Uma reformada espanhola foi obrigada a devolver 22.918,80 euros à Administração dos Serviços Sociais da Junta de Castilla y León e acabou por perder a pensão depois de uma revisão administrativa detetar que a sua unidade económica de convivência tinha rendimentos muito superiores aos permitidos por lei. O caso chegou aos tribunais, mas acabou por confirmar o entendimento inicial da administração.
De acordo com o portal espanhol Noticias Trabajo, o processo começou quando os serviços sociais analisaram novamente a situação económica da beneficiária, que recebia uma pensão de reforma não contributiva desde 2015. Este tipo de apoio destina‑se a pessoas com carência de rendimentos e mais de 65 anos, sendo revisto periodicamente para garantir que os critérios continuam a ser cumpridos.
A importância do agregado familiar
Durante essa revisão, as autoridades verificaram que o nome do filho da pensionista estava inscrito no Padrón Municipal no mesmo domicílio desde 2020. Esta informação levou à inclusão dos seus rendimentos no cálculo da unidade económica de convivência, alterando por completo o valor total considerado para efeitos de elegibilidade à pensão não contributiva.
Ao somar os rendimentos dos dois, a administração concluiu que os limites legais tinham sido largamente ultrapassados. A prestação foi então declarada extinta e deu‑se início ao processo para recuperar os montantes recebidos desde o ano em que o filho passou a constar como residente, num total de 22.918,80 euros.
Valores muito acima dos limites
Segundo o acórdão, os rendimentos declarados pelo filho foram altamente determinantes. Em 2020, o agregado acumulou 74.612,14 euros, quando o limite legal de acumulação para beneficiar da pensão não contributiva era de 23.538,20 euros. Nos anos seguintes, a situação repetiu‑se: em 2021, o agregado declarou 79.206,19 euros (limite de 23.966,60 euros); em 2022, 79.905,75 euros (limite de 25.073,30 euros); e em 2023, novamente 79.905,75 euros, com um limite de 28.834,30 euros. Em todos os anos, o máximo permitido foi excedido de forma expressiva.
A pensionista contestou, alegando que o filho não vivia realmente na morada indicada e que apenas constava no registo municipal. Para tentar provar isso, apresentou documentos relativos a compras e movimentos bancários que, na sua perspetiva, demonstrariam a existência de outra residência habitual.
O peso do Padrón Municipal
Contudo, tanto o Juízo do Trabalho n.º 1 de Segóvia como o Tribunal Superior de Justiça de Castilla y León rejeitaram esses argumentos. Para os magistrados, o Padrón Municipal é um documento público e fiável: nos termos da Lei 7/1985, Reguladora das Bases do Regime Local, os seus dados “constituem prova da residência no município e do domicílio habitual no mesmo”, e as certidões padronais têm caráter de documento público e fidedigno, salvo demonstração clara em contrário.
A pensionista não conseguiu apresentar elementos que contrariassem essa presunção. O facto de o filho trabalhar a partir de casa, em regime de teletrabalho, também não foi visto como argumento válido para afastar a existência de uma unidade económica de convivência. O tribunal concluiu que essa circunstância “não desvirtua a presunção da unidade económica de convivência com a mãe”, validando assim o critério usado pela administração para somar os rendimentos.
Decisão final
Com os rendimentos comprovados e a convivência presumida, o tribunal manteve a decisão administrativa: a mulher perde a pensão de reforma não contributiva e terá de devolver os 22.918,80 euros recebidos desde 2020. Só poderá recuperar o direito à prestação se, numa futura revisão, voltar a cumprir os critérios económicos definidos pela lei para as pensões não contributivas.
De acordo com o Noticias Trabajo, o caso tornou‑se particularmente relevante pela forma como sublinha o impacto de um simples registo no Padrón Municipal. De acordo com a legislação espanhola, a inscrição neste registo administrativo constitui prova da residência habitual e do domicílio no município, podendo ser determinante para definir a unidade económica de convivência e, por consequência, o agregado considerado para efeitos de cálculo da pensão.
E em Portugal?
Também por cá, os beneficiários de prestações sociais podem perder apoios se o rendimento do agregado ultrapassar os limites legais. Em vários programas, como o Complemento Solidário para Idosos ou a Tarifa Social de Energia, a morada fiscal e a composição do agregado familiar são elementos fundamentais na avaliação da condição de recursos, com base em cruzamentos automáticos entre dados da Autoridade Tributária e da Segurança Social.
Situações em que familiares estão registados numa habitação sem lá viverem podem, em alguns casos, criar problemas semelhantes, ao inflacionar artificialmente os rendimentos do agregado e levar à perda ou correção de prestações atribuídas. Por isso, recomenda-se que os registos de morada e de agregado familiar estejam sempre atualizados e correspondam à realidade: um pequeno detalhe administrativo pode representar a diferença entre manter uma prestação essencial ou ter de devolver valores já recebidos.















