A instabilidade económica e financeira dos últimos tempos, teve o condão de nos despertar para o perigo resultante de uma mais que provável recessão económica sem precedentes à escala universal, cujas consequências não são fáceis de avaliar.
Para uns, o facto resulta da falta de líderes, gestores e políticos com qualidade. Para outros, o capitalismo selvagem, deixado à solta e sem regulação, fizeram o resto. Em boa verdade, ao que parece, ninguém conhece a verdadeira dimensão do problema e, muito menos, os impactos nas economias mundiais, atendendo à sua globalização e interdependência. Pior, ninguém tem ou conhece as soluções. Assim sendo, não surpreende que o Mundo esteja à beira de um ataque de nervos.
O capital nunca corre riscos e jamais mexerá uma palha para ajudar seja quem for, nem que para isso seja preciso matar e morrer
Os mais pessimistas – porventura realistas – quem sabe! consideram que a situação actual pode provocar uma depressão, aumentando ainda mais os riscos para a economia real. As contradições das sucessivas afirmações dos principais responsáveis mundiais constituem preocupações acrescidas para todos aqueles que, não sendo especialistas, estão condenados a pagar com língua de palmo, de uma forma ou de outra, os erros e as incompetências de elites catapultadas para a ribalta da cena económica e financeira internacional, muitas vezes por razões meramente circunstanciais.
Num ápice, heresia das heresias, nacionalizam-se bancos, fundos de investimento e seguradoras, injecta-se no sistema financeiro dinheiro a rodos, fabricado à pressa em rotativas e máquinas de “offset”, não para ajudar a economia, mas para aumentar os despedimentos, aumentar as taxas de juro, reduzir o crédito à economia (empresas) e lavar os chamados activos tóxicos do capitalismo.
Ou seja, nacionalizam-se os prejuízos de um capitalismo privatizado ao sabor e em função dos interesses instalados, construído à medida de uma mão cheia de inúteis habilidosos, pagos principescamente, cognominados de gurus e génios financeiros.
Perante tamanha afronta, Milton Freedman, Prémio Nobel da Economia, terá suplicado aos céus a intervenção divina, visando repor o bom senso nas hostes políticas dirigentes.
À solta, descontrolado, desenfreado e sem rédea, destravado e mais voraz do que nunca, o capital aparece agora, via democrática e, portanto, mais legitimado do que nunca, disfarçado e rejuvenescido como Capital do Estado e, por conseguinte, mais perigoso e preparado para causar distúrbios e arrasar economias à custa de ingénuos inocentes e desconhecedores. Ou seja, muitos a engordar poucos. Leia-se, a economia a produzir para quem não trabalha.
O capital nunca corre riscos e jamais mexerá uma palha para ajudar seja quem for, nem que para isso seja preciso matar e morrer, qual escorpião à boleia nas costas da rã quando esta atravessa o rio. É a natureza do chamado mercado livre no melhor da sua plenitude.
Na Europa, o apoio dos governos aos bancos privados em dificuldades está a servir para transferir, antes que seja tarde demais, depósitos para os que ainda respiram e apresentam sinais de saúde. Será esta uma crise do capitalismo, ou uma regeneração interna para o tornar ainda mais poderoso, fundamentalista, dominador e arrasador do que nunca?
Porém, quer queiramos quer não, esta onda de intervencionismo estatal (quem se atreve a criticar?) não deixa de constituir uma séria ameaça ao sistema de mercado livre e, para muitos, representa o primeiro grande passo rumo ao socialismo financeiro e, por essa via, à socialização da sociedade. Marx, apesar de morto, à cautela, pôs as barbas de molho não vá o diabo tecê-las.
A verdade pode ser sufocada, mas não para sempre. Estas e outras constatações/apreciações podem parecer alarmistas e desajustadas no tempo, diria até, politicamente incorrectas. De facto, para além de inconformistas e rebeldes não deixam de revelar liberdade de expressão e pensamento, mas também espírito crítico e mesmo censura. Discorde quem quiser. Persistir em vender ilusões, significa agravar ainda mais os problemas. Faltar à verdade na actual conjuntura só serve para aumentar a desconfiança nas instituições políticas e nos agentes financeiros e económicos.
A Guerra, ou melhor, as guerras, as pandemias cada vez mais agressivas, incontroláveis e incuráveis, institucionalizaram-se. O capital, igual a si próprio, agradece a onda favorável e expande-se à velocidade do vento, qual furacão sem rumo nem controlo.
*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia
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