Quando bati na porta do quarto em frente ao meu, esta manhã no hotel, pensei que já tivessem descido e que a ajuda para lhes carregar as malas estivesse a chegar com atraso.
– “Vamos. Creio que já desceram”. – comentei com o Capitão, dirigindo-me ao elevador. Depois ouvi a porta a abrir-se e a voz da Luz Elena: “Nênes?”
Nunca duvidei que a vida pode ser surpreendente até para quem dela muito espera. Nunca duvidei dos amores à primeira vista; das empatias e grandes ligações de almas. Nunca me ocorreu, sequer, perguntar-me de onde virão certos desapegados apegos que nos enlaçam aos outros com a força de um tufão e a candura de um beijo.
“Nênes”, disse ela, como quem fala com filhos que saem mesmo do ventre… e ficou-me aquela palavra a entoar nos sentidos.
Quase vinte anos passaram desde que nos conhecemos, por mero acaso em viagem, e mutuamente nos adoptámos. Vivemos, de longe a longe, alguns dias todos juntos e é tal e qual escreveu o Luís, na carta que esta manhã me entregou: “é como se nunca se fosse, a vossa presença ou a nossa…”
É, de facto, assim! Somos uma família improvável, forjada numa centelha de acaso; separada por uma enorme distância e unida por insondáveis laços; somos um caso perdido de encanto; uma história de tesouro encontrado; somos uma gargalhada feliz dada pela humanidade…
Abraçámo-nos muito no aeroporto. Sem lágrimas, em alegria. Porque de quem vive em nós, nunca temos que despedir-nos.