Foste aos Mundiais da ISA já com a cabeça posta nos Jogos Olímpicos e em ir à caça da qualificação?
Esse é sempre o objetivo, havia uma vaga, mas não era uma vaga para um atleta, ficaria para o país. E só aconteceria se, por exemplo, a equipa masculina ganhasse a classificação geral e o mesmo para o feminino. Sabíamos que ia ser um long shot, havia ótimos surfistas e não é uma competição fácil hoje em dia. Antigamente, era visto mais como uma competição muito amadora, agora, com os Jogos Olímpicos, já temos quase todos os surfistas do CT [Championship Tour] a quererem ir. E pronto, uma pessoa sabia que ia ser difícil, claro que o objetivo era sempre ganhar. Huttington Beach, infelizmente, não é das ondas que mais gosto, é difícil e complicado, um dia está bom e no outro quase não há ondas, e nestes campeonatos eles têm de estar sempre a fazer heats, não é como no CT em que podem parar um dia quando está mau. Ali não interessam as condições, a pessoa tem é de surfar, entre repescagens e main event estão sempre acontecer heats. Claramente, o objetivo era garantir a vaga para Portugal, fomos até ao último dia com essa hipótese e se o Guilherme [Fonseca] tivesse ganhado tínhamos garantido a vaga, infelizmente tanto eu como o Guilherme Ribeiro perdemos mais cedo e dificultámos um bocado o processo para garantirmos essa vaga, mas sim, fui para lá a pensar nessa vaga. Tínhamos uma boa equipa e, se calhar de fora, não parecia a equipa mais apelativa pensando nos nomes sozinhos, mas, como equipa, foi brutal. E os dois Guilhermes mostraram, sem dúvida alguma, ótimo surf, são ótimos parceiros e foi brutal. O mesmo no feminino, posso dizer que foi das melhores seleções das quais fiz parte.
Dizes isso porquê? Há bocado falávamos de ténis e é como o surf, uma modalidade muito solitária em que quase sempre se entra no mar para competir só por ti.
Acho que por causa do próprio espírito. Normalmente, viajo sozinho ou com o meu treinador, às vezes com outro surfista, mas é sempre um sentimento um bocado individual, enquanto ali não. Para começar, era preciso a equipa alcançar um objetivo conjunto para se garantir a vaga, tínhamos todos que nos dar bem, que puxar uns pelos outros para um objetivo comum. E depois, uma pessoa tem sempre ali a equipa toda a torcer e a vibrar na praia, é um espírito diferente. E quando isso acontece de uma forma saudável e porreira como foi agora, faz a diferença.
Ainda te está entalado o dia em que soubeste que tinhas covid-19 e, por isso, não irias aos Jogos Olímpicos de Tóquio?
Claro que foi uma frustração enorme, mas tentei lidar com isso da melhor forma. Não havia muito que pudesse fazer, nos tempos de covid era aquilo que era, houve pessoas a passarem bem pior do que eu, claro que aquilo era um objetivo e um sonho que ficou meio entalado na garganta, mas… era o que era, era para acontecer. Se Deus quiser hei-de estar no Taiti [em Teahupo’o, onde será a prova de surf dos Jogos de Paris, em 2024].
Nesses momentos de frustração, como fazes para mastigar e ultrapassar?
Para ser honesto, já perdi tantas vezes e as derrotas são tão mais do que as vitórias que já começo a saber lidar um bocado melhor, porque cada vez que uma pessoa perde é uma frustração brutal. E, se nos deixarmos comer e remoer por ela, então não dá para sermos competidores. Um Cristiano Ronaldo, um [Roger] Federer e um [Rafael] Nadal há 10 no mundo, um por cada desporto quase, daqueles que saem quase sempre vitoriosos. O resto, andamos ali a dar no duro a lutar pelo nosso espacinho, por aquela oportunidade de brilharmos, mas, para lá chegar, uma pessoa está sempre a perder, a ter outras frustrações, outros impasses, e temos de saber digerir e canalizar isso de uma forma positiva para continuarmos a ter alento para trabalhar e continuar a sonhar.
Ainda por cima no surf, que tem muitos altos e baixos. Há um ano estavas a acabar o anterior circuito mundial no top 10 do ranking.
