Os conflitos relacionados com alterações feitas por proprietários em partes exteriores dos edifícios são uma temática relevante na área da habitação, sobretudo quando envolvem espaços comuns e regras de convivência em condomínio. Estes casos tornam-se particularmente sensíveis quando as obras são realizadas sem autorização formal, levantando dúvidas sobre limites legais e direitos de cada condómino.
A decisão agora conhecida da Audiencia Provincial de Málaga voltou a colocar este tema na ordem do dia ao condenar um proprietário pela realização de obras na sua varanda sem qualquer tipo de autorização dos restantes condóminos.
O tribunal concluiu que o encerramento completo da estrutura e a ampliação do telhado alteravam a configuração exterior do edifício e afetavam elementos comuns, pelo que exigiam aprovação da comunidade de proprietários e licença, de acordo com o jornal digital espanhol Noticias Trabajo.
Uma obra que mudou a imagem do edifício
De acordo com a sentença, datada de 5 de março deste ano, o proprietário tinha fechado integralmente a sua varanda com uma estrutura fixa de alumínio branco e painéis de vidro tipo Lumon. Além disso, prolongou o telhado do imóvel com painéis de chapa. A comunidade de proprietários considerou que estas intervenções modificavam a fachada comum e avançou com um pedido judicial para que a zona fosse reposta no seu estado original.
O primeiro tribunal a analisar o caso foi o Juzgado de Primera Instancia n.º 6 de Marbella, que acabou por rejeitar o pedido da comunidade. Entendeu que as obras não alteravam de forma substancial a estética do edifício e que não tinha sido demonstrado um prejuízo concreto.
Acrescentou ainda que não havia provas de que a comunidade tivesse reagido a obras semelhantes noutras frações.
Decisão revertida em segunda instância
A Audiencia Provincial de Málaga veio, no entanto, reformar esta decisão. Considerou que tanto o prolongamento do telhado como o encerramento envidraçado constituíam uma alteração estética e estrutural relevante, enquadrada nos elementos comuns do edifício. Por isso, estas intervenções só poderiam ter sido realizadas mediante aprovação prévia da assembleia de condóminos.
Na análise jurídica, o tribunal destacou os artigos 7 e 10 da Ley de Propiedad Horizontal, que regulam a realização de obras nas partes comuns e a modificação da configuração exterior. Estes artigos estabelecem que nenhum proprietário pode realizar alterações que afetem estas zonas sem autorização da comunidade, de acordo com a fonte anteriormente citada.
A sentença foi clara ao afirmar que se tratava de “un cerramiento permanente que altera la configuración exterior del edificio, incluso aunque pueda replegarse”.
Sem consentimento tácito e sem licença
A Audiencia rejeitou também qualquer possibilidade de consentimento tácito por parte da comunidade. Recordou que, apesar de a varanda ser de uso privativo, continua a integrar os elementos comuns. Além disso, não existiam autorizações prévias, licenças administrativas ou casos semelhantes que pudessem servir de precedente dentro do mesmo edifício.
Como consequência, foi determinado que o proprietário deve remover o telhado adicionado, desmontar o encerramento acristalado e devolver a varanda à sua forma original. A decisão não é ainda definitiva, uma vez que cabe recurso de cassação para o Tribunal Supremo, de acordo com o Noticias Trabajo.
Enquadramento legal em Portugal
Em Portugal, situações semelhantes são reguladas sobretudo pelo Código Civil (CC), pelo regime da propriedade horizontal e pelos regulamentos de condomínio. As regras aplicáveis encontram-se essencialmente nos artigos 1414.º a 1438.º-A do CC.
À semelhança do que determina a legislação espanhola, também em Portugal os terraços de cobertura de de uso privativo são considerados partes comuns do edifício. Assim, qualquer obra que altere a forma, a estrutura ou a estética da fachada carece de autorização da assembleia de condóminos.
O artigo 1422.º é particularmente relevante, uma vez que proíbe os condóminos de realizar obras que prejudiquem a segurança, a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício.
O CC exige ainda que intervenções significativas obtenham aprovação por maioria qualificada ou, nalguns casos, unanimidade, dependendo da natureza da obra. A execução de alterações sem autorização pode levar a ações judiciais que visem obrigar o proprietário a repor a situação anterior, tal como aconteceu no caso analisado em Espanha.















