Em declarações à agência Lusa, Cristina Gavina, vice-presidente da SPC, considerou que se trata de um problema de saúde pública e diz que a insuficiência cardíaca vai ser “a pandemia do século XXI”.
“Temos uma população cada vez mais envelhecida, a acumular doenças, que vive mais tempo, mas com mais doenças e muitas destas vão conduzir a um estado de insuficiência cardíaca”, explica a especialista.
Cristina Gavina lembra que a insuficiência cardíaca “tem um impacto brutal na vida das pessoas”, não só na qualidade de vida, mas na quantidade de anos vividos.
“Estamos a falar de reduções, comparativamente com populações da mesma idade, que podem ir de 15 anos [a menos de vida] em pessoas na faixa dos 60 anos a cinco anos na faixa dos 80”, afirmou.
A vice-presidente da SPC acrescenta: “Vai ser a pandemia do século XXI. À medida que vamos tratando muitas das doenças vasculares, nomeadamente o enfarte agudo do miocárdio, muitos doentes sobrevivem, mas ficam com sequelas, com cicatrizes que levam depois à insuficiência cardíaca. As nossas enfermarias estão cheias de doentes com insuficiência cardíaca”.
Lembra que os dados atualmente disponíveis relativamente à prevalência da insuficiência cardíaca têm mais de 20 anos e, na altura, foram recolhidos apenas a partir dos doentes que iam aos cuidados de saúde primários, logo, podem não ser representativos da realidade.
“E isto tem impacto nas políticas de saúde”, diz a especialista, que lembra que a insuficiência cardíaca é uma das principais causas de internamento, além das doenças respiratórias.
Com o estudo, que deveria arrancar em outubro, mas que a pandemia de covid-19 adiou, a SPC quer encontrar os doentes que não estão diagnosticados e, por isso, não sabem que sofrem de insuficiência cardíaca: “Muitos deles, infelizmente, nem frequentam os serviços de saúde”.
Neste estudo, que será feito em colaboração com o laboratório AstraZeneca, com carrinhas que chegarão a vários pontos do país, a SPC conta recolher dados de entre 8.000 a 10.000 pessoas para fazer a fotografia insuficiência cardíaca em Portugal.
“Vamos convidar as pessoas a virem ter connosco, depois dos 50 anos, com rastreios feitos em carrinhas junto das populações, tanto com recolha de sintomas como com testes de sangue, para de uma forma simples conseguir perceber se estão ou não ativados no organismo os mecanismos que conduzem à insuficiência cardíaca”, explicou.
Depois, num grupo mais pequeno de pessoas, será feita a caracterização com maior detalhe do tipo de insuficiência cardíaca que os doentes têm.
Cristina Gavina reconhece que, com a pandemia de covid-19, as pessoas, por receio, podem não aderir tanto, daí que o estudo tenha feito um compasso de espera antes do arranque, para que seja avaliada a evolução da pandemia.
“Temos planos de contingência pensados para a possibilidade de não ter a pandemia controlada, com separação de circuitos e proteção de doentes e profissionais de saúde para poder fazer o rastreio, mas como o medo pode afastar parte do público, poderemos ter de arrancar para o ano”, afirmou.
Em seis meses de trabalho de recolha a SPC conta ter os primeiros resultados sobre um problema que hoje em dia “já aparece descompensado nos hospitais”.
As estimativas da Sociedade Portuguesa de Cardiologia indicam que, em Portugal, cerca de 400.000 adultos sofrem de insuficiência cardíaca, prevendo-se um aumento de 30% no número de doentes até 2034.