Campanhas de adoção, esterilizações, protocolos com associações e obras de construção ou expansão de canis são medidas dos municípios para gerir a recolha de animais, mas em várias zonas subsistem queixas sobre falta de espaço e custos elevados.
Em Setúbal, segundo o município, a lei que impede o abate de animais (aplicada no continente desde 2018) provocou um acréscimo significativo dos custos anuais, que aumentaram em cerca de 66.000 euros com a contratação de mais quatro funcionários, incluindo uma médica veterinária. Registaram-se ainda aumentos de 4.000 euros em despesas com alimentos e de 4.000 euros em medicação e material cirúrgico.
Em outubro de 2019, quando já passava mais de um ano após a aplicação da lei, a câmara referiu que a proibição do abate “não encontrou os municípios devidamente preparados para fazer face às novas obrigações” e que se verificou também um aumento do abandono de cães.
A autarquia recorreu ao apoio disponibilizado pela Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) para esterilização de cães e gatos, definiu protocolos com clínicas para cirurgias e tem em curso um investimento de 120 mil euros para aumentar a capacidade do centro de recolha em mais 80 canídeos, previsivelmente no segundo semestre deste ano.
Passado o primeiro ano da aplicação da lei, o canil intermunicipal da Terra Fria Transmontana, que serve Vimioso, Bragança, Mogadouro e Miranda do Douro e resultou de um investimento autárquico de 600.000 euros, já estava sem capacidade para acolher mais animais: em outubro, o presidente da Câmara de Vimioso, Jorge Fidalgo, disse que as despesas já ultrapassavam os 10.000 euros/mês, quando antes rondavam 6.000 a 7.000 euros.
“Temos as pessoas a dizer que andam muitos mais cães na rua […]. Ou mudam a lei ou os cães vão andar na rua”, afirmou, reclamando apoio do Estado para alargar o centro de recolha.
Já este ano, a Câmara do Porto referiu que a nova lei “está a fazer colapsar os canis” e que se está a “concorrer para um aumento exponencial de animais errantes no espaço público – cenário que potencia a dispersão de agentes infecciosos e eventualmente zoonóticos, aumentando assim o risco de saúde pública”.
O novo centro de recolha (em substituição do atual canil, com mais de 80 anos) abre portas neste mês, aumentando o número de boxes de 94 para 220. Com a ampliação surge um aumento de custos: sem contabilizar recursos humanos, neste ano as despesas com rações, fármacos, esterilizações e areia deverão chegar aos 55.000 euros.
O fim do abate levou também a um aumento “significativo” de animais no Canil/Gatil Intermunicipal da empresa Resialentejo (CAGIA), lotado desde novembro de 2018 e que serve Almodôvar, Aljustrel, Alvito, Beja, Castro Verde, Cuba, Serpa, Moura, Ourique, Vidigueira e Reguengos de Monsaraz. Quando o espaço não tem vagas, os animais ficam “por recolher ou em locais provisórios” até haver lugar.
Os custos de funcionamento têm aumentado nos últimos anos: foram de 67.809 euros em 2016, de 68.748 euros em 2017 e de 78.660 euros em 2018, ascendendo a 46.403 euros em 30 de setembro de 2019. O aumento de 2018 refere-se sobretudo à subida de fornecimento de serviços externos (que inclui, entre outros, a alimentação).
O CAGIA esteriliza gratuitamente os animais adotados nas usas instalações e realizou campanhas em que comparticipou esterilizações nos dois últimos anos.
A falta de espaço, com a consequente lista de espera, é também um problema no Canil e Gatil Municipal de Portalegre. No final de outubro, fonte do município indicou que nos últimos anos são recebidos, em média, 100 animais novos por ano, mas desde a entrada em vigor da nova legislação só se conseguiu receber até então 61.
Tem havido sensibilização para a adoção, no âmbito da visita de crianças e nas redes sociais, mas “verifica-se que estas medidas não têm um impacto significativo e direto” – o número anual de adoções tem-se mantido em cerca de 50. Antes da entrega aos novos donos, a câmara vacina, desparasita e põe identificação eletrónica.
O presidente da Câmara de Viana do Castelo, onde em fevereiro mais de 30 cabras e ovelhas foram mortas por uma matilha de cães vadios, exige a reavaliação da lei: “Se abrirmos um novo canil para 100 animais, dentro de três a quatro meses está completamente esgotado. Isto está a passar-se no país todo”, disse José Maria Costa.
