Como funciona e quais as consequências imediatas para jogadores, treinadores e funcionários?
O ‘lay-off’ simplificado é uma medida excecional e temporária de proteção dos postos de trabalho, que permite às empresas a redução temporária do período normal de trabalho ou suspensão de contrato de trabalho, no âmbito da pandemia da doença covid-19. O objetivo é apoiar a manutenção dos postos de trabalho e evitar despedimentos por razões económicas durante a crise relacionada com o novo coronavírus.
Para formalizar o pedido, os clubes ou sociedades desportivas têm de apresentar online o requerimento junto da Segurança Social (SS).
Segundo o princípio de suspensão de contrato de trabalho subjacente ao ‘lay-off’, jogadores, treinadores ou demais funcionários ficam com o contrato suspenso. Nesse cenário, estes profissionais deixam de estar obrigados a cumprir com as funções previstas no seu contrato, o que, no caso dos jogadores, pode significar, em última instância, que não têm de treinar para manter a forma física durante o período da suspensão. Do mesmo modo, os treinadores não estarão obrigados a preparar a equipa para o regresso à atividade ou monitorizar a evolução do plantel no decurso desta fase. Já para os restantes funcionários, cujos contratos não têm uma natureza desportiva, aplicam-se as mesmas disposições para trabalhadores de outros ramos de atividade que não o desporto.
Que clubes podem beneficiar?
Todos os clubes e sociedades desportivas, sejam elas sociedades anónimas desportivas (SAD) ou sociedades desportivas unipessoais por quotas (SDUQ), independentemente do escalão em que compitam. Os clubes desportivos são associações privadas de fins não lucrativos, enquanto as sociedades desportivas são pessoas coletivas de direito privado.
Segundo o decreto-lei n.º 10-G/2020, estão abrangidos os empregadores de natureza privada em situação de crise empresarial, desde que cumpram um dos três requisitos: serem empresas ou estabelecimentos cujo encerramento total ou parcial tenha sido decretado por decisão das autoridades políticas ou de saúde; serem empresas que tiveram de parar total ou parcialmente a sua atividade, devido a interrupção das cadeias de abastecimento globais ou a suspensão ou cancelamento de encomendas; e, por fim, terem uma queda de pelo menos 40% da faturação face ao mês anterior ou ao período homólogo.
Que clubes já anunciaram o recurso a este regime?
O Belenenses SAD foi o único representante da I Liga de futebol a formalizar o recurso parcial ao ‘lay-off’ simplificado junto do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSS), enquanto o Desportivo de Chaves foi o único da II Liga a seguir o mesmo caminho.
Leixões e Penafiel, igualmente do segundo escalão, já anunciaram também a sua vontade de aderir, tendo ainda sido noticiado que Portimonense e Varzim estariam na disposição de avançar com os respetivos pedidos junto da SS.
Quais os montantes máximos que os futebolistas podem receber?
O regime de ‘lay-off’ simplificado é igual para todos no apoio financeiro por trabalhador, que vê o vencimento reduzido a dois terços. O máximo que está consagrado no decreto-lei para a cobertura dos dois terços do ordenado é uma remuneração equivalente a três salários mínimos, ou seja, 1.905 euros, dos quais terão de descontar 11% para a SS.
As empresas que aderirem podem reduzir o salário aos seus trabalhadores, seguindo as regras gerais previstas no Código do Trabalho para as situações de ‘lay-off’. Em caso de suspensão do contrato, os trabalhadores têm direito a receber dois terços do seu salário normal ilíquido, com a garantia de um valor mínimo igual ao do salário mínimo nacional (635 euros) e com um limite máximo correspondente a três salários mínimos (1.905 euros). Já nas situações de redução do horário, é assegurado o salário, calculado em proporção das horas de trabalho.
O que fica a cargo do Estado e o que fica a cargo dos clubes?
Segundo a página da Segurança Social (SS) na Internet, a SS “suporta 70% do valor do apoio até ao limite de 1.333,50 euros por trabalhador”, de acordo com o limite máximo de três salários mínimos: 1905 euros. Já os clubes terão de assumir os restantes 30% (571,50 euros). Este apoio é concedido por um mês, podendo ser renovado até um máximo de três meses.
