A partir da década de 90 do século XIX e princípios do XX, João António Júdice Fialho (1859-1934) vai concentrar os seus esforços e investimentos na indústria conserveira, construindo e montando fábricas em diversos locais do País: Portimão (S. José a 5-7-1892 e S. Francisco a 15-5-1904), Lagoa (Ferragudo a 31-3-1904), Lagos (a 26-11-1904), Funchal (em 1909), Olhão (a 20-3-1913), Peniche (em 1916), Sines (em 1919) e após a sua morte em Matosinhos (1959/1960), empregando cerca de 4000 trabalhadores nos anos 30 do século XX1. Paralelamente investe na indústria da pesca, nomeadamente na da sardinha (1893) e do atum (1896). Dedicou-se ainda durante algum tempo, à actividade e indústria da pesca do bacalhau nos anos 20 do século XX.
João António Júdice Fialho, tornar-se-á em pouco tempo no maior industrial algarvio, nacional e ibérico da indústria conserveira nos finais do século XIX e nas três primeiras décadas do século XX, conforme o Diário de Notícias de 24-6-1931 «o mais importante industrial de conservas de Portugal, da Península mesmo».2 O seu nome encontra-se perpetuado na toponímia de Faro (rua Júdice Fialho), Portimão (rua Júdice Fialho), Sines (rua e largo Júdice Fialho), tendo ainda um bairro, rua e travessa do Fialho em Peniche.
Segundo o jornal O Algarve de 25-3-1934, os estabelecimentos do “Fialho” estavam equipados com «tudo o que modernamente em maquinismos e instalações as indústrias modernas têm inventado para reduzir o trabalho manual». Nas suas unidades fabris, produziam-se conservas de sardinha (sardinha em azeite (com pele e com espinha, sem espinha, sem pele e sem espinha), sardinha em molho de tomate (com pele e com espinha), sardinha em salmoura (estivada em barris) e ovas de sardinha); cavala (filetes de cavala em azeite, cavalinhas e bocados de cavalas); biqueirão (em azeite, filetes de biqueirão em azeite (direitos e enrolados com alcaparras) e pasta de anchovas em latas e bisnagas, utilizando os desperdícios do biqueirão não aproveitados para filetagem; atum (atum em óleo); e ainda dois subprodutos: azeite de peixe, destinado essencialmente à exportação e guano (resíduos de peixe), utilizado na adubação de culturas. As conservas «preparadas com uma meticulosidade única» e «com honorabilidade sistemática sempre igual», uma aposta ganha junto dos mercados estrangeiros, com garantia de lucro, mesmo quando os outros não conseguiam vender.3
Durante o Estado Novo (1934- 1974), o complexo industrial Júdice Fialho constituir-se-á como o mais importante do sector conserveiro nacional, graças ao condicionamento industrial, adoptando várias designações ao longo da sua existência: João António Júdice Fialho em nome individual (de 1892 a 1934); J.A. Júdice Fialho Viúva e Herdeiros (1934-1938); Júdice Fialho & Companhia L.da (de 5-7-1938 a 8-8-1969), com sede na rua Infante D. Henrique n.º 24 em Faro e capital social de 4.000.000$00, tendo como sócios a viúva, filhas e netos, ficando a administração a cargo do genro do empresário; e Júdice Fialho – Conservas e Peixe S.A.R.L. (de 8-8-1969 a 23-3-1981), com sede na rua da Fábrica em Portimão e capital social de 79.000.000$00.4
Após a sua morte ocorrida em 1934, foi mantida a estrutura e filosofia empresarial, não sendo vendida nenhuma unidade fabril, desaparecendo por expropriação a fábrica de Olhão em 10-11-1951 e aparecendo uma nova em Matosinhos, em substituição da de Lagos por despacho ministerial de 28-11-1959. Contudo a partir de 1939, a empresa embora mantenha o seu foco na expansão e modernização da indústria conserveira, investe fortemente parte dos lucros no sector imobiliário.
