A determinação da residência fiscal e da obrigação de pagar impostos é um tema recorrente, sobretudo quando envolve contribuintes que alegam viver no estrangeiro mas mantêm, na prática, a vida pessoal e económica no país de origem. A discussão ganha relevância quando estão em causa pensões, património e ligações familiares que ajudam a definir onde, legalmente, uma pessoa deve tributar os seus rendimentos. Este caso fala de um reformado que foi condenado a pagar uma dívida fiscal às Finanças por ter mudado de país enquanto tinha o seu património em Espanha.
Um reformado foi condenado a pagar mais de 104 mil euros à Agência Tributária espanhola depois de tentar declarar-se como não residente, apesar de manter o seu núcleo familiar e económico em Espanha.
O Tribunal Superior de Justiça da Catalunha confirmou a decisão do Tribunal Económico-Administrativo Regional, que aplicou os critérios previstos na lei para concluir que o seu “centro de interesses vitais” permanecia em território espanhol, contrariando o que prevê o artigo 9 da Lei do IRPF e o Acordo de Dupla Tributação com Andorra.
Ausência de declaração de rendimentos
Este caso teve início quando a delegação de Hacienda em Lleida detetou que o pensionista não tinha apresentado a declaração de rendimentos relativa a 2018, apesar de possuir rendimentos tributáveis, de acordo com o jornal digital espanhol Noticias Trabajo. O contribuinte alegou ter mudado para Andorra no final de 2017, onde inicialmente arrendou e depois comprou uma casa, tentando assim justificar a ausência de declaração em Espanha.
A investigação, porém, revelou que tinha habitação disponível nos dois países e que a estrutura da sua vida continuava ancorada em Espanha. O TEAR confirmou que devia pagar 60.864,23 euros em dívida fiscal, acrescidos de uma coima de 43.273,86 euros. O organismo sublinhou que o reformado não demonstrou ter, em Andorra, ligações familiares ou económicas mais relevantes do que as que mantinha em Espanha.
Peso do “centro de interesses vitais”
O caso avançou para o Tribunal Superior de Justiça, onde o contribuinte procurou anular a coima, argumentando que tinha interpretado a lei de forma razoável. Contudo, o tribunal deu razão ao fisco. Explicou que, quando um contribuinte dispõe de habitação permanente em dois países, é necessário recorrer ao critério do “centro de interesses vitais”, que corresponde ao local onde se concentram as relações pessoais, económicas e patrimoniais.
A sentença concluiu que em Espanha se encontravam os seus rendimentos mais relevantes, incluindo uma pensão superior a 34 mil euros anuais, resgates de planos de poupança no valor de quase 120 mil euros e a propriedade de quatro imóveis em Barcelona e Lleida. Paralelamente, a esposa, as filhas e o neto residiam em Espanha, e a própria esposa declarou lá o seu IRS nesse ano, de acordo com a mesma fonte.
Falta de prova de residência fiscal em Andorra
O tribunal sublinhou que o reformado não conseguiu demonstrar que efetivamente tributava em Andorra. Considerou ainda que a falta de tributação em qualquer jurisdição revelava comportamento negligente, sobretudo porque todos os elementos que determinavam a residência fiscal espanhola eram conhecidos pelo contribuinte.
Assim, manteve-se a decisão de que tinha de pagar tanto a dívida fiscal como a coima aplicada pela Hacienda, de acordo com o Noticias Trabajo.
E se acontecesse em Portugal?
Em Portugal, um caso idêntico seria analisado com base nos critérios da Autoridade Tributária para determinar residência fiscal, à luz do artigo 16.º do Código de IRS (CIRS). Tal como em Espanha, o fator decisivo seria o “centro de vida”, que inclui a presença habitual no país, a localização da família, o património imobiliário e a origem dos rendimentos.
Se um reformado alegasse viver no estrangeiro mas mantivesse família, bens e pensão pagos por entidades portuguesas, a AT consideraria que continua residente fiscal em Portugal, sendo obrigado a declarar e pagar IRS sobre todos os rendimentos mundiais. A falta de prova de residência efetiva noutro país levaria igualmente à cobrança retroativa de impostos e à aplicação de coimas por incumprimento.
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