No mundo em que vivemos parece que existe um esforço considerável para não se falar e esconder os aspetos relativos à sensualidade e/ou sexo na cultura em geral. No cinema por exemplo está a acontecer um retrocesso, um atrito, existe pudor em mostrar esse lado da Humanidade, é desconfortável, provoca inveja e raiva nos olhares alheios ou simplesmente os grandes estúdios que são geridos hoje em dia por magnatas do dinheiro deixaram de se importar com a condição humana e preferem apresentar “conteúdo” que abrange o maior número de pessoas e fere o menor número de suscetibilidades.
Existe uma pressão para que a ideologia seja normalizada em todas as vertentes e para que o lucro seja fácil, o que está a provocar precisamente uma divisão clara no público, porque simplesmente a vida real é bem mais dura, eclética e diversificada e deve-se poder explorar todas as vertentes da condição humana e deve-se dar aos artistas a possibilidade de analisar mais profundamente os temas que afligem a sociedade, por mais desconfortáveis que sejam.
O termo “boudoir” vem da França da época Vitoriana (1837-1901) em que literalmente não era considerado um estilo (apenas mais tarde), mas uma divisão da casa, das grandes casas luxuosas da altura. Essa explosão de arquitetura luxuosa e excessiva permitiu a criação de uma sala intimista para as mulheres. Era um compartimento da casa onde a mulher tomava o seu banho ou trocava de roupa ou relaxava em vestimentas menos formais dando a possibilidade de se ver mais do corpo da Mulher do que era permitido. Obviamente esse espaço intermédio viria a ser usado para explorar a sensualidade e o romantismo associado, pelos encontros de namorados, pelos casais e relações extraconjugais, mas também para um uso mais privado, para bordar e ler. Obviamente com a invenção e popularidade da fotografia, esse espaço privado viria a ser mostrado ao público, que nunca tinha hipótese de observar / partilhar tal erotismo arriscado. O fotógrafo francês Albert Arthur Allen entre 1890 e 1920 popularizou este estilo de fotografia, considerado obsceno, grosseiro, lascivo e ilegal na altura, que era admirado às escondidas. Mas o mais curioso é que a nudez não era muitas das vezes explícita, a composição era mais implícita e adornada com adereços e cenários bastante elaborados, vistosos e pomposos, um excesso que foi perdendo a popularidade até aos dias de hoje, em que os fotógrafos preferem mostrar um aspeto mais intimista e minimalista, apesar de continuar a haver também o lado mais excessivo, mas a fotografia boudoir em si é mais relacionada com o desprovimento de acessórios, curiosamente, focando-se apenas na Mulher em si e na sua relação com o seu corpo. Por vezes não é bem erotismo, não é bem glamour ou um nu muito escultural como os gregos faziam, é outra coisa. Nos anos 40 e 50 transformou-se um pouco na cultura Pin-Up e nos anos 70 passou a ser considerada “alta arte contemporânea”.
Mas hoje em dia é popularmente vista como uma celebração de intimidade, empoderamento e amor-próprio, é uma oportunidade para as mulheres sentirem-se mais confiantes, belas e confortáveis na sua própria pele. Geralmente vestidas com lingerie ou não, roupa transparente sugestiva ou em poses relaxadas, num ambiente silencioso, privado e numa atitude de reflexão, geralmente o quarto, é interessante que o boudoir continue a ser associado a um espaço físico fechado. Existe o nu de natureza, mas esse confere outros ideais e simbolismo. Em termos fotográficos é preferida a luz natural (difusa ou direta) mas o flash também é usado, por exemplo para criar ambientes “high-key” ou “low-key”. Como a fotografia hoje em dia já é uma coleção de muitos estilos, os fotógrafos começam a experimentar incluir “outros cenários” como por exemplo água, plantas ou acessórios mais glamourosos, mas na minha opinião continuo a associar o boudoir a um espaço físico do que propriamente um cenário falso construído para o efeito, apesar de obviamente não ter nada contra para quem explora outras visões. Hoje em dia é preciso ser-se diversificado. Em relação à idade ideal para o fazer, é um bocado como tirar a carta de condução, quanto mais cedo melhor, mas mais tarde também não faz mal.
Para realizar este estilo de sessão fotográfica é preciso ter alguma coragem e deve abordar o assunto com as pessoas mais próximas sobre a sua escolha se for o caso, mas geralmente deve estar consciente e aceitar essa escolha como pessoal e sua. A realização da sessão é geralmente feita apenas com a presença da modelo e do fotógrafo que estará lá sempre para falar com a modelo, explorar as ideias que tem, os acessórios e o local e obviamente trabalhar as poses mais favoráveis… não é preciso ser perfeita, tem a ver com a experiência e a possibilidade de poder recordar a celebração do seu corpo e da sua vida anos mais tarde. As fotografias depois de entregues, podem ser privadas para mais ninguém ver, mas também podem ser apreciadas pelo público numa galeria de arte física ou online, a escolha será sempre da modelo e pode mudar com o passar do tempo. Geralmente nestes casos, a fama é efémera e rapidamente passa ao esquecimento, o que interessa realmente são o passar dos anos, quando daqui a 30 anos vai saber bem poder apreciar o quanto bonita e jovem era na altura. A Alfa (Associação Livre Fotógrafos do Algarve), apresentará este ano um curso no seu estúdio fotográfico, direcionado para os fotógrafos que quiserem aprender um pouco como tudo se processa com uma modelo ao vivo, para isso, basta estarem atentos às datas no site oficial em www.alfa.pt.
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