Dezenas de profissionais de educação estiveram hoje no Parlamento Europeu, em Bruxelas, para expor a eurodeputados de diferentes forças políticas portuguesas as reivindicações do setor, queixando-se de em Portugal não serem ouvidos e serem apenas números.
Formado “de forma espontânea” através da Internet, o grupo “Rumo a Bruxelas” manteve hoje reuniões, nalguns casos paralelas, com deputados das delegações do PSD, Bloco de Esquerda, PCP, CDS e do próprio PS, partido no Governo.
No final, um representante do grupo, João Afonso, afirmou que os professores e demais profissionais saem de Bruxelas “com muita esperança e de coração cheio”, pois sentem que foram ouvidos.
“Viemos aqui mostrar os nossos casos pessoais e o que efetivamente acontece no dia a dia das nossas escolas. E quando nós vimos apresentar as coisas, deixando de ser números e passando a ser pessoas, toda a gente reconhece que efetivamente algo tem de ser feito. Qualquer que seja a cor política, todos reconhecem que há coisas que não podem acontecer nas nossas escolas, que não podem acontecer neste século”, declarou este professor de Educação Física em Albufeira.
Ladeado de vários professores, muitos dos quais com cravos na lapela e cachecóis de Portugal ao pescoço, João Afonso admitiu que a Educação é uma área de competência nacional dos Estados-membros, em que a União Europeia tem pouca margem de intervenção, mas ainda assim considerou útil a deslocação a Bruxelas.
Afirmou também que, paralelamente, o grupo apresentou petições, que “estão a seguir o seu processo normal e formal”, nas quais são abordadas questões como o “reposicionamento e a progressão na carreira” e o “estrangulamento na carreira” dos docentes, assim como a formação dos técnicos especializados e a progressão na carreira dos assistentes.
“Viemos dar a cara. Viemos mostrar que não somos números. E quando assim é, as coisas avançam. Estávamos sentados no computador e acreditámos que vínhamos aqui. Estamos aqui, estamos a ser entrevistados, estamos a ter voz, estamos a ser ouvidos”, reforçou, lamentando que o mesmo não suceda em Portugal, onde, apontou, “sucedem-se reuniões e os resultados são zero”.
Após receber, juntamente com outros deputados da delegação do PSD, um dos grupos de profissionais de educação, o eurodeputado Paulo Rangel, admitindo que este é um domínio de competência quase exclusivamente nacional, disse entender esta deslocação a Bruxelas face à “grande frustração e revolta de toda a comunidade escolar portuguesa”.
“Quando falha o poder político português, a maioria absoluta do PS, é evidente que tem de ser feito um apelo a qualquer outra instância”, disse, considerando que estes profissionais se deslocaram ao Parlamento Europeu para “mostrar que o Governo português está paralisado, num impasse, incapaz de responder, fechado sobre si próprio e voltou até à lógica de diabolização da profissão, inaugurada por José Sócrates e Maria de Lurdes Rodrigues”.
Por seu lado, José Gusmão, do Bloco de Esquerda, concorda que a educação é uma matéria de competência nacional, e o partido “acha bem que seja”, mas apontou que “o caderno reivindicativo é muito vasto” e há questões “que podem ser tratadas no âmbito do funcionamento das instituições europeias”, designadamente “as que dizem respeito a questões de igualdade de tratamento entre profissionais ou comunidades educativas”, algo que levou o Bloco a agir a nível europeu já no passado.
Também Nuno Melo, do CDS, sublinhou que “uma das principais reivindicações tem a ver com a contagem de tempo de serviço”, e lembrou que, por entender que está a ser violado o principio de igualdade – dado haver um regime diferenciado para as regiões autónomas dos Açores e Madeira -, já colocou uma questão à Comissão Europeia no início de março, pois “aqui pode haver uma violação de tratados”.
Já Sandra Pereira, do PCP, disse que transmitiu aos profissionais com quem se reuniu que, “de facto, os poderes do Parlamento Europeu e das instituições europeias são muito limitados, quer nas questões do emprego, quer na questão da educação”, pelo que defendeu sobretudo que “a luta tem que se fazer, mas é em Portugal”.
“O importante é que a luta continue e que estas exigências no combate à precariedade e na vinculação sejam efetivas e que o Governo português dê resposta a esta luta dos professores”, disse.
Por fim, João Albuquerque, do PS, rejeitou “que o Governo tenha falhado porque as negociações continuam, não só depois das propostas que já foram apresentadas, mas também ainda no processo que está em curso junto das entidades sindicais”.
Apontando também que o Parlamento Europeu não tem competências nesta matéria, o deputado disse que “as pessoas têm todo o direito a demonstrar a sua indignação e preocupação”, razão pela qual o PS também quis “ouvir as suas preocupações”, mas salientou que estas “não são novidade, porque o Governo tem estado sempre ativo e nunca interrompeu as negociações ao longo de todo este período de reivindicações e de protesto”.
A anteceder os encontros de hoje no Parlamento, após o qual as dezenas de profissionais regressaram a Portugal, o grupo realizou na segunda-feira à noite uma vigília diante do Parlamento Europeu.
Paralelamente a esta deslocação, um ‘e-mail’ dizendo “SOMOS PROFESSORES – A LUTA CONTINUA” foi enviado às 08:00 de hoje para “todos os endereços eletrónicos do ministério da Educação”, incluindo organismos como o Instituto de Avaliação Educativa (IAVE), mas também órgãos institucionais, como o Provedor de Justiça, ou das áreas da cultura, contou à Lusa a professora Helena Vicente Gomes, de uma escola de Lisboa.