A inveja e a caridade são como aqueles vizinhos que fingem dar-se bem, mas que passam a vida a competir. A inveja espreita pela janela e repara que o vizinho tem uma piscina nova. “Quem é que ele pensa que é?”, murmura, enquanto a caridade, ao lado, já está a bater à porta para perguntar se o vizinho precisa de ajuda a encher a dita piscina. A inveja tem uma rispidez fascinante, um talento para ver no sucesso dos outros uma afronta pessoal. A caridade, com o seu ar sereno e ligeiramente condescendente, só quer dar e dar, como se o mundo fosse um eterno saco do Pingo Doce à espera de ser partilhado.
No Algarve, estas duas forças têm terreno fértil para se confrontarem. A inveja surge no Instagram, quando alguém publica uma foto a comer marisco no mercado de Olhão. “Quem é que pode pagar isso em dezembro?”, pensa a inveja, com um suspiro sofrido. A caridade, por sua vez, já está a partilhar o endereço do restaurante nos comentários, acompanhada de uma nota sobre como os pescadores da zona merecem o nosso apoio. A inveja critica em silêncio; a caridade faz de cada oportunidade uma causa nobre.
A inveja não é má pessoa. Só é… sensível. Acha que o sucesso dos outros diminui o seu próprio valor, como se o mundo tivesse uma quantidade limitada de felicidade. Se alguém ganha, é porque outro alguém perde. É aquele amigo que ouve que foste à praia da Marinha e logo comenta: “Pois, mas na última vez que lá fui estava cheia de medusas.” A caridade, por outro lado, é aquele que te dá a receita do melhor bolo de alfarroba e ainda se oferece para trazer os ingredientes. É generosa porque entende que partilhar não reduz, mas multiplica.
Mas o que acontece quando estas duas entram no campo do turismo algarvio? A inveja adora observar os turistas a passear nas ruas calcetadas de Tavira, de máquina fotográfica em punho e chinelos desconfortáveis, e murmurar: “Mais um bando de estrangeiros que só vêm cá gastar tostões.” A caridade? Essa já está a guiar os mesmos turistas até à melhor tasca, garantindo que provam o xerém como deve ser. A inveja queixa-se da casa de luxo construída no cimo da falésia; a caridade sonha que um dia, quem sabe, a casa possa servir para um retiro comunitário de yoga. A diferença é subtil, mas transforma a paisagem.
E no amor, como é que se manifesta este duelo? A inveja é aquela pessoa que, ao ver um casal feliz na praia de Monte Gordo, pensa: “Ela só está com ele por causa do carro.” A caridade, ao contrário, vê o mesmo casal e suspira: “Que bonito. O amor vence tudo, até o estacionamento pago em época alta.” A inveja tem o hábito irritante de desconfiar da felicidade dos outros, enquanto a caridade vive para aplaudi-la.
No entanto, há algo de irónico na relação entre estas duas. Porque a verdade é que a caridade muitas vezes nasce da inveja. Quem nunca quis ajudar só para provar que também tem algo a dar? E quem nunca sentiu um leve toque de inveja ao ver alguém ser generoso de forma tão natural? É como se a inveja fosse o combustível que, com sorte, pode transformar-se na chama da caridade.
E é aqui que entra a parte interessante: ambas têm um papel. A inveja, por mais feia que seja, faz-nos olhar para o que não temos. E a caridade? Ensina-nos a partilhar o que temos. Se conseguirmos encontrar o equilíbrio — talvez um pouco de inveja para nos motivar e um pouco de caridade para nos redimir —, temos o segredo da humanidade. Ou, pelo menos, da humanidade algarvia.
Por isso, descobre e depois conta-me tudo. Diz-me como a inveja te fez querer mais e como a caridade te ensinou que já tinhas o suficiente. E enquanto isso, vamos ali ao mercado comer umas ostras e brindar ao facto de estarmos vivos. Inveja ou caridade, que interessa? Desde que seja com sal e limão, está tudo bem.
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