Diz-se dos casamentos que “o ‘para sempre’ se faz de sucessivos pequenos agoras” e este bem poderia ser o chavão utilizado para descrever o Festival Som Riscado, que decorre até 9 de Abril pelo segundo ano consecutivo a Loulé.
A criação de novos públicos é desde sempre uma das pedras de toque da produção cultural, que para este objectivo trabalha consciente de que dele depende a própria sobrevivência. Trabalho feito a longo prazo e recheado de incertezas, a criação de públicos é simultaneamente “um tiro no escuro”, um processo de “adivinhação”, uma ousadia e um desafio aos outros e à produção e programação culturais.
Gerar novos públicos é, por tudo isto e mais, o esforço de criar laços de afinidade entre as pessoas e as artes de forma duradoura – preferencialmente para sempre – que se faz, na grande maioria das vezes, por “pequenos”, sucessivos e esforçados agoras culturais em que as artes são levadas aos públicos – ou vice-versa -, repetidamente, até que o “bichinho” do gosto pela cultura se instale irremediavelmente.
Se a arte é arte, a criação de públicos é-o ela também não menos.
A arte de implicar
É à arte de implicar que se propõe desde a primeira hora o Som Riscado, casando a música e as artes performativas de forma inovadora, ousada e implicativa.
Com uma programação que é apresentada num registo pouco habitual por terras algarvias, desafiante e “bold”, a proposta é a de implicar os públicos de forma a integrá-los no próprio espectáculo, dar-lhes espaço para crescerem junto e em conjunto com a performance.
Pouco importa se se trata de público mais ou menos conhecedor das sendas da cultura. Do que se trata é de colocar o espectador fora da zona de conforto da mera assistência e trazê-lo para o palco das emoções. Obrigar o público a pisar as tábuas é também uma forma de deixar sobre a tábua rasa uma marca tão indelével quanto se possa.
Um desafio aos conceitos
Por outro lado, o Som Riscado é também um desafio aos criadores e aos intérpretes, convidando-os a casamentos que, inusitados, ganham espaço para crescerem e se afirmarem em discursos culturais nem sempre convencionais. Unem-se assim artistas de várias geografias das artes, várias geografias de backgrounds culturais e, também, várias geografias cardeais, cruzando a produção cultural algarvia com muito do que se faz a nível nacional na área dos novos discursos das artes performativas.
Tudo num festival que se faz pensado de forma estruturada e durante cinco dias de incessantes propostas em vários locais da cidade de Loulé, tendo como epicentro o Cine-Teatro Louletano e recusando a ideia de que a inovação na área cultural se faz de epifenómenos isolados, quer no tempo, quer no espaço.
Para toda a família
Por outro lado, o Som Riscado não é um festival pensado para eruditos ou para um público de vanguarda feito de um punhado de habitués da cena cultural mais alternativa e progressista. É um festival para toda a família dos mais pequenos aos mais graúdos, onde várias são as propostas para a vivência da cultura em família e de forma envolvente e participativa.
Quebrar o discurso típico de “ir ver um espectáculo” faz-se também convidando o público a que se integre nele, numa experiência sensível e sensitiva que vai muito para além da simples ideia de um espectáculo com interacção com a assistência nos moldes costumeiros.
Um convite dirigido pela Câmara de Loulé a todos, “dos 8 aos 80” como sói dizer-se, e que abre ao público da região uma porta para a arte pensada e apresentada fora da caixa. Motivos mais do que suficientes para não deixar de passar por estes dias por um dos palcos do Som Riscado e deixar que a agulha sulque o vinil do sensível, num girar para mais tarde recordar.
PROGRAMAÇÃO:
6 ABRIL
“SYN.Tropia” | Espectáculo | Cine-Teatro Louletano
“Todas as noutes passadas” | Concerto | Convento do Espírito Santo
“Das Gavetas Nascem Sons” | Instalação sonora | Convento do Espírito Santo
“Phonopticon” | Instalação sonora | Convento do Espírito Santo
7 ABRIL
“Manipula#Som” | Concerto visual circense | Casa da Cultura de Loulé
“Qual é o som da tua cara?” | Concerto para piano e desenho | Cine-Teatro Louletano
“Das Gavetas Nascem Sons” | Instalação sonora | Convento do Espírito Santo
“Phonopticon” | Instalação sonora | Convento do Espírito Santo
8 ABRIL
“Mãos” | Concerto | Convento do Espírito Santo
The Happy Mess | Concerto | Cine-Teatro Louletano
“Das Gavetas Nascem Sons” | Instalação sonora | Convento do Espírito Santo
“Phonopticon” | Instalação sonora | Convento do Espírito Santo
9 ABRIL
Microscopia sonora | Workshop intensivo | Casa da Cultura de Loulé
“Manipula#Som” | Concerto visual circense | Casa da Cultura de Loulé
Noiserv & Luís da Cruz | Música e fotografia | Convento do Espírito
“Das Gavetas Nascem Sons” | Instalação sonora | Convento do Espírito Santo
“Phonopticon” | Instalação sonora | Convento do Espírito Santo