Exatamente, o surf é lixado porque não dependemos só de nós. Não temos aqui um campo, duas balizas e as linhas não vão fugir nem mudar enquanto estamos a correr, nem temos outros 10 parceiros de equipa que nos podem um bocado safar o pelo quando não estamos tão bem. Aqui não, ou está maré cheia ou vazia, de repente o vento entra ou a onda não vem, o mar acalma e as ondas já não estão tão boas, ou estamos ali meia hora e não vem a onda que queremos. Temos de lidar com todas essas constantes que, ao fim do dia, também nos saem fora do controlo. Podemos treinar aquilo que quisermos, viajo daqui para os EUA e tenho 30 minutos. E, se naqueles 30 minutos, quase não vierem ondas e eu cometer um erro, pronto, volto para casa. Muitas vezes é ingrato. E basta não estarmos em sintonia com o mar ou tão sincronizados… é o que é, temos de saber lidar com isso e arranjar forma de ultrapassar essa má fase, por assim dizer.
Quando já estás com a licra vestida e quase a entrar no mar, consegues não levar essa pressão lá para dentro?
O objetivo é sempre uma pessoa desligar e entrar completamente relaxada, focada naquilo que tem de fazer. Mas claro que há sempre aquele nervoso miudinho, isso vai sempre existir, acho quase impossível que alguém não sinta. Porque, lá está, há sempre aquele desafio do mar, de “será que a onda vem, será que vou tomar as melhores decisões”, quando estamos lá dentro em condições mais difíceis há sempre o medo de falhar na tomada de decisão, por mais fria que uma pessoa seja. Eu olho para uma onda, todas são diferentes, eu acho que vai ser boa, mas não tenho a certeza. Basta eu apanhar a primeira e a segunda é que é boa, e já perdi uma oportunidade. Considero-me uma pessoa muito fria a competir e entro sempre com aquele nervoso miudinho, mesmo antes do heat. Acho que já sei lidar muito bem com isso, já arranjei a minha maneira de me acalma e de entrar tranquilo para a água e saber exatamente a decisão que quero tomar, a onda que quero e como quero competir. Mas está lá sempre qualquer coisa.
E sentes isso mais agora, que pela segunda vez na carreira estás a ir atrás da requalificação para o CT?
Não diria que piorou. Claro que há coisas em que uma pessoa fica um bocado mais reticente em tomar certas decisões, o risco é maior, não está tão relaxada e tranquila. Mas faz parte, já estive nesta posição outras vezes. Os últimos campeonatos dos Challengers o mar tem estado sempre horrível, ainda não chegámos a um que desse realmente ondas boas, que houvesse oportunidade para todos e onde, ok, se em 30 minutos errasse uma vez soubesse que teria outra hipótese. Em quase todos os campeonatos que tenho feito perdi no último minuto, é tramado, não tenho a prioridade e mesmo que queira defender, nos últimos 20 segundos vem uma onda e ela apanha, uma pessoa não pode fazer nada, constrói-se o heat todo e no fim muda de um momento para o outro. Acontece, é o que é. E depois tem sido tudo campeonatos com mar complicado, é o mesmo para todos, ok, mas lá está, entra na parte em que a tomada de decisão é crucial. Basta hesitar ou tomar uma errada e uma pessoa é crucificada. Espero que agora em Ribeira d’Ilhas a previsão seja um bocado melhor, é uma onda já com bastante qualidade e muito melhor do que as outras do início do ano. Estou confiante que, pelo menos, boas ondas uma pessoa irá ter.
Já antes de te acontecer ficares no lado de baixo do cut a meio do ano [ficando só os 18 melhores surfistas do ranking para as últimas cinco provas] que dizias que não concordavas com a ideia. Agora ainda gostas menos?
Não é por estar fora que goste menos, eu nunca fui a favor porque, para mim, não faz sentido simplesmente, porque uma pessoa está quase um ano nos [circuitos] regionais a qualificar-se para os Challengers, depois tem o resto do ano a fazer esses Challengers. Ou seja, perde um ano inteiro a competir para, depois, fazer cinco campeonatos que decorrem em três meses [no Championship Tour]. Para mim, é uma coisa que não faz muito sentido. Uma pessoa que começou mal o circuito pode acabar no topo. Já vimos o Gabriel Medina a começar um ano de forma super esquisita e acabar a lutar pelo título. Tudo pode mudar e acho que a nossa carreira, os nossos contratos, não podem ser decididos em cinco etapas. Por exemplo, o Liam O’Brien [surfista australiano] lesionou-se na manhã do [primeira] campeonato, esteve no tour mas não esteve no tour, não surfou.
