O Dia Europeu do Ex-Fumador é celebrado no próximo dia 26 de setembro, em todos os Estados-Membros da União Europeia, com o objetivo de felicitar todos os que se tornaram ex-fumadores ou que deram os primeiros passos para deixar de fumar.
O último Inquérito Nacional de Saúde (INS)/2019, realizado em Portugal Continental, a pessoas com 15 ou mais anos, indicou que 61,1% nunca fumaram, 21,4 % eram ex-fumadores e 17 % eram fumadores, tendo o consumo de tabaco diminuído em comparação com os dados do INS de 2014.
Tornar-se ex-fumador não é tarefa fácil. É necessário foco e uma grande dose de motivação e muitos necessitam de ajuda profissional para fazer face aos sintomas de abstinência e ao prazer da maquiavélica nicotina. No final, quando a conseguem ultrapassar, apesar das dificuldades, surge um sentimento enorme de satisfação e objetivo superado, com repercussões na sua qualidade de vida.
Apresento-vos uma história muito sintética do ex-fumador Jacinto de 55 anos:
Na sua infância, passava a maior parte das manhãs a assistir na televisão aos desenhos animados do lendário Lucky Luke, com o cigarro a surgir, frequentemente e com naturalidade, no canto da sua boca e nas mais diversas e entusiásticas aventuras.
Aos 12 anos, iniciou o consumo de tabaco, aliciado e influenciado pelos amigos de infância do seu bairro e por uma necessidade de ser aceite pelo grupo, aliado a uma perceção de encantamento e um glamour, emanado pelas intensas campanhas publicitárias e de marketing, encomendadas pela indústria tabaqueira.
Casou aos 25 anos. Ele e a sua esposa Maria fumavam diariamente vinte cigarros cada um e tinham o hábito de fumar dentro de casa. Dois anos depois, a sua esposa engravidou. A filha Matilde nasceu e os pais decidiram não continuar a fumar no interior da habitação.
Aos 30 anos, ingressou como técnico numa Operadora de Telecomunicações, função que adorava, visto estar em constante movimento e contacto social, aproveitando as diversas deslocações para fumar.
A Matilde, perante a informação que recebia nas aulas do antigo Ensino Primário sobre os malefícios do tabaco e com medo de “perder” os seus pais, insistia para que estes deixassem de fumar, tendo tido efeito positivo na mãe, mas o pai Jacinto não chegou a fazer nenhuma tentativa de cessação tabágica.
Aos 50 anos, começou a sentir grande cansaço físico e tosse constante, tendo dificuldade em exercer a sua profissão na plenitude. Nesta fase, nasce a sua neta Carolina, levando-o a tomar a decisão de tentar o processo de iniciação de cessação tabágica sem auxílio profissional.
Durante este processo, conseguiu estar vinte e quatro horas sem fumar, porém, ao surgirem os sintomas de privação da nicotina, irritabilidade, insónia e outros, num convívio com amigos no café do bairro, volta a cair na tentação de fumar.
Passado um ano, perante o agravamento das suas debilidades físicas, decidiu aderir a uma consulta de cessação tabágica, no seu Centro de Saúde, constituída por um pneumologista, um enfermeiro e um psicólogo. Na primeira consulta, foi-lhe efetuada uma avaliação através de vários testes, registando-se valores altos na dependência da nicotina e na dependência psicológica.
Ao fim de um mês e de quatro consultas, com três semanas de antecedência, definiu o dia D (data em que a pessoa decide que vai deixar de fumar) para o dia 25 de abril, dia da Liberdade.
Nessas três semanas, informa os seus colegas de trabalho, amigos e familiares, toma a medicação prescrita, põe diariamente em prática os conhecimentos e as técnicas apreendidas na consulta de psicologia, reduz para três cigarros, atrasa ao máximo o primeiro cigarro da manhã e na véspera, retira todos os cinzeiros. Onde costumava ter os cigarros, tem uma lista feita por ele com os principais motivos que o levaram a decidir deixar de fumar.
O primeiro mês sem fumar foi difícil, sentiu alguma irritabilidade e uma ligeira dor de cabeça, para fazer face a estes sintomas, iniciou técnicas de relaxamento e começou a fazer caminhadas. O mais importante esteve sempre presente, ou seja, a determinação e a recompensa em ser livre e saudável.
Passado um ano, o Jacinto sente-se muito satisfeito, teve alguma tentação em fumar um cigarro, mas conseguiu resistir e, atualmente, já não pensa em fumar. Sente-se mais ativo, com mais energia e voltou a exercer as suas funções, com naturalidade.
Esta história, pode ser o reflexo das várias pessoas que se encontram no processo de cessação tabágica. A decisão de deixar de fumar é individual e de cada um e passa muito pelo autoconhecimento, para tomar as melhores decisões no caminho da liberdade e da independência.
Existem algumas pessoas que deixam de fumar somente com a sua força de vontade, mas a grande maioria só consegue a cessação tabágica com auxílio de profissionais, sendo que, apenas cerca de 5% dos fumadores que tentam cessar o consumo tabágico obtêm sucesso e atingem uma abstinência duradoura. Ao invés, alguns estudos realçam que as intervenções baseadas em evidências científicas aumentam os casos de sucesso para 10% a 30%.
O aconselhamento psicológico é frequentemente utilizado no âmbito da cessação tabágica e recorre à promoção de competências de resolução de problemas, tomada de decisão, estabelecimento de objetivos e motivação, auto-eficácia e relaxamento, entre outras técnicas.
Os benefícios de parar de fumar são evidentes. Após 2 semanas a 3 meses começa-se a respirar melhor, a sentir mais energia e o risco de enfarte de miocárdio diminui. Após 1 ano o risco de ataque cardíaco diminui para cerca de metade e após 2 a 5 anos o risco de acidente vascular cerebral diminui, sendo semelhante ao das pessoas que não fumam, ficando por indicar muitos outros benefícios.
Um ex-fumador, antes de dar um passo na ação para deixar de fumar, decide encarar a realidade, analisar os prós e os contras, motivar-se e ter a coragem de aceitar e percorrer este caminho difícil e angustiante, até à cessação tabágica, sentindo no final deste processo uma alegria e um prazer imenso em ter abraçado a vida.
Links relevantes:
https://www.fundacaoportuguesadopulmao.org/apoio-ao-doente/cessacao-tabagica#69
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