luz.
Foi assim que se conseguiu observar o fenómeno
Foi aqui que o físico canadiano Louis Emery e a sua equipa conseguiram observar os efeitos diretos das marés terrestres no equipamento. Quando o solo se expande ou contrai ligeiramente, o anel do acelerador também muda de forma. Essa deformação afeta o trajeto dos eletrões, obrigando o sistema a ajustar-se automaticamente, segundo a precisão exigida.
Para controlar este processo, o APS utiliza mais de 500 sensores capazes de detetar variações minúsculas. Estes sensores ajustam o percurso dos eletrões em tempo real, garantindo a qualidade dos raios X utilizados em investigações científicas de todo o mundo.
Além disso, o sistema recorre a cavidades de radiofrequência que reenergizam o feixe de eletrões sempre que este dá uma volta completa. Quando o comprimento do anel se altera devido às marés, a frequência precisa de ser ajustada, ou o feixe desvia-se, introduzindo pequenas oscilações para se manter sincronizado com a estrutura.
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O sistema corrige as alterações a cada segundo
Segundo Emery, “quando o feixe altera a sua órbita, afeta tudo o resto”. Felizmente, o sistema está programado para corrigir essas alterações a cada segundo, mantendo uma estabilidade notável.
A descoberta das marés terrestres no APS surgiu de forma inesperada. Há mais de 20 anos, enquanto analisava dados em busca de sinais sísmicos, Emery reparou num padrão regular de correções de 12 em 12 horas. A sua conclusão foi imediata: tratava-se do efeito das marés sólidas. Além das marés, o sistema também deteta ondas sísmicas provocadas por terramotos em qualquer parte do mundo, reforçando o papel do APS como uma espécie de sismógrafo global de alta precisão.
Os efeitos são mais notórios em fases de Lua cheia ou nova
Curiosamente, durante fases da Lua cheia ou nova, em que o Sol e a Lua se alinham, os efeitos são mais acentuados e exigem correções maiores. Há ainda variações sazonais: no inverno, por exemplo, o anel pode encolher cerca de um milímetro devido à contração térmica, o que também obriga o sistema a reajustar-se.
Estes fenómenos, ainda que discretos, afetam a própria rotação da Terra. A fricção provocada pelas marés (sobretudo nos oceanos) contribui para um abrandamento gradual da rotação do planeta, fazendo com que os dias fiquem ligeiramente mais longos — cerca de 2,3 milissegundos por século
O APS não é apenas uma instalação científica. É também um sensor ultra-preciso, capaz de medir as “respirações” do nosso planeta — aquelas pequenas contrações e dilatações da crosta terrestre que ocorrem todos os dias, sem que ninguém as sinta.
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