Filosofias de não violência foram na História contraponto aos poderes imperiais. Os impérios definem-se pelo poder centralizado e militarizado, territórios periféricos colonizados, imposição de valores, línguas, costumes, evangelizações religiosas…
Os “padres do deserto” do século III d.C., ascetas como Ireneu, Epifânio, Santo Antão e outros, consideravam que religião e poder misturados não produziam a sociedade cristã desejada. Estudaram os relatos bíblicos apócrifos e extra-bíblicos, o monaquismo medieval foi prolongamento do cristianismo primitivo controlado pela instituição imperial.
Segundo demógrafos da Antiguidade, no final do Neolítico a China e a Índia possuíam dois terços da humanidade, estimada em 200 milhões de pessoas, as migrações indo-europeias originaram “impérios híbridos”, indo-gregos, assírios, persas, mongóis, os filólogos têm comprovado nas línguas actuais registos desses itinerários migratórios.

Sociólogo
A geografia dos conflitos actuais coincide com os da antiguidade, as “guerras eternas”. Sionismo, radicalismos islâmicos e cristãos, são heranças da História com muitos séculos
A demografia e concentração de populações sedentárias esteve na origem de migrações e conquistas. Reservas alimentares agrícolas e comércio litoral transformaram o Mediterrâneo numa “máquina de civilizações”, urbanismo e mobilidades potenciaram transmissões epidémicas de rubéola, varíola, a tuberculose óssea quase dizimou a Fenícia, a peste negra no séc. XIV matou entre 40 e 60% da população europeia.
A ideia naturalista foi génese dos politeísmos. O panteão de deuses gregos era uma comunidade sobrenatural hierarquizada, regulada pelo cosmos, o tempo, as forças e ciclos da natureza. Deuses pouco confiáveis como os humanos, idênticos nas qualidades e defeitos, aventureiros, viajantes, sexualizados, promíscuos, mentirosos, violentos,…
Decorrente das necessidades comerciais impunha-se a regulação dos comportamentos, os monoteísmos representaram uma das respostas para novas relações sociais e permutas comerciais. Eram necessárias línguas de mercado, alfabetos utilitários, aritméticas para cálculos de transações, pesos e medidas, acordos de acesso,…
No seio de tribos nómadas da diáspora hebraica, de mercadores do Medio Oriente e habitantes de cidades e rotas mercantis da Arábia surgiu o Deus Único revelado.
Javé era o Deus exclusivo dos hebreus, povo eleito, impulsionou dois outros monoteísmos. O cristianismo personificado em Jesus e na Santíssima Trindade provocou uma revolução social e a fractura teológica com Bizâncio, o desenvolvimento do cristianismo ortodoxo.
Em 321 d.C. realizou-se o concilio Niceia decidido por Constantino, debateu a cristologia, definiu a Trindade, o credo, calendário e Páscoa, leis canónicas, excluiu as heresias,…
Seis séculos mais tarde na Arábia surge a revelação de Alá, uma nova religião anunciada por Maomé aos excluídos, os monges-cavaleiros expandiram o Islão à Berberia, à Ásia e a sul. O Islão preencheu o espaço do Império de Alexandre Magno, integrou populações tribais do Egipto, Iraque, Pérsia e Arabia. O Magrebe abandonado pelos romanos nos séculos IV e V d. C, enfraquecido, a sedentarização e a tributação diminuíram, consideradas por Ibn Kaldhun, o grande historiador árabe do século XIV, como instrumentos privilegiados do poder das cidades, centros políticos, religiosos e militares.
A matriz comum das três principais religiões monoteístas foram o Deus Único, o Profeta e o Livro Sagrado. Entre outras características, afirmaram a sua diferenciação e competição, o que acontecia com os politeísmos e as devoções locais às Virgens – Mãe milagreiras.
Judaísmo com natureza étnica, os outros monoteísmos expansionistas e evangelizadores.
O cristianismo atravessou períodos transformadores, lutou contra o esclavagismo e a injustiça social, renegou a lei judaica, representava a vocação universalista da cidadania Romana. Fundamental o estudo dos três séculos de cristianismo pré-Niceia, até Constantino o decretar religião oficial do Estado Romano, alterando a matriz fundadora.
Os bárbaros godos, visigodos e ostrogodos, que viviam da guerra e do saque entre o Mar Negro e a Ucrânia, atravessaram em 376 d. C o Danúbio perseguidos pelos hunos, saquearam Roma em 410 d. C. Ambicionavam ser romanos, cristianizaram-se, não foi uma invasão, mas guerra civil, viviam dentro do Império e Alarico era um alto cargo. Os bárbaros tornaram-se imperadores, os de Roma fugiram para Milão e depois em Ravena.
Foram estes os pilares do poder feudal, da expropriação dos camponeses transformados em servos da gleba nasceu um cristianismo proprietário, de cruzadas contra os infiéis.
Para diversos sociólogos, a humanidade vive entre o desejo de paz e o receio de conflitos e guerras. A. Giddens escreveu “mesmo os sistemas sociais mais estáveis representam um equilíbrio instável entre grupos antagónicos”. Para a sociologia, o conflito é uma construção social, necessidade dos poderes e apropriações, diferenciado da violência, podem existir conflitos sem violência, mas não o inverso, pode ser conduzido e superado.
A geografia dos conflitos actuais coincide com os da antiguidade, as “guerras eternas”. Sionismo, radicalismos islâmicos e cristãos, são heranças da História com muitos séculos.
A ONU (1945), a Carta Universal dos Direitos Humanos (1948), as acções de Gandhi, Mandela, Dalai Lama e outras personalidades, resultam das consequências de guerras mundiais e colonizações, o pacifismo filosófico-político e religioso procura conter e regular conflitos, combatido como sempre pela cultura de blocos geoestratégicos e rearmamento.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia
Leia também: Longa duração, os Annales e a contemporaneidade