Segundo o decreto-lei n.º 7989 de 25-1-1918, os industriais, seriam obrigados a fazer o pedido de registo da sua instalação fabril, à circunscrição industrial onde esta estava localizada e teriam de fornecer um conjunto de informações, como seja: quando começara a fábrica a trabalhar; a sua localização; e o número de funcionários, operários e das máquinas, para assim contribuírem, para o conhecimento e esclarecimento da descrição desta indústria. De seguida, haveria uma vistoria efectuada pelos serviços da circunscrição, após o que se estivesse tudo conforme e legal, seria publicado um edital num jornal local, dando um prazo de 30 dias para quem quisesse consultar e verificar o processo, e entendesse apresentar alguma contestação ou reclamação. Findo este processo, era passado um alvará por tempo indeterminado, segundo o estabelecido no decreto n.º 8364 de 25-8-1922, que estabelecia todas as normas de salubridade, segurança, higiene e de poluição relacionadas com as fábricas.5
Desde meados dos anos 30 a meados dos anos 60 do século XX, deu-se início à renovação e modernização dos equipamentos das fábricas Júdice Fialho, como seja: através da instalação de 1 máquina de azeitar (1934- 1935) – S. José (14-12-1934), S. Francisco, Ferragudo, Lagos e Olhão (15-3-1935), Peniche e Sines (17-5-1935); a instalação de 1 cozedor simples igual ao aí existente e 1 cravadeira Sudry B.C. 15 (1939) – S. José, S. Francisco, Ferragudo, Olhão, Peniche e Sines (8-5-1939); a instalação de 2 filtros para azeite, com as respectivas bombas (1940) – S. José, S. Francisco e Ferragudo (1-4-1940); a instalar 2 autoclaves de esterilização (a 4-6-1941) – S. José, S. Francisco, Ferragudo e Peniche; a instalar 2 cofres para cozer peixe (1950) – S. José (27-5-1950), S. Francisco (27-6- 1950) e Peniche (27-6-1950); a instalação de 1 cozedor-secador a ar quente com 3m40 x 1m85 x 1m86 nas suas instalações (1955-1958) – Peniche (6-9-1955), Ferragudo (12-6-1956), S. Francisco e Sines (20-6-1956), S. José (12-2-1958); e a instalação de 1 cravadeira automática Vulcano tipo V3 CAU 50 (1963-1965) – Sines (7-10-1963), Ferragudo (20-2-1964), S. José (21-2-1964), S. Francisco (11-12-1965), Peniche (15-12-1965), etc.
1 cf. A realidade Júdice Fialho: O passado e o presente, (s/d): Comissão Sindical de Júdice Fialho [D.L. 1978] (Lisboa: Tip. Silvas), p. 3.
2 cf. Diário de Lisboa de 24-6-1931; Jorge Miguel Robalo Duarte Serra, – O Nascimento de um império conserveiro: “A Casa Fialho” (1892-1939) [Texto Policopiado], tese de Mestrado em História Contemporânea pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade do Porto, 2007, pp. 67-68, Boletim de Pesca n.º 10, Lisboa, Março de 1946, p. 46; e Edmundo Correia Lopes – «A indústria de conservas de peixe» in Indústria Portuguesa n.º 224, Outubro de 1946, p. 718 e Maria João Raminhos Duarte – Portimão: industriais conserveiros na 1ª metade do século XX, 1ª edição, Lisboa: Colibri, 2003, pp. 22 e 36.
3 cf. O Algarve de 25-3-1934 e Ana Rita Silva de Serra Faria, op. cit., pp. 48, 58-59.
