Mais de 73% da população considera que o custo representa uma barreira à compra de vacinas que não integram o Plano Nacional de Vacinação (PNV), indica um estudo da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (Apifarma).
Os resultados do inquérito divulgado nesta quinta-feira referem que 71,1% dos portugueses afirma que estaria disponível para comprar vacinas extra PNV, caso sejam recomendadas pelo médico, mas 73,8% alega o seu custo como a “principal razão para a falta de disponibilidade” para essa aquisição.
Além disso, o preço é o primeiro motivo para que médicos e enfermeiros não recomendem a toma das vacinas que não integram o plano, seguindo-se outras razões, como não serem adequadas a todos os doentes e destinarem-se a doenças benignas que não justificam a sua toma.
O estudo “Perceção do Valor das Vacinas” inclui uma amostra de centenas de profissionais de saúde, como médicos de medicina geral e familiar, pediatria, medicina interna, pneumologia e ginecologia, enfermeiros e farmacêuticos, assim como uma amostra de 2076 pessoas com mais de 18 anos.
De acordo com os dados agora divulgados pela Apifarma, que representa os interesses da indústria farmacêutica em Portugal, mais de 95% dos pais de crianças e adolescentes com menos de 18 anos são da opinião que as vacinas com indicação pediátrica devem estar integradas no PNV.
“A recomendação de vacinas extra PNV faz parte da rotina dos pediatras, com taxas de aconselhamento superiores a 80%, especialmente vacinas contra a doença meningocócica, o rotavírus e a gripe”, seguindo-se os pneumologistas e os enfermeiros, com taxas de aconselhamento entre os 66% e 55%, refere o documento.
As vacinas contra a doença meningocócica, rotavírus, gripe, doença pneumocócica e hepatite A são as mais recomendadas por pediatras, mas os pneumologistas optam por vacinas do trato respiratório, herpes zoster e hepatite A+B, apurou ainda o inquérito.
Segundo o estudo, cujo trabalho de campo decorreu entre 2 de janeiro e 10 de março, o “sucesso do PNV é notório” na opinião de mais de 93% dos profissionais de saúde entrevistados, “comprovado ainda pela taxa de vacinação de 80% na população adulta e cerca de 95% na população pediátrica”.
Apesar disso, os profissionais de saúde consideram que ainda se pode melhorar o plano, com o alargamento de algumas vacinas já incluídas no PNV a outros grupos populacionais.
“Transversalmente, os profissionais de saúde referiram a importância de incluir em PNV as vacinas contra a doença pneumocócica para pessoas com mais de 65 anos, a vacina contra o Papiloma Vírus (HPV) para toda a população e a vacina contra a doença meningocócica para crianças de mais faixas etárias”, avança o estudo.
O inquérito apurou também que o nível de conhecimento sobre as vacinas que integram o PNV é elevado, especialmente entre os profissionais de saúde e, entre a população, as vacinas com maior notoriedade são a da gripe, da covid-19, do sarampo e do tétano.
“Mais de 80% da população sabe a razão de ser vacinada e cerca de 95% tem conhecimento que o PNV é gratuito, todavia, menos de 60% das pessoas sabem a quem se destina o PNV”, conclui o estudo.
Já as vacinas contra o tétano, doença meningocócica, sarampo, HPV, doença pneumocócica difteria, rubéola e tosse convulsa “são as que, de uma forma consensual dos vários profissionais de saúde, são decisivamente mais importantes no PNV”.
Para a população portuguesa, a internet (35%) é a principal fonte de informação para esclarecimentos sobre a vacinação, seguindo-se os médicos (30,7%), enquanto a Direção-Geral da Saúde (DGS) representa apenas 2,8%.
O PNV foi implementado em 1965 e desde o início mantém os princípios básicos de gratuitidade e universalidade, destinando-se a todas as pessoas que em Portugal tenham indicação para serem vacinadas.
Segundo a DGS, as vacinas que integram o PNV são as consideradas de primeira linha, isto é, que são comprovadamente eficazes e seguras e de cuja aplicação é possível obter os maiores ganhos em saúde.
O PNV é avaliado anualmente, mas com monitorizações semestrais. Nos primeiros seis meses de 2020, “os resultados obtidos foram muito positivos e semelhantes aos do primeiro semestre de 2019”, com uma cobertura de vacinação universal, em todas as idades e vacinas, que variou entre 82% e 99%, de acordo com a DGS.