Não sei se é o caso e se já acontece, mas as marcas e os patrocinadores fazem contratos que dependem do cut? Que tenham objetivos consoante se um surfista continua a competir até ao fim do circuito?
Sim, sim, na maior parte dos surfistas. Se uma pessoa estiver dentro é uma coisa, mal saia do cut é outra. Para um surfista do QS [Qualifying Series, o circuito de qualificação] que esteve um ano inteiro a trabalhar primeiro nos regionais e depois nos Challengers, chegar ali e ter três meses no World Tour, acho que é super ingrato.
Visto de fora, parece que a WSL está a querer virar-se muito para o espetáculo, a querer ter os melhores no papel a irem até ao fim.
Para começar, o CT tem ótimos surfistas, mas acho que ainda há muitos mais que poderiam pertencer aquela elite. Não sei de onde veio esta ideia, mas sinto que também nunca explicaram abertamente o porquê deste cut.
Talvez tenha algo a ver com 2019, por exemplo, quando o Gabriel Medina e o Ítalo Ferreira chegaram ao derradeiro heat da última etapa, no Havai, a disputarem o título. Essa espécie de finalíssima atraiu muito interesse e audiências.
Talvez, mas sinto que nas etapas a seguir ao cut, para começar, não há qualquer desafio para os surfistas a não ser para aqueles que estão ali a lutar pelo top 5 [que apura para as WSL Finals, prova que define o campeão mundial]. O resto está garantido para o próximo ano, tanto que vimos éne surfistas a saírem de várias etapas durante o ano, não perdem nada. Depois, sinto que uma pessoa acaba sempre por ver os mesmos emparelhamentos, em termos de draw não muda tanto. São sempre os mesmos surfistas, vês dois ou três heats e o campeonato quase que já acabou. Antes tínhamos muito mais espetáculo, surfistas e diversidade, para mim era muito mais atraente ver. Mas isto é a minha perspetiva, tenho a certeza que há pessoas que não devem partilhar da mesma que eu. Mas isso é com cada um.
Em termos práticos, teres de competir na Challengers Series implica que tipo de mudanças?
Nisso temos sorte, porque os campeonatos foram pensados para serem em ondas um bocado melhores. Não temos tido tanta sorte, pronto, é a o mar e dependemos da previsão, mas em Snapper Rocks [Austrália], por exemplo, tivemos alguns dias de boas ondas, não estava incrível, mas temos Ribeira d’Ilhas que é uma ótima onda, temos Haleiwa [no Havai, onde Kikas já ganhou uma prova, em 2019] que é excelente, Saquarema, no Brasil, e Ballito, na África do Sul, também. Ou seja, tudo ondas com potencial, mas, infelizmente, ainda não tivemos inacreditáveis e isso não é culpa da World Surf League (WSL), é o mar, às vezes tem-se sorte e outras não. Mas o treino, basicamente, continua a ser o mesmo, as pranchas mudam um bocadinho porque são ondas diferentes, mais de beachbreak, aí mudei um bocado o equipamento, para o CT era uma coisa e para o QS é um bocado outra. Em termos de preparação física, como são ondas um bocado mais fortes e pesadas, faz sentido manter a mesma. Claro que há certas etapas em que uma pessoa ajusta, no US Open convém ir um bocadinho mais leve porque é uma onda não tanto para manobras de power, mas para andar ali um bocado a bater a prancha e o mar está mais pequeninho. Para certas etapas, uma pessoa arranja certos detalhes que quer, ou não. Mas, basicamente, tenho continuado a fazer o mesmo, são viagens diferentes mas que eu já diz no passado, para mim é um bocado chapa três, são sítios que já conheci e estive bastantes vezes.
Já ganhaste na Ericeira e competiste muito por lá. Isso dá-te mais à vontade?
