Está o Algarve salpicado de sítios arqueológicos, assentamentos que encerram em si e na sua relação com o território um notável potencial de conhecimento acerca da trajetória temporal da região, na sua diversidade e pluralidade.
Em alguns desses sítios têm vindo a realizar-se trabalhos arqueológicos, em campanhas de terreno de curta duração (um a dois meses, sobretudo no verão) mas desenvolvidas em anos sucessivos. E em que aos trabalhos de terreno correspondem ulteriores afazeres de gabinete e laboratório, de aí resultando conhecimento, depois disseminado em publicações e congressos e divulgado em exposições, em museus ou na imprensa mais generalista.
Diferentemente das intervenções preventivas – que resultam da imposição legal (Lei 107/2001, artigo 75.º) de reservas arqueológicas de proteção com caráter temporário, tendo em vista determinar o interesse dos vestígios e promover o seu resgate ou conservação pelo registo científico – estes são projetos que se distinguem pela extensão temporal, pela abordagem de temas específicos, pela inovação metodológica, pela capacitação de futuros profissionais e pelo contributo para a requalificação patrimonial. Convergindo nas atribuições prosseguidas pela Direção Regional de Cultura (DL 114/2012, n.º 2 do artigo 2.º), ao corporizarem eixos temáticos de investigação que o Plano Regional de Intervenções Prioritárias em matéria de estudo e salvaguarda do património busca contemplar no domínio da arqueologia, alinhando-o com a Estratégia Regional de Investigação e Inovação para a Especialização Inteligente (RIS3), reforçando a investigação, o desenvolvimento tecnológico e a inovação no âmbito das ciências e técnicas do património.
Estão atualmente vigentes na região alguns desses projetos, que cobrem realidades cronológicas e culturais distintas: em Vale Boi (Vila do Bispo), investigadores da Universidade do Algarve (UAlg) estudam a sequência das ocupações do lugar em época paleolítica; no complexo endocársico do barrocal e da orla costeira, investigadores da UAlg e da Direção Regional de Cultura efetuam um sistemático levantamento das cavernas algarvias, na pista dos últimos homens de Neanderthal em solo europeu; em Monte Molião (Lagos), uma equipa da Universidade de Lisboa estuda as transformações e mudanças nas ocupações da antiga Lacobriga entre os tempos pré-romanos, a República Romana e os inícios da idade imperial; na Boca do Rio, investigadores da UAlg e da alemã Universidade de Marburgo analisam um assentamento pesqueiro onde, em época imperial romana, se produziram preparados de peixe; em Cacela Velha (Vila Real de Santo António), investigadores da UAlg e da Direção Regional de Cultura pesquisam as ruínas da antiga Qastalla no rasto das mulheres e homens que ali viveram entre os tempos de domínio do Islão e a nova emergência do poder cristão.
Para além da produção de conhecimento novo sobre os lugares, os territórios e as sociedades, estes projetos incorporam investigação aplicada à requalificação dos bens culturais em que diretamente incidem e integram uma importantíssima vertente de capacitação de futuros profissionais, fornecendo formação prática no terreno a inúmeros estudantes de arqueologia e de outras ciências e técnicas do património.
São projetos financiados pelo erário público que congregam o esforço de muitos especialistas a quem o Algarve fica reconhecido e que se juntam àquela galeria de mulheres e homens que, desde Estácio da Veiga, têm contribuído, a partir dos mais pequenos indícios, para construir uma conjetura a que chamamos História do Algarve.
(Artigo publicado no Caderno Cultura.Sul de Agosto)