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Na cultura europeia temos de recuar ao séc. IX para entender os “caminhos de Santiago”. Nessa época medieval acreditava-se que a relíquia do apóstolo Santiago Maior estava na Catedral de Santiago de Compostela. E essa rota só mais tarde foi superada pela Via Francigena (com destino a Roma) e, claro, pela peregrinação a Jerusalém. Em todas elas o peregrino atingia uma bênção imensa, pois ao chegar ao seu destino era-lhe concedida indulgência plena.
São vários os caminhos pela Europa e até no nosso País há muito por onde escolher. Nestes dias, à distância de um clique, pode o peregrino aceder a sites muito completos e preparar com calma a sua rota.
Recuando no tempo, lembramos que a palavra “peregrino” advém do latim per aegros, que significa “os que atravessam os campos”. E entre campos ou estradas de alcatrão, este itinerário espiritual e cultural foi declarado e acarinhado, em 1987, como o Primeiro Itinerário Cultural Europeu. Pode ser feito a pé, de bicicleta, de burro ou de forma mais cómoda, mas perde o verdadeiro sentido de “caminho”. Já diz o provérbio que “o caminho se faz andando”.
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Ao longo dos tempos, a sua fama foi decaindo, mas no séc. XX houve um ressurgimento e, segundo os registos oficiais, os peregrinos não pararam de aumentar. Mas nem todos o fazem por questões de fé, ou motivos religiosos. Há muitos que o fazem por lazer ou unicamente como um percurso de descoberta interior. Um tempo de paragem, de contacto com a Natureza e, igualmente, com a simplicidade de viver o quotidiano despojadamente.
Há um certo romantismo que esconde a dureza agreste deste caminho. São os filmes, as séries ou os romances. Igualmente os testemunhos levados à estampa que, com maior realidade, nos indicam os obstáculos e os momentos de superação. Esses sim, são dignos de nota.
Neste contexto, Fátima Rodrigues narra, num livro tocante e organizado em forma de diário, como partiu de Zurique e se fez, “literalmente”, ao caminho, percorrendo 2.281 km.
Uma aventura impossível – dirá o leitor! Mas assim aconteceu.
Temos como resultado desta experiência única, um pequeno grande livro repleto de fotografias, de vivências, com encontros e desencontros, dores e sorrisos. Em tom de diário, a partilha da escritora é contagiante e a vontade fica como uma semente latente que um dia (talvez) vá florir.
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É admirável esta valentia e determinação de Fátima Rodrigues que nesta obra Ocaminho deSantiago em 81 dias – Zurique / Santiago de Compostela(publicado pela editora By the Book), deixa uma mensagem clara e desprovida de moralismos.
Convém lembrar que este livro contou com o apoio do Coletivo Zebra, uma organização civil que promove o “andar a pé” como atividade regular, natural, gratificante e acessível. Como diz a autora no fecho da obra, «A minha meta era Santiago, tudo o resto foi colocar a coroa. Sinto vontade de programar a próxima viagem. Será que o Caminho tomou posse de mim?».
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