Sim, bem mais, mas é assim isso às vezes pode ser um extra para competirmos ou fazer com que uma pessoa relaxe. Mas Ribeira é uma onde que adoro, já fiz ali ótimos resultados, agora antes de ir para o ISA o Richard [Marsh, seu treinador] esteve cá, a experimentarmos pranchas, sinto que tenho umas boas agora para Ribeira d’Ilhas. O resto é relaxar, limpar a cabeça e acreditar que vai correr bem.
Em três dos quatro Challengers anteriores perdeste logo à primeira. O teu treinador disse para trabalhares algo em específico para esta prova?
Conseguir uns pontos aqui era importantíssimo, mas o Richard não me disse nada, não. É um bocado isso, uma pessoa estar tranquila a surfar, estou a surfar bem, as pranchas estão boas, tem tudo para correr bem, agora é entrar para dentro de água e surfar.
Virar a cabeça para a importância do momento, se calhar, acabaria por funcionar ao contrário, não?
Acho que é simplificar. Não vale a pena complicar com pontos e isso, uma pessoa vai para o mar e tem de surfar, é o que for, se correr mal, pronto, há mais duas etapas. E se não tiver que ser este ano, há de ser para o ano. Cada vez que se complica e se começa a fazer contas com os pontos e se dá ou não dá, eu nunca funcionei assim. No primeiro ano em que me qualifiquei, cheguei ao Havai e fiz duas finais e dois segundos lugares, acabei em terceiro [no circuito] e vinha em trigésimo, ou seja, nada é impossível até acabar o ano.
Agarras-te muito a essa altura, por terem sido semanas incríveis em que tudo te correu bem?
Não, não, porque sinto que este ano já tive momentos ótimos, tanto competitivos como pessoais. É mais a isso que me agarro, a vários momentos que tenho na minha carreira e digo “não, calma aí, bora lá que consegues fazer isto”. Já o fiz duas vezes, porque não uma terceira? É tranquilo.
Tanto na Ericeira como nas provas seguintes não deverás ter a companhia do Vasco Ribeiro, que anunciou uma pausa na carreira para se foca na saúde mental. Outros já o tinham feito, como o Gabriel Medina. Como encaras isto?
Acho que é bom as pessoas cada vez mais falarem e se aperceberem antes que alguma coisa de mal aconteça, que saibam tomar as precauções devidas, tirarem um tempo e respirarem um bocado, porque nada em demasia resulta. O surf pode ser um desporto super frustrante, é ultra individual e solitário, uma pessoa vai para o outro lado do mundo surfar 30 minutos, aquilo corre mal, volta para casa e isto não acontece uma, duas, nem três vezes. Pode-se ter um ano horrível em que acontece constantemente. É a pressão que pomos em nós mesmos, é a pressão dos patrocínios e contratos, uma pessoa investe muito dinheiro no querer ser surfista e, se calhar, o retorno não é igual ao investimento. E isso tudo acumulado acaba por, às vezes, ser difícil de ultrapassar para se chegar ao final do dia e se ter prazer no que se está a fazer. É fácil, de uma pequena frustração, uma pessoa criar ali um problema que não é necessário e, às vezes, guarda isso para ele e é doloroso. Só vai aumentando mais a dor. Hoje em dia já podemos falar disto de outra forma para as pessoas se aperceberem que isto não é tão fácil quanto parece, não é só ir para a praia e apanhar sol. O Gabriel e o Felipe Toledo terem começado a falar disto, nomes e surfistas de peso como eles, para as pessoas verem que também são seres humanos e têm problemas, ajuda a que o resto dos surfistas que se sintam assim tenham liberdade e à-vontade para dizerem que precisam de tempo para eles, que isto não está a resultar e que não é o que querem agora. Não é algo de bom para acontecer, mas é um bom sinal que os surfistas e outros desportistas estejam cada vez mais alerta e à-vontade para falarem sobre isso, que não seja um tema tabu que se tenha medo de esconder.
Porque achas que demorou tanto tempo até ser encarado como normal, porque o é, um desportista dizer que trabalha com um psicólogo?
