O jornalista da SIC, Reinaldo Serrano, destaca o percurso de Jô Soares que, na sua opinião, “era possivelmente das figuras brasileiras mais cultas que existem”
“Uma pessoa extraordinariamente multifacetada. Foi guionista, encenador, ator, esteve ligado à música, foi diretor teatral, teve uma forte presença na televisão e sempre com uma forte presença durante cerca de 30 anos. A primeira recordação que tenho de Jô Soares, ainda dos anos 70, é de uma série televisiva de humor que era o Planeta dos Macacos e a partir daí ele revelou-se, sobretudo, um extraordinário entrevistador, muito provavelmente o melhor que vi num canal brasileiro e possivelmente em todos os canais. Temos a tendência para destacar o mercado norte-americano – Jon Stewart, David Letterman, por aí fora – e esquecemos o extraordinário talento de Jô Soares para a entrevista. Ele não entrevistava pessoas, ele conversava com pessoas que é uma coisa ligeiramente diferente“, destaca Reinaldo Serrano.
Apesar de reconhecer que “o Brasil está cheio de gente ótima para entrevistar”, o jornalista da SIC considera que Jô “conseguia subir a fasquia falando entre anónimos, inventores, cientistas, e obviamente com gente ligada à cultura e às artes”.
Além disso, “tinha um dom particularmente relevante nas entrevistas – e é bom que possamos revê-las na internet porque são entrevistas que são o exemplo de como deve ser uma entrevista que é muito mais do que pergunta e resposta, são também os apartes, os comentários”.
Era uma pessoa extraordinariamente culta, era possivelmente das figuras brasileiras mais cultas que existem e isso permitia-lhe fazer simultaneamente duas coisas: fazer pedagogia com ela [com a sua cultura] e não exibi-la, que é uma coisa totalmente diferente, e que tem de ser destacada neste trajeto de cerca de 60 anos de Jô Soares. Perdeu-se uma figura icónica no sentido em que deixa profundas marcas (…) Jô Soares por causa da sua profundíssima bagagem cultural, acrescentou e deixou uma marca única no panorama da televisão e também do cinema no Brasil que é difícil de igualar.
Apesar de não ter conhecido Jô Soares pessoalmente, o jornalista da SIC sabe que “era uma pessoa extremamente afável, grata e tão discreta quanto possível face à sua grande visibilidade junto do público brasileiro, que vai desde o público da favela ao topo da hierarquia social do Brasil, chamemos-lhe assim. Era uma pessoa estimada e amada por toda a gente e deixa de facto uma marca indelével”.
Reinaldo Serrado deixou duas sugestões de leitura porque também “através das letras Jô Soares deixou a sua marca”. São elas as obras “O Xangô de Baker Street”, ainda dos anos 90, e sobretudo “Os Assassinatos na Academia Brasileira de Letras”, um livro profundamente irónico com um profundo humor”.
Jô Soares, que Portugal descobriu no programa “Viva o Gordo!”, em 1981, morreu em São Paulo, Brasil, aos 84 anos, informou a sua ex-mulher Flavia Pedras, através de uma publicação na rede Instagram.
“Faleceu há alguns minutos o ator, humorista, diretor e escritor Jô Soares. Nos deixou no hospital Sírio Libanês, em São Paulo, cercado de amor e cuidados“, lê-se na mensagem, entretanto citada pela imprensa brasileira.
A vida de Jô Soares
José Eugénio Soares, conhecido por Jô Soares, nasceu a 17 de janeiro de 1938, no Rio de Janeiro. Estreou-se no cinema e na televisão no final dos anos de 1950, como argumentista e ator, nomeadamente no Grande Teatro da TV-Tupi, atingindo sucesso maior cerca de dez anos depois quando chegou à TV Globo com o programa “Faça Humor Não Faça Guerra”, de que era ator e autor.
Portugal descobriu o autor de “O Xangô de Baker Street” em 1981, quando a RTP passou a transmitir o seu programa de humor “Viva o Gordo!”.
Na última publicação na sua página oficial na rede Twitter, datada de quinta-feira, Jô Soares escreveu: “Não é necessário mostrar beleza aos cegos, nem dizer verdade aos surdos. Mas não minta para quem te escuta e nem decepcione os olhos de quem te admira.”
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