Conceição Trigo, da cardiologia pediátrica do Hospital de Santa Marta, disse à Lusa que as sequelas da parte cardíaca estão ainda em estudo.
“De facto, durante a fase aguda da covid pode haver lesão direta das células cardíacas”, afirmou a cardiologista pediátrica, que falou ainda num “quadro inflamatório que pode ocorrer após a infeção”, mesmo que os doentes não tenham tido sintomas na fase aguda da doença.
Chama-se síndrome inflamatória multissistémica, “envolve vários órgãos” e, quando atinge o coração, também resulta na “inflamação do miocárdio”, explica.
A médica contou que a evolução destes casos é muito variável e que tudo depende da gravidade inicial da doença.
Durante quanto tempo as sequelas vão permanecer? Ninguém sabe.
“É muito cedo. Há doentes que ainda nem sequer têm os seis meses para avaliar sequelas. Nesta altura ainda temos muito em aberto”, disse.
Novo coronavírus passou mas deixou marcas
Mesmo com asma, Ana Cristina subia, devagar, os oito degraus que levam ao rés-do-chão onde mora, nos Olivais, mas depois da covid-19 isso tornou-se mais difícil. O vírus já foi embora, mas a tosse e o cansaço ficaram.
Ana Cristina é uma das muitas doentes pela qual o novo coronavírus passou e deixou marcas. As sequelas podem ser várias, dependendo da gravidade da doença e do estado do doente na altura na infeção.
No caso de Ana Cristina, os 52 anos já carregavam asma crónica e, mais importante, um internamento com coma induzido que durou 10 dias e lhe deixou muitas fragilidades.
“Eu já tinha febre, tosse e falta de ar há uns dias e sentia-me prostrada”, contou à Lusa Ana Cristina, que começou por se dirigir ao Hospital S. José, sendo depois transferida para o Curry Cabral.
“Não estive internada muito tempo no Curry Cabral. Fui internada na terça-feira e saí numa sexta-feira ao fim do dia”, explicou, sublinhando que desde que foi infetada o cansaço não mais a largou: “Se forço um pouquinho a minha vida normal sinto um cansaço que a médica que me deu alta disse que ia permanecer por uns tempos.”
A tosse continua, não tão persistente como quando saiu do hospital, mas conseguiu estabilizar a falta de ar com a medicação que faz diariamente (inaladores) e que fará para sempre.
Ana é seguida por uma especialista no Hospital de Santa Marta, por causa da asma, e já tem programados exames para poder retomar o tratamento experimental que seguia para essa doença crónica.
Leia também
Covid-19 está a deixar sequelas cada vez mais visíveis nos mais jovens
As sequelas da covid-19, os médicos já lhe disseram que vão “permanecer durante algum tempo”.
“Penso que nem os próprios médicos sabem”. E não sabem mesmo.
Luísa Semedo, a especialista que acompanha Ana Cristina no Hospital de Santa Marta, confessa: “Ainda não sabemos qual a percentagem daqueles [doentes que estiveram internados] que ficam com sequelas.”
“Mas uma coisa é a ideia que temos e outra coisa é fazer um estudo de acompanhamento destes doentes” e ao fim de meses tirar uma conclusão, afirmou Luísa Semedo, sublinhando que a ideia que os especialistas têm é que “uma percentagem significativa” fica com sequelas.
“Isso depois também tem que ver com doentes que têm outras patologias de base, doentes com asma, doentes com DPOC [Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica], doentes com fibrose pulmonar (…). Tudo isso vai condicionar as sequelas com que ficam”, afirmou Luísa Semedo, responsável pelo transplante pulmonar em Santa Marta.
Além dos problemas respiratórios, há os problemas musculares de quem precisa de ficar internado durante muito tempo: “Apesar de fazerem reabilitação quando estão internados, serão doentes que vão ficar com meses” de trabalho pela frente para o Serviço Nacional de Saúde.
Falta de ar, tosse, falta de forças e suor noturno são alguns dos sintomas com que muitos dos doentes ficam. Durante quanto tempo e se são ou não reversíveis “é ainda uma incógnita”.
Contudo, Luísa Semedo disse que os especialistas já estão a verificar que algumas alterações são irreversíveis.