A recente moção intitulada “Ganhar o Algarve”, apresentada este domingo por Luís Graça, militante do Partido Socialista (PS) de Faro e atual presidente da Federação do PS Algarve, coredigida pelos presidentes da Associação Académica da Universidade do Algarve Fábio Zacarias, Guilherme Portada, Leonel Morgadinho, Pedro Ornelas e Raquel Jacob, e outros subscritores, representa uma tentativa audaciosa de posicionar o PS Algarve como o partido com a capacidade de liderar a transformação da região. No entanto, apesar da retórica inspiradora, é necessário questionar se as propostas avançadas realmente correspondem às necessidades urgentes do Algarve e às expectativas dos seus cidadãos.
A moção, como o próprio título sugere, visa “ganhar o Algarve”, mas a grande questão que emerge é: ganhar o quê e para quem? As propostas delineadas cobrem áreas fundamentais como habitação, saúde, mobilidade, e sustentabilidade ambiental, no entanto, muitos dos desafios mencionados não são novos. O que se nota é a ausência de soluções inovadoras e imediatas que possam realmente alterar a trajetória da região, especialmente numa altura em que o Algarve enfrenta uma crise habitacional e de mobilidade, aliada a crescentes desigualdades sociais.
A moção "Ganhar o Algarve" apresenta-se como um documento ambicioso, mas a sua concretização exigirá mais do que boas intenções
A questão da habitação, uma das mais sensíveis no contexto algarvio, é abordada com promessas de construção de habitação acessível, uma medida crucial para uma região em que o custo de vida se encontra significativamente acima da média nacional. Contudo, apesar do reconhecimento deste problema, a proposta de soluções a longo prazo, como a revisão dos Planos Diretores Municipais (PDM) e a criação de novas áreas habitacionais, pode ser insuficiente face à urgência da crise. O foco em terrenos não cultivados para habitação acessível é uma proposta positiva, mas, sem um plano de ação imediata, corre o risco de ser mais uma promessa adiada.
A criação da Região Administrativa do Algarve, uma das bandeiras levantadas na moção, levanta outras questões pertinentes. Enquanto a regionalização pode ser uma via para aumentar a eficiência e a representatividade local, esta proposta carece de um maior detalhe em termos de implementação prática. O Algarve, como bem se aponta, é uma região diversificada com assimetrias significativas entre o litoral e o interior. O projeto de regionalização, sem um plano claro de desenvolvimento infraestrutural que contemple estas realidades, pode acabar por beneficiar apenas as áreas mais desenvolvidas, perpetuando o desequilíbrio existente.
Outro ponto chave da moção é a mobilidade, um dos grandes desafios da região. O PS Algarve manifesta o seu apoio na eliminação das portagens da Via do Infante, uma vitória que certamente beneficiará a população local e os turistas, mas quanto à eletrificação da linha ferroviária e a criação de um metrobus, propostas ambiciosas, o sucesso dessas iniciativas dependerá de uma execução rigorosa, algo que, até à data, tem sido um ponto fraco nas promessas de infraestruturas na região.
A saúde também é um tema central na moção, com ênfase na necessidade urgente de um novo Hospital Central no Algarve. A carência de profissionais de saúde, especialmente em áreas críticas como os cuidados primários, é reconhecida, mas o que falta é uma estratégia concreta para a atração e retenção desses profissionais. Sem isto, qualquer investimento em infraestruturas de saúde corre o risco de ser insuficiente para enfrentar as necessidades da população.
Por fim, a sustentabilidade ambiental é apresentada como uma prioridade, com propostas como a construção da primeira central de dessalinização de água do país e a implementação de políticas hídricas inovadoras. No entanto, o Algarve continua a enfrentar grandes desafios ambientais, e a moção carece de um enfoque mais abrangente na conservação dos ecossistemas naturais, um fator essencial para a preservação do turismo e da qualidade de vida na região.
Em resumo, a moção “Ganhar o Algarve” apresenta-se como um documento ambicioso, mas a sua concretização exigirá mais do que boas intenções. O PS Algarve deve, portanto, apresentar soluções mais concretas e imediatas para os problemas que afetam a região. Somente assim poderá ganhar não apenas o Algarve, mas também a confiança dos algarvios.
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