O aumento recente dos preços do papel dos jornais e revistas provocado pelas subidas dos custos de produção é apenas a ponta do icebergue nos problemas do sector dos media, diz ao Expresso João Palmeiro, presidente da Associação Portuguesa de Imprensa (API), que assume que, assim que possível, irá alertar o novo Governo para as dificuldades que aí vêm.
“O que estamos a ver é um fim de ciclo em que houve muito armazenamento de papel devido ao menor consumo e em que não houve praticamente aumento de preços. Com a reconversão das fábricas para outros tipos de papel, nomeadamente o de embrulho e o cartão para responder às encomendas de comércio eletrónico, há menos produção para jornais e revistas. Estamos a entrar numa fase em que vamos ver agora o resultado dessa transformação”, afirma.
No final do ano passado as empresas de media com edições impressas anunciaram aumentos dos preços dos seus jornais e revistas de forma a refletir o aumento dos preços do papel e dos custos de produção. “Desde outubro/novembro até agora os preços do papel para jornais aumentaram entre 50% a 60% e os das revistas entre 40% a 50%”, diz João Palmeiro. A isto há a juntar os custos com transportes, energia e os consumíveis. Neste último caso dos consumíveis, onde se incluem os tinteiros, o aumento vai dos 12% aos 30%.
O aumento dos custos de produção penalizou os grupos de comunicação social com edições impressas e por isso grande parte dos jornais e revistas nacionais publicados em Portugal anunciaram aumentos de preços como o Expresso, o Público, Correio da Manhã, Jornal de Notícias ou Diário de Notícias.
Mas o aumento do preço de venda resolve de forma limitada o problema do aumento de custos, até porque parte significativa das vendas de algumas publicações, nomeadamente na imprensa regional, é feita através de assinaturas e o preço das assinaturas não pode ser alterado a meio.
Outra das hipóteses para fazer face à subida de custos é a redução do número de páginas de cada edição ou ainda a mudança de periodicidade, nomeadamente nos jornais regionais – por exemplo, em vez de serem publicados semanalmente, passaram a ser publicados quinzenalmente. Medidas que poderão ser intensificadas agora por causa da nova conjuntura.
“Não há ainda uma visão muito clara do que vai acontecer a seguir mas podemos ficar limitados a produtores de papel que estão longe da Europa”, afirma. Isto porque a Europa está a produzir cada vez menos papel para jornais e revistas e Portugal, que não produz este tipo de papel, abastece-se no norte da Europa, em especial na Finlândia e Noruega, mas também na Rússia, Holanda, Alemanha ou Espanha. A alternativa são países como o Canadá ou o Chile (onde ainda há grande capacidade de produção de papel para jornal e revista), com o consequente agravamento dos custos de transporte e alfandegários. “São sempre fretes muito caros, muito impactados com o aumento dos preços dos combustíveis. O que vem aí a seguir vai ser muito complicado”, diz João Palmeiro. Há ainda que ter em conta que o papel é um produto “delicadíssimo de armazenar”.
A situação é mais grave para o papel de jornal, mas também é complicada para o de revista, explica o presidente da API.
Para contrariar as dificuldades de importar papel de fora da União Europeia devido à logística e aos custos, João Palmeiro defende que devia haver apoios à importação, esclarecendo que não está em causa a atribuição de subsídios mas sim o adiantamento de dinheiro que depois seria restituído com juros, ainda que muito baixos, com benefícios fiscais e tarifários.
João Palmeiro refere que teve conversas consideradas “muito promissoras” com o Governo sobre a situação dos media e a necessidade de apoiar as empresas do sector mas que depois, na prática, resultaram em muito pouco. “É muito difícil mobilizar as mentalidades políticas. Sinto uma grande indiferença em relação ao sector”, afirma.
Agora que o novo governo de maioria absoluta do PS se prepara para tomar posse, a API pretende voltar a sensibilizar o poder político para a situação do sector. “O programa eleitoral do PS dizia que um dos objetivos do partido era a revisão dos apoios do Estado ao sector dos media. Para nós isso não passa pela atribuição de subsídios mas sim encontrar soluções para que as empresas possam aceder a fundos em condições mais favoráveis”, afirma João Palmeiro. A este propósito recorda a recomendação da União Europeia aos diferentes países para que comprem publicidade e ajudem o sector dos media a ter acesso a linhas de crédito mais favoráveis. Isto porque os bancos definem critérios de financiamento que são considerados muito difíceis de cumprir pelas empresas dos media. “As regras de cumprimento dos rácios fixados pelos bancos são completamente inalcançáveis pelo sector”, afirma. E defende ainda que haja uma comparticipação para a transição digital do sector.
O facto de o PS ter agora maioria absoluta pode facilitar que o Governo avance com a intenção de rever os apoios à comunicação social. “O facto de haver maioria absoluta pode facilitar”, afirma João Palmeiro. Defende ainda que seja criada uma entidade pública que funcione como braço executivo do Governo para os media como acontece para a área do cinema e do audiovisual com o Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA). “Agora só há que ter vontade política e encontrar quem execute”, afirma.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL