O Conselho de Ministros decidiu aplicar uma lógica local, mesmo que diferente da desenhada pelos especialistas, para travar ou mesmo regredir a abertura da economia e da sociedade em 10 (e não onze avançados quinta-feira por António Costa) concelhos, mantendo 13 sob vigilância. “Não são nem prémios nem castigos” referiu o primeiro-ministro depois da reunião do Conselho de Ministros.
Daqui por quinze dias haverá nova avaliação e Costa não quis deixar a certeza que este será o último estado de emergência. Uma coisa são desejos, outra a realidade: “Isso depende sempre do estado da pandemia e da antevisão das medidas que é necessário adotar”, disse o primeiro-ministro numa dessintonia com o Presidente da República.
A decisão de desconfinamento foi tomada pelo Governo ao fim de quase nove horas de reunião e acaba por inaugurar uma nova fase e uma nova forma de abertura da sociedade: será a três velocidades. Há concelhos que passarão para a próxima fase de desconfinamento, os que estão com casos abaixo de 120 mil por cem mil habitantes; os que não progridem (sete concelhos), por estarem há um mês acima dos 120 casos; e quatro que, tendo em conta que estão há duas avaliações acima dos 240 casos/cem mil habitantes, regredirão para a fase anterior, ou seja, com tudo fechado, excepto cabeleireiros e manicures e apenas permitida a venda de bens ao postigo. Estes são os casos mais graves dos concelhos de Moura, Odemira, Portimão e Rio Maior.
Quem vive nestes quatro concelhos tem ainda a proibição de sair do seu concelho, com as exceções que são conhecidas, tal como vigorou na semana da Páscoa.
Ainda na semana passada, António Costa tinha reunido com autarcas e foi às populações destes concelhos e aos autarcas que deixou uma palavra “especial”: “Não são nem prémios nem castigos. São medidas de saúde pública, para segurança das próprias populações”. Prometeu-lhes acentuar os testes e o isolamento para controlar a evolução da doença. “Não vale a pena ignorar a realidade porque ela vem ter connosco”, disse, defendendo os testes massivos para encontrar os casos escondidos. Se tal não for feito, a realidade pode bater à porta da “pior” maneira possível. “Isto é mesmo uma luta que temos de fazer em conjunto na luta contra a pandemia”, disse.
Há ainda 13 concelhos debaixo de olho que, apesar de avançarem, daqui por 15 dias, podem ter “boas notícias” e progredirem novamente para o desconfinamento mais geral ou, se se mantiverem acima do nível de risco, ou regridem ou param. “Têm de ter atenção à forma como controlam a pandemia”, sobretudo os mais populosos, disse o primeiro-ministro.
Com esta decisão, António Costa deixa cair o indicador desenhado pelos especialistas, que lhe sugeriram que a lógica de confinamento local levasse a que os concelhos vizinhos dos que estão em risco ficassem com as mesmas regras. Ou seja, os concelhos vizinhos de Odemira, Portimão, Moura e Rio Maior teriam de também ficar com as regras da primeira fase de desconfinamento. Em vez disso, o Governo passou a contar com a permanência em situação de risco de um determinado concelho há mais de um mês.
O ÚLTIMO ESTADO DE EMERGÊNCIA?
A lógica de confinamento local tinha sido admitida pelo Governo em Março e, nos próximos 15 dias, será ao abrigo legal do estado de emergência. Costa não se atravessa por este ser o último estado de emergência, como é desejo do Presidente da República. Se tudo melhorar “provavelmente, sim”, disse, mas lembra que quando se abre, aumenta-se o risco e é certo que daqui a 15 dias Marcelo Rebelo de Sousa ouvirá o Governo sobre o que “parece ou não apropriado adotar”. E aqui há várias pedras na engrenagem.
Se há um ano Costa e Marcelo andaram às avessas com o estado de emergência – Costa não considerava necessário e Marcelo sim, para dar cobertura legal a confinamentos e evitar problemas na justiça – agora os papéis inverteram-se. E Costa lembrou, na conferência de imprensa esse debate jurídico na altura. “Espero que daqui a 15 dias o Presidente da República não sinta a necessidade ou o Governo não sinta a necessidade de pedir, o que quero garantir é que nunca hesitaremos em solicitar as medidas que julgarmos estritamente necessárias para a salvaguarda da saúde pública. Isso está acima de tudo”, assumiu.
ESCOLAS ABERTAS EM TODO O PAÍS
A decisão de passar o país para a fase seguinte, com a abertura das escolas secundárias e universidades em todo o país sem exceção, baseia-se nos dois indicadores-chave que foram adotados para definir a matriz de desconfinamento, agora já mais perto do amarelo do que do verde. Por um lado, a incidência da doença está numa “clara redução” desde o dia 9 de Março, apesar de o ritmo de transmissão se estar a aproximar do limiar “perigoso”, disse o primeiro-ministro. Por isso, a “generalidade” do país pode avançar, mas com alertas para este segundo indicador que pode colocar tudo em risco.
Apesar de alguns especialistas terem defendido, na reunião do Infarmed, que o Governo devia esperar para passar para a próxima fase, António Costa não concorda e defende que há uma “relação de confiança” entre quem toma as decisões e os cidadãos e que um dos pilares da confiança é a “previsibilidade” e por isso há nesta fase um papel importante da responsabilização individual. “Quando o nível de vacinação for superior, daqui a uns meses, o risco será menor. Neste momento o risco é muito elevado, temos de manter motorização muito rigorosa”.
ALÍVIO NOS CRITÉRIOS DEPOIS DE MAIO
No início de maio começa, se tudo correr bem, a última fase do plano de desconfinamento e, a partir daí, o Governo admite vir a estudar “novos critérios” para definir o risco nos vários concelhos. Isto porque esse calendário coincide com o previsto pela task force para a vacinação dos mais frágeis — “se não houver mais sobressaltos”. E, nesse caso, o risco de doença grave será menor, apesar de o risco de transmissão ser maior (porque estão mais atividades abertas).
O que está previsto, lembrou Costa, é que no final de abril os maiores de 70 estejam vacinados, e no final de maio o mesmo aconteça com os maiores de 60. Ou seja, quando estas faixas etárias estiverem vacinadas, estarão vacinados 96% daqueles que revelaram maior taxa de mortalidade. “Vamos passar a ter uma situação de menor risco, o que justificará um novo quadro de critérios, mas isso não significa que o risco desapareça”, sublinhou.
O objetivo máximo é “evitar uma quarta vaga”, assumiu, pedindo cautelas e pedido maior responsabilidade à medida que aumenta a liberdade. É que há a incógnita das variantes e é preciso fazer tudo para o país não ser surpreendido com uma nova vaga.
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