O Canil Intermunicipal do Alto Minho serve 11 concelhos: Arcos de Valdevez, Caminha, Melgaço, Monção, Paredes de Coura, Ponte da Barca, Ponte de Lima, Valença, Viana do Castelo e Vila Nova de Cerveira e Esposende.
Segundo informação de novembro, o canil tinha registado, no último ano, uma “diminuição considerável” na capacidade, com 300 animais em lista de espera: “O canil tem funcionado, regra geral, no limiar da capacidade de carga, isto é, entre 90 e 100 cães”.
Em janeiro, o Conselho Intermunicipal da Região de Aveiro – crítico da “entrada em vigor da nova legislação sem prévia preparação” – decidiu abrir concurso público três polos do centro de recolha (Águeda, Aveiro e Ovar, que se juntam ao de Ílhavo), por quase três milhões. Entretanto, vão valendo as associações, mas também estas têm canis lotados.
Em 2018, a Câmara de Aveiro acordou com a Ordem dos Veterinários a atribuição de cheques veterinários para animais capturados ou de famílias carenciadas.
A lotação dos canis não é, porém, associada à nova lei em todos os casos. Em Leiria, onde a gestão é “feita com muito esforço” e o município recorre muitas vezes às associações que apoia, os abates terminaram em 2016. Foram também “implementados programas de esterilização de todos os animais que se encontram no canil”, onde os custos com ração, mão de obra e material de limpeza foram de 21.892 euros em 2018.
O concelho já tem terrenos para um novo centro de recolha (obra de 450 mil euros) e vai ter um regulamento do regime especial de esterilização para animais de famílias carenciadas.
Em Évora, a nova lei “não teve qualquer efeito” no canil, com uma política de não abate desde 2012. De acordo com o município, por ano gastam-se 12.000 euros em alimentação, 10.000 em medicação e 9.000 na campanha de esterilização, castração de gatos de rua e projeto de adoção.
A autarquia tem apostado em alojamentos mais duradouros e na esterilização de animais alojados e de munícipes carenciados.
Faro, Santarém, Viseu ou Lisboa também já não praticavam abates. O primeiro, onde o investimento anual ronda os 33.000 euros, tem protocolo com o canil de Loulé e aprovou em janeiro um concurso de 1,2 milhões para edificar até 2021 o centro de recolha. No ano passado, foram esterilizados cerca de 500 cães e gatos.
Em Santarém, a câmara atribui 1.500 euros mensais à Associação Scalabitana de Proteção Animal para gerir o centro e prevê expandir a atual capacidade (300 animais). Pretende-se criar uma parceria para serviços como tosquias e adestramento, permitindo a profissionalização do canil.
Em Viseu, sem canil municipal, o protocolo com o Cantinho dos Animais Abandonados teve no ano passado uma verba de 70.000 euros para acolhimento, tratamento e adoção de animais capturados.
Lisboa tem uma “permanência média quotidiana aproximada de 200 cães e 130 gatos” na Casa dos Animais e tem feito perto de 2.000 esterilizações por ano, tendo uma “campanha permanente de esterilização, em particular dos gatos”.
“Na impossibilidade de atualmente realizar esterilizações no Centro de Recolha Oficial da Guarda, realizou-se um protocolo com quatro centros de atendimento veterinário que realizam as esterilizações necessárias”, referiu, por seu turno, a autarquia da cidade mais alta do país, onde há campanhas de adoção dirigidas ao público em geral e a alunos desde a creche ao secundário, com “um resultado bastante favorável (em 2019, 127 adoções até final de outubro).
O município vai aumentar e melhorar as instalações, num investimento de 200 mil euros.
Também Coimbra vai aumentar as boxes do canil/gatil e “continuar a apostar nas esterilizações” e “alargar o serviço às famílias carenciadas”. Por 30,75 (cão) e 12,30 euros (gato), os animais adotados são desparasitados, vacinados e esterilizados. Em 2019, 35% dos animais entrados estavam adotados em outubro, depois de taxas de 40,68% em 2017 e 37,64% em 2018).
Em Braga, onde foram esterilizados perto de 400 animais no ano passado e 293 há dois anos, foram adotados 365 animais em 2018 e outros 416 até outubro de 2019.