
Nos 45 anos da “Revolução dos Cravos”, o “POSTAL do ALGARVE” associa-se às comemorações e publica todos os dias, durante o mês de Abril, um texto ou poema alusivos ao 25 de Abril.
Uma iniciativa organizada por Rui Cabrita, que decorre em simultâneo no jornal “Terra Ruiva”, do concelho de Silves.
Deficientes das Forças Armadas
Divulgamos hoje o documento elaborado pelo Centro de Documentação 25 de Abril, da Universidade de Coimbra, que descreve a dramática situação daqueles a quem a guerra conduziu ao estatuto de vítimas permanentes, os Deficientes das Forças Armadas:
Os deficientes, aqueles que sofreram graves e permanentes mutilações nos teatros de operações ou em acções de preparação para o combate, constituem a face mais visível da Guerra Colonial e, em certo sentido, aquela que a sociedade portuguesa mais dificuldades tem tido em encarar.
Desde o início, a guerra afectou toda a sociedade, primeiro com o sofrimento da despedida dos jovens e, logo de seguida, com os primeiros mortos e feridos, a quem as estruturas militares assistentes e sanitárias, orientadas para tempo de paz, tiveram dificuldade em dar resposta.
Nas frentes de combate, por norma, os soldados não se viram privados de rações de combate, armas, munições e fardamento. Cumpriam-se, embora muitas vezes com fracos meios, os calendários operacionais. Contudo, na retaguarda, iam aumentando os caixões daqueles cujas famílias tinham possibilidade de pagar a trasladação dos corpos (os outros foram nos primeiros anos enterrados nas zonas de combate) e os feridos, que se acumulavam nos hospitais militares pequenos, incapazes e não adaptados para receberem os feridos em operações.
Assim se foi constituindo um exército de deficientes, que não parou de aumentar, formado por jovens que, na força da vida, se viram amputados, cegos, com doenças internas graves, doentes da mente, com futuro incerto.
Na época, em Portugal, os deficientes eram considerados “inválidos” e, não obstante ter sido criada posteriormente a pensão de invalidez, muitos deles sofreram duplamente a sua deficiência ao se tornarem, durante muito tempo, pesado fardo para as famílias.
Os hospitais militares foram para muitos um refúgio. Mas foram também o depósito onde os corpos amputados, os homens em cadeira de rodas ou os cegos tropeçando se mantiveram longe das vistas da sociedade, porque, oficialmente, Portugal não estava em guerra e a sua visibilidade poderia motivar interrogações incómodas para o regime sobre a realidade do que se passava nas frentes de combate…
Os longos anos de guerra, progressivamente mais violenta e provocando mais mortos e feridos, forjaram uma consciência coletiva entre os deficientes militares dentro dos hospitais.
Recordavam o que acontecera aos inválidos da I Guerra Mundial e ao seu Código de inválidos de 1929, o qual, embora lhes tenha dado um estatuto digno após revisões sucessivas, não evitou que ficassem na miséria e chegassem ao 25 de Abril com pensões degradadas, sem direito à assistência médica ou quaisquer regalias sociais…
Necessitavam, porém, de uma abertura política para defender os seus direitos, abertura que só o 25 de Abril proporcionou e que permitiu o nascimento da Associação dos Deficientes das Forças armadas (ADFA). Este teve como primeiro acto a apresentação à Junta de Salvação Nacional de um conjunto de princípios reivindicativos, ainda muito basilares, na sequência de um documento anteriormente entregue à Assembleia Nacional.
A ADFA organizou-se para prestar serviço de apoio aos seus associados, desde os processos burocráticos e administrativos aos cuidados de saúde, de reabilitação física e integração social, de modo a que a sociedade portuguesa olhasse para os seus deficientes de guerra e visse neles cidadãos de bem, dignos e úteis
De acordo com levantamentos estatísticos, não muito rigorosos, efectuados logo a seguir ao 25 de Abril pelos serviços da ADFA, concluí-se que terão sido evacuados das frentes de combate, duranteos13anosdeguerra,cercade 25.000 militares afectados por deficiências motoras, sensoriais, orgânicas e mentais.
(CM)