Com o consumo de café a atingir níveis históricos em todo o mundo, a tradicional “bica” portuguesa e outras variantes da bebida correm o risco de se tornarem luxos inacessíveis para muitos. Produtores e analistas do setor agora olham com preocupação para um futuro onde a oferta de café pode tornar-se insuficiente para satisfazer a crescente procura de uma das bebidas mais populares do planeta.
Portugal, conhecido pelas suas diversas maneiras de apreciar o café, não se encontra, de forma algo surpreendente, entre os cinco maiores consumidores mundiais da bebida.
Esta estatística é explicada pela preferência local pelo café expresso, em contraste com a preferência por café americano em muitos outros países, que utiliza mais grãos para obter a mesma quantidade de cafeína devido à menor extração.
De acordo com a International Coffee Organization, a Finlândia lidera o ranking global de consumidores de café, com uma média de 11,7 kg por pessoa anualmente, seguida pela Noruega com 9,4 kg e a Dinamarca com 8,5 kg. A Suécia e a Suíça ocupam o quarto e o quinto lugares, respetivamente.
Os dados compilados recentemente pelo Financial Times revelam que o consumo global de café já atinge 3 mil milhões de chávenas por dia, e este número deverá duplicar até 2050.
Prevendo esta tendência, um estudo do Columbia Center on Sustainable Investment destaca a necessidade de aumentar a produção de café em 25% até 2030 para dar resposta à crescente procura.
A produção global de café atingiu, contudo, 175,35 milhões de sacos de 60 kg em 2021, com o Brasil a liderar a produção global, fornecendo quase 40% do total mundial.
Embora mais de 70 países produzam café, a maior parte provém do Brasil, Vietname, Colômbia, Indonésia e Etiópia. Um dado alarmante da Universidade de Ciências Aplicadas de Zurique sugere que até metade das terras usadas para o cultivo de café poderão tornar-se inutilizáveis até 2050, prejudicando a oferta num momento em que a procura continua a crescer.
Este desequilíbrio entre oferta e procura não é novo, mas está a tornar-se mais acentuado.
“Numa era de aceleradas alterações climáticas, precisamos realmente de pensar de forma diferente – fora da caixa – e podemos não conseguir ter todo o café que desejamos”, adverte o Dr. Aaron David, Head of Coffee Research no Royal Botanic Gardens, em Kew. “A longo prazo, acredito que vamos pagar mais pelo café”.
Os consumidores da bebida estão cada vez mais preocupados com a origem do produto e as condições de trabalho dos produtores. Isto está a pressionar as marcas a adotarem medidas para garantir a transparência em toda a cadeia de produção, o que pode impactar os preços finais.
As mudanças nas cadeias de abastecimento, as preocupações ambientais e a atenção aos direitos humanos estão também a redefinir a indústria do café.
Enquanto os trabalhadores nas plantações de café representam a parte mais vital da produção, eles recebem menos de 10% do valor de retalho da indústria, enquanto as empresas em países importadores ficam com a maior parte dos €200 mil milhões gerados anualmente pelo setor.
Com 25 milhões de agricultores em países produtores, a maioria deles pequenos produtores com menos de 5 hectares de terra, e com a maior parte do trabalho realizado por mulheres, os desafios de rendimento e os impactos das mudanças climáticas são evidentes.
A incerteza paira sobre o futuro da produção de café em todo o mundo. Se as estimativas se confirmarem, o café pode tornar-se uma raridade tão valiosa quanto o caviar, colocando em risco tradições e rituais em todo o mundo.
Para os amantes da bebida, resta esperar que o futuro da produção seja assegurado para que a chávena de café continue a ser um símbolo de hospitalidade e encontros sociais.
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