Que argumentos são invocados pelos clubes?
Entre os três requisitos possíveis para aderir ao regime, sobressaem dois nos argumentos passíveis de serem invocados. Face à suspensão das competições, os clubes alegam a “quebra abrupta e acentuada de, pelo menos, 40% da faturação”, nos 30 dias anteriores. O outro ponto do decreto-lei à disposição dos clubes passa pelo “encerramento total ou parcial da empresa ou estabelecimento, decorrente do dever de encerramento de instalações e estabelecimentos”, previsto no decreto que regulamentou o Estado de Emergência em Portugal.
Apesar de a prorrogação no Decreto n.º 2-B/2020 contemplar a exceção de encerramento para instalações “destinadas à atividade dos praticantes desportivos profissionais e de alto rendimento, em contexto de treino”, os estádios estão mesmo encerrados e, nesta fase, são desincentivadas concentrações de pessoas, pelo que há uma limitação real aos treinos.
Qual o impacto futuro na atividade dos clubes?
A nível financeiro, o impacto do recurso ao ‘lay-off’, pela aplicabilidade de curto prazo que está prevista no decreto-lei do Governo, não deverá fazer uma diferença preponderante na gestão dos clubes ou sociedades desportivas, a não ser pela poupança em termos de vencimentos durante o período de vigência, ajudando, sobretudo, aqueles que já viviam em dificuldades económicas.
Por outro lado, a adesão a esta medida pode ter impacto a nível reputacional, uma vez que os clubes ainda receberam em março as verbas dos direitos televisivos, naquela que é – para a esmagadora maioria – a principal fonte de receitas. Ato contínuo, isto poderá dar azo a uma ideia de oportunismo e de aproveitamento da situação da pandemia por parte dos clubes.
Finalmente, o recurso de forma unilateral a este regime pode causar também danos ao nível da futura relação de confiança entre a instituição e os seus profissionais, como jogadores, treinadores e restante ‘staff’, na medida em que exclui uma solução negociada por mútuo acordo entre as partes.
Que soluções alternativas estão em cima da mesa?
A principal alternativa ao ‘lay-off’ simplificado para os clubes neste cenário de crise provocada pela pandemia de covid-19 passa pela redução de salários por acordo com os jogadores, tendo em atenção a realidade atual e a gravidade da mesma. Essa redução pode, posteriormente, ser parcial ou totalmente reposta, mediante a verificação de determinados fatores, como a conclusão da competição desportiva, entre outros aspetos.
Por outro lado, poderia também haver lugar a uma mera cativação de parte dos vencimentos, diferindo no tempo o pagamento aos jogadores dos montantes remanescentes.
Um dos cenários que esteve em discussão foi a mediação do processo pelo Sindicato de Jogadores Profissionais de Futebol (SJPF), que esteve em conversações com a Liga nas últimas semanas. Contudo, não se chegou a um acordo, tendo o organismo liderado por Joaquim Evangelista esclarecido que “nunca se comprometeu em sugerir uma percentagem de corte”, nem aceitou “um corte indiscriminado e, sem possibilidade de devolução no futuro”, condenando a decisão unilateral dos clubes no recurso ao ‘lay-off’ com suspensão do contrato de trabalho.
Modelo de ‘lay-off’ é também uma solução no futebol internacional?
O regime de ‘lay-off’ está também previsto para os clubes de futebol noutros países, destacando-se aqui a sua utilização em Espanha e Inglaterra, as duas ligas mais ricas a nível europeu. No futebol espanhol, foi adotado o ERTE (expediente de regulação temporária de emprego) por parte de FC Barcelona, Atlético de Madrid, Espanyol, Alavés, Osasuna e Sevilha.
Já em Inglaterra foi anunciado o ‘lay-off’ parcial de Tottenham, Newcastle, Norwich e Bournemouth, que deixaram de fora os futebolistas e abrangeram apenas outros funcionários.