Este estudo da Apifarma vai ser apresentado hoje em Lisboa, no âmbito da Semana Europeia da Vacinação, que se assinala anualmente na última semana de abril.
PERCEÇÃO PÚBLICA DA IMPORTÂNCIA DAS VACINAS INFANTIS CAI DURANTE A PANDEMIA
A Unicef alertou que a perceção pública da importância das vacinas infantis diminuiu durante a pandemia em 52 de 55 países analisados, incluindo Portugal, que registou uma queda de 6,5%.
“Em Portugal, a perceção da importância (da vacinação) para as crianças pré-covid-19 era de 98,2% e pós-covid-19 de 91,7%, uma diferença de 6,5%”, lê-se na síntese do relatório “Situação Mundial da Infância” hoje divulgado.
O Fundo das Nações Unidas para a Infância especificou que a opinião sobre a relevância das vacinas para as crianças baixou mais de um terço na Coreia do Sul, Papua Nova Guiné, Gana, Senegal e Japão.
De acordo com os dados recolhidos pelo Vaccine Confidence Project (VCP) e publicados hoje pela Unicef, a China, a Índia e o México foram os únicos países em que a perceção da importância das vacinas se manteve estável ou melhorou.
“Na maioria dos países, pessoas com menos de 35 anos e mulheres foram mais suscetíveis a relatar menos confiança em relação às vacinas para crianças após o início da pandemia”, conclui a Unicef.
No entanto, segundo o relatório, apesar das quedas, o apoio geral às vacinas infantis “permanece relativamente forte”, sendo que mais de 80% dos países inquiridos reconheceram a sua importância.
“Estes dados são um sinal preocupante. Não podemos permitir que a confiança na imunização de rotina se torne outra vítima da pandemia. Caso contrário, a próxima onda de mortes poderá ser de mais crianças com sarampo, difteria ou outras doenças preveníveis”, disse a diretora executiva da Unicef, Catherine Russell, citada em comunicado.
O relatório atenta que a conjugação de vários fatores “sugere que a ameaça da hesitação em relação às vacinas pode estar a aumentar”, como a incerteza sobre a resposta à pandemia, o acesso a informações fraudulentas, a diminuição da confiança nos peritos e a polarização política.
“De forma preocupante, a diminuição da confiança nas vacinas surge durante o maior retrocesso contínuo na imunização infantil em 30 anos, impulsionado pela pandemia de covid-19”, sublinhou a Unicef, recordando que “a pandemia interrompeu a vacinação infantil em quase todo o mundo”.
O relatório conclui ainda que um total de 67 milhões de crianças não foram vacinadas entre 2019 e 2021, com a cobertura vacinal a diminuir em 112 países. Dos 67 milhões de crianças que não tiveram acesso à vacinação de rotina entre 2019 e 2021, 48 milhões não receberam uma única vacina de rotina – estas crianças são referidas como “zero doses”.
Em 2022, segundo a Unicef, o número de casos de sarampo foi mais que o dobro contabilizado no ano anterior e o número de crianças paralisadas pela poliomielite aumentou 16%.
“Ao comparar (o período de) 2019 a 2021 com o período de três anos anterior, houve um aumento de oito vezes no número de crianças paralisadas pela poliomielite, reforçando a necessidade de garantir os esforços de vacinação”, indicou.
No final de 2021, a Índia e a Nigéria – países que verificaram quebras na natalidade – registavam o maior número de crianças que não receberam nenhuma dose, mas o aumento no número de “zero doses” foi especialmente notável no Myanmar (antiga Birmânia) e nas Filipinas.
“As imunizações salvaram milhões de vidas e protegeram comunidades de surtos de doenças mortais. Sabemos bem que as doenças não respeitam fronteiras. Para prevenir futuras pandemias, é fundamental manter os sistemas de saúde fortes e as campanhas de vacinação em dia”, afirmou Catherine Russell.
A diretora executiva da Unicef sustentou que, com os recursos que ainda estão disponíveis da campanha de vacinação da covid-19, “é o momento de redirecionar esses fundos para fortalecer os serviços de imunização e investir em sistemas sustentáveis para todas as crianças”.