Vi nas redes sociais imagens da ginasta profissional Simone Biles nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Estava a começar a escrever o artigo deste mês sobre um tema bem diferente, mas fiquei presa àquelas imagens como um exemplo de resiliência e humildade. Na altura em que os holofotes estavam virados para a atleta, teve a humildade de parar e assumir o stresse angústia em que vivia.
Mesmo sem chegar ao pódio, Simone Biles tornou-se uma campeã. Com a sua coragem teve a capacidade de trazer ao de cima a discussão sobre a saúde mental dos atletas e sobre a necessidade de repensar mais a pessoa do que a competitividade.
Ainda há algum tempo a fadista portuguesa Raquel Tavares parou a sua carreira artística por sentir que não tinha tempo para si e que não tinha vida própria.
Simone e Raquel são dois exemplos de quem teve a capacidade de perceber que não estava bem, mas existem muitas pessoas que não sabem ou não querem admitir isso.
Quase todos nós em várias alturas da nossa vida somos confrontados com situações que geram stress, ansiedade e por vezes, depressão, mas nem sempre temos a capacidade de perceber que precisamos de ajuda, nem a humildade de a procurar, quando necessária.
Quando estamos nestas situações, acontece, por vezes, ter de abdicar de sonhos ou desistir e depois ter de começar de novo.
O médico Roberto Aylmer, com especialização em gestão em contextos complexos e noBurnoutExecutivo escreveu que a situação de que falamos, tal como a situação da tenista Naomi Osaka são «um marco para uma nova era onde a vulnerabilidade é necessária e aceite. O lema deste novo contexto resume-se na frase da tenista de origem japonesa: “É ok não estar ok” que saiu na capa da revista americana Timeno início de 2020»
A frase de Simone Biles: «Não somos apenas atletas, somos pessoas. E às vezes é preciso dar um passo atrás», não deixou ninguém indiferente.
Este «passo atrás» poderá permitir dar dois passos para a frente. Tudo isto faz sentido se existir a capacidade de alterar padrões, medos, bloqueios e modificar comportamentos. Se a pessoa não se conhecer terá mais dificuldade em todo o processo. Daí a importância do auto conhecimento. De saber o que queremos para nós e o que nos faz bem e não ficar agarrado ao que os outros querem ou esperam de nós.
A pandemia veio agravar muitas situações de depressão. Nas redes sociais, por exemplo, é partilhado o melhor, vidas quase perfeitas, mas quando há a coragem de mostrar o outro lado, tanto pode ser desastroso para a imagem da pessoa em causa, como também pode trazer ajuda.
E então quando os nossos defeitos nos afectam e nós ilusoriamente pensamos que são qualidades? Achava o máximo ser perfeccionista e a forma como elogiavam os meus resultados fazia-me pensar que o perfeccionismo era uma virtude.
Afinal ser perfeccionista revelou-se um defeito que trouxe alguns desafios (de há um tempo para cá deixei de usar a palavra problemas e substituí por desafios).
Custa sempre assumir a nossa vulnerabilidade, mas todos temos alguma vulnerabilidade, e isso por vezes até nos torna maiores.
Ressoa a frase de Simone Biles: «Temos de proteger a nossa saúde e o nosso bem-estar e não fazer apenas o que o mundo quer que façamos».
O exemplo que vem destes desportistas, vistos à escala global como heróis e em certa medida como pessoas infalíveis, vai permitir reposicionar a questão da competitividade versusbem-estar pessoal.
E se bem aproveitada a oportunidade irá permitir recolocar toda esta questão junto das gerações mais jovens, as mais susceptíveis nesta matéria (ou, pelo menos, as que aceitam a sua exposição de forma mais pública).
Estas partilhas surgiram por causa dos Jogos Olímpicos, cujo lema é: «Mais Rápido, Mais Alto, Mais Forte» em latim «Citius, Altius, Fortius», que foi adoptado pelo fundador dos Jogos modernos, Pierre de Coubertin, no Séc. XIX.
No passado dia 20 de Julho, o Comité Olímpico Internacional (COI) modificou este lema para acrescentar a palavra «Juntos». O presidente desta entidade, Thomas Bach, sublinhou a necessidade de solidariedade durante estes tempos da pandemia de Covid-19.
Com esta mudança na Carta Olímpica refere Bach «o trabalho colaborativo produz resultados mais rápidos e melhores do que se cada um trabalhasse sozinho para se proteger do progresso do outro».
Felizmente na vida dos atletas, como na vida de cada um de nós, há momentos em que do nosso âmago sai mais o desejo de cooperar do que de competir.
* A autora não escreve segundo o acordo ortográfico