Salvador Rato partilha, com os leitores do POSTAL, a “EXPERIÊNCIA” que teve com o Serviço Nacional de Saúde, depois de ter ficado doente com a covid-19.
A incoerência e falta de coordenação entre a Direcção Geral da Saúde, Ministério da Saúde e Unidades de Saúde, foi incrível.
No passado dia 18 Março tive de realizar um teste e deu positivo. Fui contactado de seguida pela Unidade de Saúde. Os primeiros procedimentos de acompanhamento correram bem e iniciei então o meu isolamento profilático.
A declaração da Segurança Social aprovada pela Autoridade da Saúde foi também emitida logo de imediato. Contudo, a segunda fase do acompanhamento, fase em que somos contactados regularmente para saberem como está o nosso estado de saúde, começou a revelar alguns sinais de descoordenação.
Foram-me ligando de vez em quando, sempre a perguntar por sintomas, mas de cada vez que atendia o telefone parecia que estava a ter uma conversa nova…
Tinham registado as minhas deslocações para fora do país, mas não estavam a registar nada do acompanhamento em si. Tive de repetir sempre que era um caso “assintomático”, que nunca tinha tido febre, nem tosse, etc., a não ser os olhos cansados com as lentes de contacto (porque já não usava óculos há alguns anos). E tudo isto parecia sempre novidade em cada telefonema… Até que, a dada altura, me foi pedido (e gostei da inovação!) que enviasse diariamente um e-mail simples a dizer que estava sem sintomas, para poderem guardar o histórico de acompanhamento de forma regular e consistente.
Mas depois, voltaram a surpreender pela negativa. E desta vez de forma muito séria. Quando cheguei ao fim dos 14 dias de isolamento, a Técnica Superior da Unidade de Saúde Pública enviou-me um e-mail com a Alta Médica, dizendo que o isolamento estava terminado e que não havia necessidade de eu realizar novo teste e obter um negativo, porque estava sem sintomas há algum tempo.
Passo a citar:
“Sendo o prazo estabelecido de 14 dias para a vigilância dos contactos de caso positivo da doença COVID-19 e estando estes assintomáticos durante este período, informa-se que concluiu o seu período de isolamento profilático, já não carecendo de efetuar contacto diário para esta unidade. (…) Ainda relativamente à sua questão de se deve fazer teste, o mesmo não parece necessário, dada a ausência de sintomas.”
A resposta não me pareceu adequada, pelo que devolvi o seguinte email:
“Obrigado pela informação prestada. Eu gostava de, no entanto, fazer na mesma um teste para ficar com 100% de certeza que estou negativo. Preciso de ir visitar os meus filhos com os quais não estou há quase 3 semanas, e os mesmos estão em quarentena com a mãe e avós.” E pedi então, no mesmo e-mail, o envio da respectiva prescrição (a qual só chegou passadas 72 horas, pelo que novamente recorri a ajuda externa para ter de imediato nova prescrição).
No dia 01 de Abril fiz então novo teste. Mas, e mais uma vez, continuei a ser indevidamente surpreendido, pois entre o dia 01 e 05 de Abril (dia em que recebi novo resultado), a incoerência do que me foi sendo comunicado em cada telefonema foi variada:
⏩🔕♳ – A Técnica Superior da Unidade de Saúde Pública já me tinha referido que não existia necessidade de eu fazer um novo teste; mas…
⏩🔔♴ – Um Enfermeiro de Família, também ligado ao Ministério da Saúde como a Técnica Superior, diz que só posso obter alta se tiver pelo menos um teste negativo; e…
⏩🔔🔔♵ – Um segundo Enfermeiro de Família (Espanhol) diz que só posso ter alta com 2 testes negativos intervalados por 48 horas.
Fiquei perplexo com tanta diferença de argumentação e suporte de procedimentos, que me pareceu o verdadeiro reflexo de uma gerigonça, em que cada elemento / órgão de decisão tem a sua própria visão da realidade, mas em que todos reportam, supostamente, à mesma instituição…
E qual o resultado do meu novo teste? Para meu espanto, deu novamente positivo. Se eu tivesse ido pela primeira opinião da Técnica Superior, enfim… E o mais grave ainda, para colmatar a situação, surgiu a seguir: Assim que recebi o novo teste positivo, liguei de imediato ao SNS24, para perguntar o seguinte:
“Tenho um segundo teste positivo. O que devo fazer? É renovado um novo período de isolamento? Qual o critério e quantos dias? E quando devo fazer novo teste?”
A resposta do SNS24, a todas as minhas questões, foi simplesmente “Não sabemos”. Algo que me deixou desconfortável, com a clara sensação de que a gestão administrativa de processos como o meu estava longe de ser bem executada.
Não satisfeito com as respostas que o SNS24 me tinha acabado de dar, decidi então contactar por e-mail um dos Enfermeiros de Família (que até então me tinha trespassado alguma segurança na gestão do processo), pedindo a sua ajuda e condução da situação. No entanto, volto a ser surpreendido pela negativa, dado ter recebido a seguinte resposta:
“Julgo que no seu caso será melhor contactar a Saúde Pública, dado que o seu processo tem sido gerido por esta ou, no caso de não ter resposta, contactar o SNS24. De qualquer forma, tem de se manter em isolamento e manter um controlo de sintomas”.
Confusão máxima instalada. Ou seja, fui aconselhado a falar com a Saúde Pública (por intermédio da referida Técnica de Saúde que, por ela, nem teria sido necessário realizar segundo teste), ou então com o SNS24, o qual já me tinha respondido, no entretanto, “Não sabemos”.
Não posso estar de acordo com este tipo de gestão e falta de articulação clara entre a Direcção Geral de Saúde e o Ministério da Saúde. Mais importante do que serem abordadas as hipérboles e planaltos estatísticos associados à evolução deste novo coronavírus, importa saber como pretendem articular a gestão da operações e coordenação de equipas e sistemas, hoje e no futuro. Porque, à data de hoje, o modelo de articulação parece-me obsoleto e sem a devida orientação.
Em tempos de crise, as equipas têm de ser ajustadas às necessidades do momento. E, neste momento, não consigo reconhecer um nível de competência minimamente aceitável da nossa Direcção Geral de Saúde e Saúde24.
Aquela viagem polémica de elevador, na qual a Dra. Graça Freitas sugere que podem viajar quatro elementos, desde que de costas de uns para os outros, acaba por reflectir uma parte do resultado da gestão a que assisto: Não se cruzam processos, cada telefonema parece uma conversa nova, são dadas indicações inconsistentes entre os profissionais de saúde. É urgente surgir quem olhe para o fluxo de processos de A-Z e defina uma remodelação da gestão precária a que se assiste.
Atenção: Este meu relato pretende ser uma crítica construtiva ao SNS24 e à Direcção Geral de Saúde. Aos hospitais, médicos e a todos aqueles que continuam na frente para nos manterem em sociedade, deixo um forte abraço de força por esta fase mais dura do Vosso trabalho.
Um abraço,
Salvador Rato
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