O veraneante que chegava à região atravessando a serra, tomava a N125 e, ao longo desta, em placas informativas de cimento, brancas, sucediam-se nomes exóticos de povoações gravadas a preto – Patã, Almancil, Nexe, Estoi. Nomes tão exóticos quanto as casas coloridas que iam povoando o caminho, emolduradas pela luz clara que destacava o contraste do verde arbóreo com os solos avermelhados.
Eram casa cujas fachadas estavam revestidas de pinturas a fresco a imitar marmoreados, como se da terra emanasse um gosto requintado de memórias de ricos palácios.
Isto faz com que o Algarve seja a única região do país com fachadas revestidas de pinturas a fresco. São frescos coloridos de belíssimas imitações de pedra, saídas do engenho de oficinas locais que pintavam a paisagem em tons quentes, numa continuidade telúrica. Pinturas ao gosto dos mestres das oficinas e dos proprietários que as encomendavam expressavam desde a mais requintada e perfeita imitação de mármore até à sensibilidade e vontade da mão teimosa que as pintava. Não se trata do resultado de uma sistematização industrial de cor única, antes pelo contrário, cada traço, cada aguada de tinta, cada nuance, cada desenho a imitar pedra, são elementos únicos pintados em cada fachada – por isso, originais e irrepetíveis.
Embora, vulgarmente designadas de escaiolas, do italiano scagliola, técnica originalmente elaborada com argamassas de estuque coloridas aplicadas no interior das habitações, as escaiolas algarvias diferem desta técnica por se tratar de pinturas a fresco, o que lhe confere superior resistência às intempéries a que estão sujeitas no exterior. Eram métodos construtivos simples que surgiam da aplicação de argamassa de cal, estendida com talocha e régua, sobre a qual eram pintados os fingidos com a argamassa ainda fresca. Da mão do artífice saíam os veios da pedra, os pequenos minerais, as nuances de cor e o desenho da estereotomia da pedra. Realizado por jornadas para que a pintura fosse sempre executada sobre a argamassa fresca, de modo a que os pigmentos ficassem bem incorporados no reboco, o que confere a estes acabamentos uma resistência secular. Mais do que qualquer tinta contemporânea.
Esta técnica decorativa é indissociável das construções do último quartel do século XIX e permaneceram no tempo até meados de novecentos, acompanhando o abandono dos antigos beirados que deram origem a ricas platibandas profusamente decoradas com trabalhos em argamassa, ornamentadas com desenhos esgrafitados, num jogo de cores contrastante com as paredes marmoreadas.
Ainda que a maior parte destas casas sejam construções que acompanharam o crescimento das vilas e cidades algarvias, depressa ultrapassaram as fronteiras urbanas e difundiram-se na paisagem de toda a região, marcando um tempo e um modo alicerçado no gosto de bem receber.
Estes elementos arquitetónicos são parte de uma gramática decorativa singular, de um património único, original do Algarve, que urge salvaguardar para usufruto das gerações futuras.
Pedro Gago
(Técnico Superior da Direção Regional de Cultura do Algarve)