Após dois anos de interregno, devido à pandemia da covid-19, comemora-se este ano a 69ª edição das Grandiosas Festas de Alcoutim. Foi no longínquo ano de 1952 que um grupo de homens influentes e com poder na vila de Alcoutim, apoiados pela dinâmica juventude local, organizaram a primeira edição deste evento cultural de cariz popular com o principal propósito de angariar fundos a favor da Santa Casa da Misericórdia para a construção de um hospital sub-regional em Alcoutim.
Das primeiras edições destaca-se todo o cuidado que houve em lançar um evento que se destacasse no panorama regional, que fosse atrativo, que promovesse esta vila raiana do interior algarvio, fomentando a cultura e o desporto e ao mesmo tempo servisse para angariar os fundos necessários para a construção de um hospital. O pontapé de saída foi dado com a redação de uma circular a fazer um peditório para a organização das festas, explicando o propósito maior e enviada a diversas entidades e personalidades. Outra atividade seguindo este objetivo foi a organização de um peditório feito no concelho, povoação a povoação, porta a porta. Neste peditório reuniam-se grandes quantidades de géneros que eram transportados em veículos e davam entrada na vila em cortejo acompanhados por grupos de cantares e danças regionais representando todas as freguesias do concelho. A venda desses géneros resultava a favor da Santa Casa da Misericórdia.
Das primeiras edições recordam-se, os mais seniores, da batalha de flores no Rio Guadiana, com exibição de dezenas de barcos vistosamente engalanados, das provas desportivas (travessia do Guadiana a nado, corridas de canoas, provas de atletismo, gincanas, jogos de futebol, torneios de tiro aos pratos) e outras atividades náuticas como o pau de sebo, apanha do pato, etc… As festas eram marcadas pela quermesse, pelo baile, pelos concertos com grupos e artistas afamados, ranchos folclóricos nacionais e estrangeiros. Outra das grandes atratividades, ainda atual, são os deslumbrantes fogos de artifício, presos e aquáticos, valorizados pelo cenário proporcionado pelo Rio Guadiana, resultando em grandes espetáculos pirotécnicos que ficam na retina de quem os assiste. Ainda desses tempos, se destaca dos folhetos e cartazes as seguintes publicações e que testemunham o contexto histórico e social de então: “Vistosas iluminações!”; “No recinto da festa funcionará uma excelente aparelhagem sonora e haverá um esmerado serviço de bufete e bar.”; “Foram concedidas facilidades de fronteira…”. É necessário relembrar que Alcoutim só teve eletricidade em 1965 e o posto fronteiriço normalmente encontrava-se fechado e vigiado pelas autoridades do Estado Novo.
Para organizar este evento foi criada uma comissão de festas bem estruturada, onde assumiram todas as responsabilidades, inerentes ao evento, o presidente da Câmara, o provedor da Santa Casa da Misericórdia e o tesoureiro da Fazenda Pública. A primeira comissão foi encabeçada pelo professor José Maria Mendes Amaral, então presidente da Câmara, seguido pelo Dr. João Dias, provedor da Santa Casa, por Manuel Serafim, Luís de Jesus Brito, António Monteiro Robalo, Arnaldo Fagundes Peres, Mário Augusto Pires, José Manuel Dórdio Godinho, tenente Francisco Neto Júnior, Alfredo Lopes, Manuel Pedro Martins e Fernando Lopes Dias. Esta comissão liderava seis outras comissões com funções e responsabilidades bem distintas, a saber: comissão de Música e Baile, com quatro elementos; comissão de Bufette, com oito elementos; comissão de Desportos, com quatro elementos; comissão de Quermesse, com sete elementos; comissão de Propaganda, com seis elementos; e a comissão de Donativos com onze elementos.
A comissão central contratava os artistas, elaborava o programa, redigia e enviava as circulares a pedir apoios, efetuava todos os pagamentos e arrecadava as receitas, realizando as contas finais, além de coordenar todas as outras comissões. As subcomissões eram responsáveis por todo o trabalho que lhes era confiado em prol dos objetivos, obedecendo sempre à comissão central sem poderem assumir despesas. Apesar desta estrutura organizativa, que parece rígida, os testemunhos orais, de quem viveu esses tempos, relembram que toda a população era envolvida na preparação do evento. Os serões em Alcoutim, nas noites quentes de verão, passaram a ser ocupados com os preparativos para as Festas e isso era grande motivo de orgulho para a população.
Com a morte do Sr. Manuel Serafim e do Dr. João Dias, em 1953 e 1955, respetivamente dois dos importantes timoneiros, a organização ressentiu-se, contudo conseguiu ir realizando o evento e adaptando-se às novas realidades sociais e políticas. Em 1989 os Bombeiros Voluntários tornam-se parceiros na organização das Festas e pouco tempo depois assumiram essa responsabilidade por inteiro. Desde o ano de 1998 até ao presente as Festas passaram a ser organizadas totalmente sob a responsabilidade da Câmara Municipal de Alcoutim.
As Festas de Alcoutim têm já uma longa história e tradição, como o principal evento que se realiza neste concelho ao longo do ano, servindo como cartão de visita da vila. Atualmente, são entendidas como um acontecimento importante na promoção cultural e turística de Alcoutim, são um local de encontro intergeracional, transfronteiriço e de reunião de famílias, além da importância económica para a hotelaria e restauração locais. Nos últimos anos as Festas modernizaram-se, adaptaram-se aos novos tempos, com vários palcos, com concertos e espetáculos em diferentes espaços da vila, alargando as Festas a toda a área urbana. As Festas de Alcoutim são conhecidas em todo o Algarve, Baixo Alentejo e parte da Andaluzia e costumam encerrar a época das festas populares e festivais de verão no Sul do país. Este ano será o regresso depois da pandemia e vai, com toda a certeza, ser um grande sucesso.
Venha conhecer este evento se ainda não conhece!
Venha matar saudades e rever amigos, se já conhece!
- Artigo publicado no Caderno de Alcoutim do POSTAL de agosto.