Eu tenho um psicólogo desde os 16 anos, por isso não tenho qualquer problema. É um trabalho que se faz, nós somos atletas e temos de ser saudáveis no nosso corpo e, principalmente, na nossa cabeça. Com as redes sociais uma pessoa é alvo de crítica por tudo e mais alguma coisa, nada do que se faça está certo, éne treinadores de bancada, quando se está lá em cima somos os maiores e se está cá em baixo é horrível, o gajo nunca mais vai lá chegar. Uma pessoa está sempre a levar e a ter que lidar com aquilo, mas meio que sempre com um sorriso na cara porque, se disser alguma coisa, pode ser complicado e alguém levar a mal. Ou seja, há muitas coisas que têm de ser geridas e, às vezes, uma pessoa fica mais retraída e com medo de falar. Claro que um surfista menos conhecido, com não tantos resultados, sente-se menos à-vontade para tomar certas decisões com medo que as pessoas julguem, em vez de sentir a liberdade de “não, isto é o que me faz bem, não quero saber o que os outros pensam”. Terem vindo estes atletas todos e começado a falar, acho que fará outros desportistas fazerem o mesmo. É ótimo.
Já te aconteceu, depois de um heat ou prova que te tenha corrido mal, pegares no telemóvel, ires às redes e seres atraído por esse vórtex?
Felizmente, tento sempre desligar um bocado. Só que, lá está, é sempre complicado, uma pessoa sai do heat e perdeu, já está frustrada e claro que está triste, e depois ainda vai ler comentários a dizerem “epá, não apanhaste a onda não sei quê”… Eu amava ter apanhado a onda, eu não faço de propósito, não caí de propósito. É sempre duro ler aquilo. Eu, felizmente, posso dizer que nunca me aconteceu assim de uma forma em que dissesse “que loucura, o que é isto”. Claro que há sempre um ou outro treinador de bancada, também faz parte, acho que todos o somos um bocadinho de certa forma.
Mas daí a ir chatear os outros.
Às vezes, vê-se aqueles heats renhídissimos em que quem ganha não tem nada a ver e leva com um ódio que é uma cena fora do normal. Isso com certeza que custa e deve ser duríssimo. É um bocado como as discussões dentro de água: calma, é só uma surfada e estamos ali uma hora, depois uma pessoa vai para casa e esqueceu-se, não vale a pena levar isto tão assim. Mas acho que cada vez mais as pessoas respeitam e começam a entender que isto não é assim tão fácil quanto parece e que a nós custa muito mais perder e ter dificuldades do que a qualquer fã. Estamos aqui a dar o litro, a trabalhar e a dar no duro, muitas vezes não sabem dos sacrifícios e coisas das quais abdicamos para fazermos isto e virmos a campeonatos, mas acho que já começa a haver um melhor entendimento e muito mais respeito. O que dá a certos surfistas uma liberdade para respirarem melhor.
Sabes ou ainda te cruzas com surfistas que, hoje em dia, não trabalhem ou sejam acompanhados por psicólogos? Ou alguém que se esteja nas tintas para isto?
Que se estás nas tintas não, isso não. Acho que só não tem psicólogo quem não consegue ter. Quem tem oportunidade, todos eles procuram trabalhar com uma pessoa e ter alguém com quem possam falar já desde uma idade jovem. Terem alguém que os ajude a descomplicar as coisas e a ultrapassar certos problemas, certas frustrações, porque faz uma enorme diferença.
Se, por qualquer motivo, tivesses que deixar de ter esse tipo de ajuda, como seria?
Aquilo é um certo refúgio, não diria que o meu psicólogo é o meu psicólogo, hoje em dia já é quase um mentor, uma pessoa com quem trabalho há anos e estou desde sempre. O à-vontade é muito maior do que se fosse eu sentar-me aqui na cadeira e só falar. Sinto que é um plus gigante para mim, para desabafar, ver soluções para os problemas, perceber o que é um problema e não é, ali certos entraves que se tem por estar nervoso, ou certas ansiedades. Ajuda-nos a desbloquear um bocado a cabeça, é uma ajuda enorme. Às vezes temos um problema, ficamos presos neles e é qualquer coisa na nossa cabeça que, sozinhos, não conseguimos perceber o que é. E temos ali outra pessoa em que nos sentimos confortáveis para desabafar e aquilo é um estalar de dedos, então bora lá fazer e ver isto de outra forma, meter de outra maneira e “ok, isso faz sentido”. É mais fácil dar a volta.
- Texto: Tribuna do Expresso, jornal parceiro do POSTAL