4 cf. A constituição da firma Júdice Fialho e C.ª com sede na rua Infante D. Henrique n.º 24 em Faro, realizou-se por escritura pública lavrada nas notas do notário Dr. Eugénio de Carvalho e Silva, da comarca de Lisboa, Livro 129 B, fls. 31 v.º e seguintes a 5-7-1938. A 8-8-1969, por escritura pública lavrada no Cartório Notarial de Lisboa, Livro 65, fls. 25 v.º a 52, a firma Júdice Fialho e C.ª com sede na rua Infante D. Henrique n.º 24 em Faro, transforma-se em sociedade anónima com a designação Júdice Fialho – Conservas de Peixe SARL, com sede em Portimão, in Ministério do Mar, Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM), Arquivo do Instituto de Conservas de Peixe (1936-1986), Júdice Fialho, Conservas de Peixe, SARL, Portimão (S. José). Fab. 4.701.109, 1934, Portimão (S. Francisco). Fab. 4.701.108, 1934 e Cartório Notarial de Lisboa, Livro 65, fls. 25 v.º a 52.
5 cf. Decreto-lei n.º 7989 de 25-1-1918 e Jorge Miguel Robalo Duarte Serra, op. cit., pp. 54-55.
A Esteve sujeita a intervenção estatal por despacho ministerial dos Ministérios das Finanças e da Agricultura e Pescas de 14-11-1975 até à resolução n.º 80/81 de 21-4-1981, com efeitos a 1-2-1981 e vendida a um grupo de personalidades – Adolfo Jorge Pinheiro de Castro e Brito, Jorge Manuel Barbosa da Cunha e José Óscar Barroso Magalhães a 23- 3-1981, ficando esta operação efectiva a 1-4-1981. Esta fábrica foi adquirida em 1993 por Arnaldo da Conceição Correia, laborando até 1997, encerrando então definitivamente.
B Esteve sujeita a intervenção estatal entre 14- 11-1975 e 1-2-1981; em 23-5-1983, o Instituto Português de Conservas de Peixe, informa que a fábrica de S. Francisco em Portimão, foi desmontada e demolida, sendo cancelada a sua inscrição a 23-6-1983.
C Deixa de laborar por despacho ministerial de 28-11-1959, sendo o seu alvará transferido para a fábrica de conservas de peixe em molhos de Matosinhos.
D Esteve sujeita a intervenção estatal entre 14- 11-1975 e 1-2-1981; a 15-4-1981, já com a nova administração, foi esta fábrica encerrada temporariamente por motivos de ordem económica, sendo desmontada por informação do Instituto Português de Conservas de Peixe – Delegação de Portimão e Lagos a 20-5-1983.
E Por venda à firma Tomaso Moro & Filgli, com sede em Génova em 1930.
F Foi expropriada para obras de alargamento do porto de pesca de Olhão, por despacho do Subsecretário de Estado do Comércio e Indústria a 10-11-1951, recebendo a indemnização de 701.712$00 escudos.
G Esteve sujeita a intervenção estatal entre 14-11- 1975 e 1-2-1981; foi comprada conjuntamente com a fábrica de Matosinhos pelo grupo americano H. J. Heinz Company em 31-3-1988. Em Março de 2006, a fábrica de Peniche, foi adquirida pela MWBrands (MWB), adoptando a designação de ESIP – European Seafood Investiments Portugal Lda. Em -11-2010, é comprada pela empresa tailandesa Thai Union Frozen Products (maior produtor mundial de conservas de pescado), mantendo-se ainda em actividade.
H Esteve sujeita a intervenção estatal entre 14-11- 1975 e 1-2-1981; esta empresa foi adquirida pela empresa J. Silva Lobo a 11-4-1996, que encerrou a sua laboração a 11-8-1996.
I Esteve sujeita a intervenção estatal entre 14-11- 1975 e 1-2-1981; foi comprada conjuntamente com a fábrica de Peniche pela H. J. Heinz Company em 31-3-1988, sendo desactivada e encerrada em 1992.
J Esteve sujeita a intervenção estatal entre 14-11- 1975 e 1-2-1981.
(Texto de Luís Menezes – Investigador e Documentalista)