Os ex-militares que serviram de ‘carne para canhão’, nas guerras coloniais em África, têm andado eufóricos, nos grupos de antigos combatentes no Facebook, pela atribuição de um pequeno crachá de lapela por terem participado naquelas guerras. Enquanto se distraem com a insígnia não falam na política de trampa deste país e na realidade em que muitos desses combatentes sobrevivem.
Aquele crachá pretende ser o ‘reconhecimento’ do esforço da juventude e suas famílias, nada mais enganoso. Na realidade a juventude da década de 60 e parte da de 70, hoje com mais de setenta anos, foram para a guerra obrigados pelo regime político de então, dezenas de milhar foram nos porões de barcos, que já teriam passado os limites de vida útil, em condições sub-humanas, passaram privações de todo o tipo, viram os camaradas ao seu lado caírem mortos, muitos milhares regressaram mutilados ou ‘cacimbados’ com necessidade de apoio económico e psicológico que, até hoje, nunca lhes foi prestado. Mais de cinquenta anos volvidos vem este regime pretensamente democrático e humanista oferecer uma insígnia para a lapela! O regime político não lhes proporciona assistência diferenciada na saúde e na velhice como os outros países fazem. Existe um único Lar para os militares e ex-militares para um universo de muitas dezenas de milhar de ex-combatentes que deviam usufruir dele, em meio século não terá havido dinheiro para construir mais lares? Mas há dinheiro à farta para as rendas excessivas da EDP, concessionárias das autoestradas e TAP!
A actual classe política não faz a mínima ideia do que aqueles homens passaram enquanto militares, nem querem saber das condições em que muitos vivem, os seus mandantes económicos assim lhes exigem. Os políticos de hoje são os descendentes e seguidores do regime e dos interesses obscuros de então.
O Estatuto de Antigo Combatente aprovado pelo actual governo instituiu dois ‘benefícios’; poder visitar museus sem pagar entrada e passe gratuito nos transportes públicos em Lisboa, Porto e áreas metropolitanas com sistemas de transportes públicos. Creio que homens com cerca de oitenta anos não andarão frequentemente a visitar museus e os que vivem no interior do país não têm direito a transportes gratuitos. A assistência social e na saúde ‘não interessa’. Que pouca-vergonha! Os responsáveis políticos que não me apareçam com pele de borrego e falinhas mansas para me adormecerem.
Alguns ex-combatentes dizem que é melhor isto do que nada, eu pergunto: isto é alguma coisa? Acordem!
Algumas autarquias têm feito cerimónias de homenagem aos seus heróis das guerras do ultramar, apoio tais iniciativas locais. Embora exista uma vontade genuína dos seus promotores em reconhecer publicamente o esforço dos seus concidadãos, e lembrar os tombados em combate, acaba por servir indirectamente os interesses ideológicos da macroestrutura política. Virá o tempo em que serão já poucos os vivos, então serão feitas homenagens ao nível nacional, tal como aconteceu com os heróis da primeira guerra mundial, nesses dias vindouros os poucos que estarão vivos já não representarão nenhum ‘perigo’ de reivindicações económicas, sociais ou políticas, por isso já dará ‘jeito’ aos governantes de então para eles próprios se enaltecerem e convencerem a juventude a irem para as guerras que derem jeito à elite governante.
Eu costumava dizer aos meus alunos para olharem sempre para a realidade com um cifrão desenhado nas lentes dos óculos.
* Licenciado em Economia pelo ISEG – Lisboa
Mestre em Educação de Adultos e Desenvolvimento Comunitário pela U. Sevilha
Professor aposentado