Osamu Dazai (1909-1948), pseudónimo de Tsushima Shuji, nasceu em Kanagi, estudou Literatura Francesa na Universidade de Tóquio e é um dos grandes autores japoneses do século XX. Foi confrontado desde cedo com problemas familiares, e depois com desaires nas vidas amorosa e financeira. De saúde frágil e com grande propensão para o consumo de álcool e morfina, Dazai encontrou na escrita um refúgio.
Deixou-nos alguns dos mais importantes textos da literatura japonesa do século passado; muitos dos seus livros, como Shayo, são considerados clássicos modernos. Tal como o protagonista deste romance, e como muitos outros autores japoneses, Osamu Dazai suicidou-se, aos 39 anos, mergulhando no rio Tama, em Tóquio, com Tomie Yamazaki, a sua companheira dos últimos dias de vida.
As Flores do Riso, de Osamu Dazai
Depois de ter estado no Japão no ano passado, continuo na minha senda de autores japoneses.
As Flores do Riso, de Osamu Dazai, com tradução do inglês de Manuel Alberto Vieira, forma um díptico com o Um Homem em Declínio, ambos publicados pela Presença.
Num sanatório junto ao mar, com uma estupenda vista para o oceano, Yozo Oba convalesce, depois de uma intrigante (e nunca completamente explicada) tentativa de suicídio falhada: ele e outra mulher atiraram-se ao mar.
Ao longo dos 4 dias da sua recuperação, é constantemente acompanhado por um grupo de amigos, três jovens de cerca de vinte anos que estão permanentemente na galhofa, e criam a hilaridade inclusive junto dos outros pacientes e familiares. No quarto do doente jogam às cartas, fumam, contam piadas, procuram constante atenção e provocam o riso. Será isto resultado de uma constante ânsia de emoções fortes ou será a pândega a consequência de encarar a vida como uma farsa?
Nas primeiras páginas, que poderiam servir de prefácio, o autor afirma mais ou menos indiretamente que esta é uma história sobre si – embora neste breve romance tome como protagonista um «ele» -, justamente por ter escrito na passada primavera um romance na primeira pessoa e não se atrever a fazê-lo agora de novo. Contudo, são constantes os seus apartes ao longo do romance e é isso que lhe confere renovado valor – e uma modernidade ao gosto ocidental.
As Flores do Riso recupera temas de Um Homem em Declínio, agora com laivos de humor, ligeireza e ironia, mediante este grupo de jovens incomum, no Japão do pré-guerra, que encontram virtude no escândalo e encontram na farsa uma fuga ao desespero.
Um Homem em Declínio, de Osamu Dazai
Um Homem em Declínio, de Osamu Dazai, com tradução do inglês de Manuel Alberto Vieira, é o reverso do díptico formado com As Flores do Riso, ambos publicados pela Presença. Um Homem em Declínio, prequela de As Flores do Riso (em Portugal foi também publicado primeiro), éo romance mais traduzido do autor, já apontado como o “adorado bad boy da literatura japonesa”.
«A minha vida foi marcada pela vergonha. Não consigo sequer imaginar como será viver a vida de um ser humano.»
Yozo (o mesmo que encontraremos em As Flores do Riso) vê-se como um verdadeiro fracasso. A sua vida – aqui narrada na primeira pessoa – pode parecer normal, ele pode até divertir toda a gente por meio das suas constantes palhaçadas, mas a verdade é que ele coloca uma máscara de modo a camuflar a sua alienação, a sua gritante incapacidade de viver segundo as regras e convenções comezinhas da sociedade, uma acutilante sensação de inadaptação, de falta de empatia ou mesmo de ser capaz de perceber os outros seres humanos.
A farsa acaba por se desvelar quando, já na universidade, comete, com outra mulher, uma gorada tentativa de suicídio (também como acontecerá na sequela deste romance).
Um retrato brutal e íntimo da alienação e apatia, que não deixa espaço ao sentimentalismo ou ao drama.
Com claros traços autobiográficos, Um Homem em Declínio é considerado como o derradeiro e mais importante romance de um dos grandes escritores japoneses do século XX. Escreveu-se que se trata de um símbolo de uma geração, aquela que deixava a guerra para trás e vislumbrava os alvores de uma sociedade pós-moderna.
As obras de Osamu Dazai são reconhecidas por abordarem temas como a natureza humana, as doenças mentais, as relações sociais e o Japão pós-guerra.
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