A incapacidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS) de conseguir uma gestão estratégica dos recursos humanos é apontada no relatório da Coordenação para a Reforma do SNS na área dos cuidados de saúde primários.
A coordenação para a Reforma do SNS (CNCSP) foi criada pelo anterior Governo, tendo como “duas grandes linhas orientadoras”: a “definição e disseminação de políticas de saúde e seu enquadramento estratégico” e a “conceção e desenvolvimento dos instrumentos que permitam a sua operacionalização”.
No relatório divulgado pelo Ministério da Saúde, que analisa o período entre dezembro de 2015 e outubro de 2019, a CNCSP aponta “os aspetos positivos e negativos deste trajeto de quase quatro anos” e apresenta propostas de melhoria.
Em declarações à agência Lusa, Henrique Botelho, coordenador nacional para a reforma do Serviço Nacional de Saúde na área dos Cuidados de Saúde Primários, alertou para a necessidade de se fazer o planeamento de recursos humanos para evitar “sobressaltos” no SNS.
O responsável afirmou que “desde o início das nossas funções, e desde o momento em que colocámos em monotorização, acessível a qualquer cidadão (…) o permanente balanço entre entradas e saídas de profissionais, ficámos quase chocados de só agora se começar a fazer este balanço”.
Caso não haja questões de saúde ou acidentes, as pessoas aposentam-se em Portugal aos 66 anos. “Portanto, podemos fazer uma estimativa daqueles que vão sair”, mas o que se verificou é que isso não era feito até há pouco tempo.
“Se fizermos isso, conseguimos em quatro anos desenvolver um sistema de formação de novos profissionais na justa medida daquilo que é estimado virem a ser necessários e não passarmos por estes sobressaltos de por vezes, dentro do nosso SNS, termos quebras consideráveis, prejudiciais, lamentáveis relativamente a não termos os recursos humanos necessários”, sublinhou.
Relativamente aos ganhos alcançados, o coordenador destacou o combate ao número de utentes sem médico de família. “Há quatro anos mais de um milhão de residentes em Portugal não tinham médico de família e neste momento só – e este só com todas as aspas – 623 mil não têm médico de família”, o que representa 4% da população.
“Isto quer dizer que, por ano, abatemos 133 mil utentes ao número daqueles que não tinham médico de família. É considerável numa população de 10 milhões. É um valor interessante”, comentou.
Destacou também a chegada “finalmente” da saúde oral aos cuidados de saúde primários, com “um número significativo de centros de saúde” a disporem já de gabinetes de Medicina Dentária.
“Começamos a ter experiências na área de exames complementares de diagnóstico, de participação de nutricionistas, psicólogos” e até de técnicos de reabilitação nos cuidados de proximidade.
Perante este retrato, Henrique Botelho afirmou que foram dados “passos muito importantes para tornar o SNS mais acessível, mais próximo e com mais qualidade”.
Segundo o responsável, a formação de mais técnicos na área da proximidade passa a responder de uma forma estudada às saídas expectáveis.
“Não saem profissionais porque houve um cataclismo. Saem porque ou atingiram a aposentação, e isso prevê-se, ou porque as condições de trabalho tornaram-se pouco atrativas e a competição que outros setores, nomeadamente o privado e o social, vêm fazendo em relação ao SNS, que não estava a responder competentemente a este tipo de concorrência”.
Para o responsável, criaram-se “as formas de fazer esta gestão inteligente e capaz defender, assegurar e melhorar em quantidade e qualidade o SNS”.
“Foi este o objetivo do nosso trabalho nestes quatro anos, responder, fazer as propostas, discuti-las e criar a operacionalidade necessária para tornar isto em realidade”, rematou Henrique Botelho.