A orla litoral do Algarve constitui o seu activo mais precioso, assumindo-se como um dos pólos de atracção da maioria dos fluxos turísticos que demandam a região, sendo incompreensível que o Estado português não defina como um imperativo nacional a defesa intransigente da actual linha de costa e o reforço da dimensão das suas praias, como o fazem atualmente muitos dos países mais desenvolvidos do mundo.
E isto porque o Ordenamento da Orla Costeira resulta, em primeira análise, de um universo alargado de possibilidades técnicas e científicas, cuja decisão é puramente política.
Os chamados POOC’s – Planos de Ordenamento da Orla Costeira, carecem de uma revisão urgente, face às incongruências, erros de apreciação, etc. que estiveram na sua origem, assim como a necessidade em atender às exigências decorrentes de novas realidades, incluindo as alterações climáticas.
Ordenar bem pressupõe, desde logo, ter no horizonte uma função de utilidade social, económica e cultural. É por esses motivos que todos os planos de ordenamento devem considerar as propostas da sociedade civil, formalizadas através das suas estruturas representativas, caso contrário, os diferentes debates, reuniões de trabalho, sessões públicas, etc., não passarão de mais um ritual sem qualquer conteúdo, ou seja, uma mera formalidade para perder tempo e energia.
Condenou-se a um subdesenvolvimento duradouro mais de dois terços do território do Algarve
Ordenar significa, também, definir um conjunto de acções e critérios de compatibilização entre o desenvolvimento económico e social, bem como a salvaguarda dos valores ambientais e do ordenamento do território.
Por outro lado, Planear e Ordenar não implica a adopção de uma via incomparavelmente mais dura que a anteriormente seguida em instrumentos anteriores, consubstanciada numa visão ainda mais restritiva e proibicionista na utilização e ocupação do solo, como normalmente acontece nestes casos.
Planear e Ordenar não significa, igualmente, ser um obstáculo ao desenvolvimento económico, social e turístico nas áreas de intervenção, mas integrar políticas de incentivo ao investimento e, por essa via, de melhoria da qualidade de vida das populações.
E isto porque, com base numa pretensa necessidade de absorção da erosão marítima, os actuais Planos da Orla Costeira prevêem duas faixas de protecção, (uma non aedificandi e outra de construção ligeira de área igual), abrangendo 140 metros na totalidade.
Apesar de serem contestáveis os métodos de cálculo e os valores da erosão previstos, os Planos excedem em certos domínios as suas atribuições, já que transformam áreas urbanizadas e/ou com utilização, quer económica, com especial destaque para as actividades relacionadas com a pesca artesanal, quer com finalidade turística, em Áreas Complementares de Conservação da Natureza.
A mera existência de faixas de protecção, como é o caso das descritas nos Planos, não garante, ainda que restrinja ou proíba a edificação e o desenvolvimento de actividades económicas, o suster da erosão das arribas, nem protege ecossistemas ou habitats adjacentes àquelas.
Os POOC’s são, pois, substantiva e geograficamente incoerentes nos meios propostos para a protecção da orla costeira porquanto, apesar da regulamentação prever as chamadas intervenções “não estáticas” ou “soft”, (consensualmente aconselhadas pelos melhores especialistas científicos e técnicos e utilizadas por países mais desenvolvidos ou com problemas de erosão), estas não são adoptadas em todos os troços da costa, sendo substituídas por faixas de absorção de erosão, o que revela uma contradição aleatória e, por isso mesmo, criticável.
Tal como aconteceu com o PROTAL, na década de noventa, em que se condenou a um subdesenvolvimento duradouro mais de dois terços do território do Algarve, e cujos resultados negativos estão à vista de todos, os POOC’s têm representado um lamentável retrocesso para o desenvolvimento sustentado da região no seu todo, devendo ser objecto de uma avaliação rigorosa independente, tendo em vista a sua revisão urgente. A revisão prevista para 2015 continua, comodamente, na gaveta do esquecimento dos nossos responsáveis.
As recomendações da União Europeia sobre esta matéria constituem, aliás, bons exemplos a seguir, sobretudo no que se refere à necessidade de se manter uma gestão integrada e equilibrada das zonas de costa, onde possam coexistir a preservação da natureza e funções económicas, como as pescas, os transportes marítimos e o turismo, tudo aquilo que, infelizmente, os actuais Planos não contemplam.
*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia
Leia também: Animação turística: A estratégia seguida é de navegação à vista | Por Elidérico Viegas