O presidente do Conselho Internacional dos Museus – Europa (ICOM, na sigla em inglês) defendeu que os grandes museus europeus devem repensar o futuro face à atual crise “muito grave”, e os Estados “não se devem demitir de os apoiar”.
“Apesar dos números catastróficos que têm vindo a ser anunciados, como instituições não vão desaparecer. O maior problema são os grandes museus”, disse Luís Raposo, contactado pela agência Lusa, após o ponto da situação apresentado hoje numa reunião internacional ‘online’.
No encontro com os representantes do ICOM das outras regiões mundiais, para acompanhar o impacto da pandemia, o presidente do ICOM-Europa apresentou um balanço pesado: os museus europeus perderam entre 25% e 75% dos visitantes, e os últimos dados indicam perdas globais de receitas da ordem dos 70%, com 10% em situação de ‘lay-off’.
“Esta crise veio demonstrar que os museus que estão a sofrer mais com a quebra de visitantes são aqueles que já estavam a caminhar para modelos mais comerciais, com gestão privada, e criação de exposições de grande dimensão para o turismo de massas”, avaliou.
A quebra nos visitantes – que também aconteceu em Portugal, com os museus nacionais a perderem cerca de 73%, até novembro de 2020 – deveu-se sobretudo à paralisação do turismo internacional, ao encerramento de escolas e, consequentemente, dos programas escolares, à interrupção das programações e de atividades na comunidade, devido à pandemia.
“Os museus são uma imagem de marca da Europa – entre os 20 mais visitados no mundo, dez encontram-se neste continente -, e devem continuar a ser os arquivos da memória do país quanto ao seu património. Não devem ter como foco principal o turismo, mas sim ser ativos como uma escola de cidadania”, defendeu o responsável.
Os mais recentes números divulgados pelo presidente do ICOM-Europa indicam ainda que 75% dos museus tiveram perdas semanais de receitas na ordem dos mil a 30 mil euros, 66% tiveram apoio dos governos, enquanto sete em cada dez esperam cortes nos orçamentos nos próximos anos.
“O impacto da pandemia nos museus depende sobretudo da sua dimensão e da forma como são financiados”, apontou Luís Raposo, acrescentando que, num universo de 73.000 na Europa, “os pequenos museus locais são os menos afetados, enquanto aqueles de grandes dimensões sofrem muito mais com a crise económica e do turismo, porque, apesar de terem muito mais receita habitualmente, têm muito mais despesas”.
O ponto da situação apresentado por Luís Raposo aos seus congéneres do ICOM internacional foi baseado em informações recolhidas dos dois relatórios apresentados no ano passado por aquela organização não governamental, e também dados recolhidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO).
“O pior que pode acontecer é um museu de referência colapsar e ter de vender a sua coleção para subsistir. Na Europa não existe esse risco atualmente, mas, no limite, é para isso que podem caminhar”, disse Luís Raposo, que fez esse alerta interno durante a reunião internacional.
Indicou que, nos Estado Unidos, onde existem muitos museus com financiamento privado, estima-se que entre 10 e 30 por cento vão ser forçados a fechar e a vender as suas coleções, enquanto no mundo árabe a situação também está a ficar “dramática”, porque está muito dependente do lucro do petróleo.
Na Europa, onde a maioria dos museus é da esfera pública ou tem financiamento público, “esse risco não é tão grande”, disse Luis Raposo. “Mas [os museus] têm de ter cuidado e refletir sobre o seu futuro”, acrescentou.
O presidente do ICOM Europa adiantou ainda que vai promover um seminário ‘online’, no dia 30 de março, no qual os grandes museus europeus vão estar representados, como o Louvre, o Prado, o Hermitage e o Vaticano.
“É visível que quanto mais os museus avançam para lógicas comerciais, mais dificuldades vão sentir em momentos de crise semelhantes a este”, reforçou, razão pela qual pretende reunir os diretores e abordar o tema concretamente.
Museus e monumentos – como todos os espaços culturais do país – estiveram encerrados de 14 de março e 17 de maio do ano passado, na sequência do confinamento decretado pelo Governo para travar a propagação do vírus covid-19, e voltaram a encerrar no passado dia 15 de janeiro, neste segundo confinamento.
A pandemia de covid-19 provocou, pelo menos, 2.092.736 mortos resultantes de mais de 97,4 milhões de casos de infeção em todo o mundo, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.
Em Portugal, morreram 9.920 pessoas dos 609.136 casos de infeção confirmados, de acordo com o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde.
A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro de 2019, em Wuhan, uma cidade do centro da China.