Portugal deveria ter uma Agência para as Áreas Marinhas Protegidas (AMP), disse à Lusa a investigadora Bárbara Horta e Costa, acentuando a necessidade de articular o trabalho de diferentes entidades e de fazer cumprir a lei.
“Não temos uma autoridade que fiscalize todas as áreas e que centralize a informação e a estratégia”, criticou a investigadora do Centro de Ciências do Mar (CCMAR), da Universidade do Algarve, em declarações à agência Lusa a propósito da Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, que vai realizar-se em Lisboa entre 27 de junho e 01 de julho.
Para a bióloga marinha, apesar da autonomia dos Açores e da Madeira, Portugal é “um só país”, pelo que teria vantagem em articular a gestão global das suas áreas marinhas protegidas.
“Até para coordenar as várias interações e as cooperações, porque como há poucos recursos vamos mesmo ter de cooperar uns com os outros e quando vamos definir metodologias devíamos defini-las de maneira uniforme”, explicou.
Bárbara Horta e Costa defendeu a efetivação de uma rede de áreas marinhas protegidas para ligar o que foi criado separadamente, uma ideia que foi explorada num grupo de trabalho constituído durante a tutela de Ana Paula Vitorino como ministra do Mar.
“Sabe-se, ao nível da ciência, que as áreas funcionam melhor se estiverem em rede, porque os peixes deslocam-se. Agora, com as alterações climáticas, até os ‘habitats’ podem ir mudando de distribuição e, portanto, é melhor quando temos uma rede de áreas marinhas do que ter só pequenas áreas dispersas”, declarou.
De acordo com a investigadora, as recomendações vertidas em lei, em 2019, não estão a ser cumpridas.
“Não temos uma rede, na verdade e precisávamos de ter”, insistiu Bárbara Horta e Costa, que se tem dedicado à investigação em biologia marinha neste campo.
“Em termos de gestão, também precisamos que as diferentes entidades falem umas com as outras. Porque há diferentes entidades com competências em áreas marinhas protegidas. Mesmo no continente há várias e têm de falar e cooperar mais, de articular-se, nomeadamente na parte da fiscalização”, sustentou.
A investigadora exemplificou: “O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas é o gestor das áreas costeiras e a Direção Geral dos Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos, supostamente, é o gestor das áreas ‘offshore’, a partir das 12 milhas. Depois existe a parte da Marinha, da Polícia Marítima”.
“Quando há vigilantes de um parque, eles podem ir fiscalizar, mas devem articular com a Polícia Marítima e com a Marinha quem vai, em que dias, fazer um plano de fiscalização e isso não existe”, assegurou.
Segundo a investigadora, a articulação entre entidades neste domínio é “muito fraca” e “não existem planos” para cumprir durante o ano, nem para “cumprir os mínimos para estar no terreno”.
“Precisamos de estar no terreno para que [as AMP] não sejam só áreas no papel, que é um grande problema, até mundial. Estão no papel, mas depois não estão a ser implementadas no terreno”, afirmou.
Portugal comprometeu-se, no âmbito da estratégia europeia da biodiversidade até 2030 a ter 30% das suas águas definidos como AMP, com 10% de proteção estrita. “Uma proteção alta, em que são vedadas quase todas as atividades. Está numa lei europeia”, frisou Bárbara Horta e Costa.
“Vamos ter de cumprir e quando quisermos ter 10% das nossas áreas estritamente protegidas, sem quase atividade nenhuma, temos de colaborar com outros países para conseguir isto, porque a nível do mar territorial não vamos conseguir ter 10%, porque temos muitas pessoas, muita urbanização, muito desenvolvimento costeiro e não podemos impedir as pessoas de acederem ao mar”, especificou.
Para alcançar o objetivo dos 10% de elevado nível de proteção será necessário, segundo a investigadora, recorrer a “áreas que estão mais remotas, mais ‘offshore’, o que exigirá algum poder de decisão ao nível da União Europeia para conseguir ter acordo”, no sentido de interditar essas áreas à pesca, concluiu.