Durante décadas, oligarcas russos, muitos deles próximos do Presidente Putin, transferiram para fora do país milhões de dólares ilícitos, com o objetivo de ser mais difícil de seguir o seu rasto. Parte desse dinheiro era roubado do orçamento de Estado russo e servia, por exemplo, para espionagem e desinformação. Com a invasão da Ucrânia, o cerco a estas fortunas apertou, mas muitos milhões continuam escondidos em empresas fachada.
A BBC foi procurar saber onde e como os oligarcas russos escondem as suas fortunas. Desde o início da invasão da Ucrânia, países por todo o mundo adotaram sanções e nova legislação para identificar e congelar bens e fortunas de oligarcas russos próximos do Presidente Putin.
Mas muitos milhões continuam escondidos por empresas fachada com sede em paraísos fiscais, como as Ilhas Virgens Britânicas ou as Ilhas Cayman.
QUANTO DINHEIRO DE OLIGARCAS RUSSOS ESTÁ ESCONDIDO?
O think tank Atlantic Council adianta que o valor total rondará cerca de trilião de dólares. Num relatório de 2020, estimou-se que um quarto desse valor seja controlado diretamente pelo Presidente da Rússia e pelos seus oligarcas mais próximos.
“Esse dinheiro pode ser explorado e usado pelo Kremlin para espionagem, terrorismo, suborno, manipulação política, desinformação entre outros propósitos nefastos”, indica o relatório.
COMO É ADQUIRIDO ESSE DINHEIRO?
Outro think tank norte-americano, o National Endowment for Democracy, indica que terá sido o próprio Vladimir Putin quem encorajou os seus próximos “a roubar do orçamento do Estado, extorquir dinheiro de empresas privadas e até orquestrar a apreensão total de empresas lucrativas”. Terá sido desta forma que alguns oligarcas construíram as suas fortunas.
A título de exemplo, segundo a BBC, os líderes da oposição russa Boris Nemtsov e Vladimir Milov denunciaram que 60 biliões de dólares foram transferidos dos fundos da petrolífera Gazprom para contas de amigos de Putin.
Também na recente investigação aos Pandora Papers, levada a cabo pelo Consórcio Internacional de Jornalistas, se concluiu que pessoas próximas de Putin tornaram-se muito ricas e podem estar a ajudar o Presidente russo a movimentar a sua própria riqueza.
ONDE É GUARDADO?
O Chipre será o principal esconderijo, a BBC lembra, aliás, que a ilha ficou conhecida por ser uma espécie de “Moscovo do Mediterrâneo”. De acordo com o Atlantic Council, 36 biliões de dólares foram canalizados para Chipre só num ano, em 2013. Deste montante, a maioria chegou através de empresas de fachada usadas precisamente para ocultar os verdadeiros donos.
Outro destino de eleição são as Ilhas Virgens Britânicas e as Ilhas Cayman. Um relatório da Global Witness, citado pela BBC, refere que, em 2018, os oligarcas russos tinham cerca de 45,5 biliões de dólares nesses paraísos fiscais.
Parte desse dinheiro chega a capitais financeiras como Nova Iorque e Londres, onde pode depois ser investido. A organização anti-corrupção Transparency International adianta que pelo menos dois biliões de dólares de propriedades no Reino Unido são de cidadãos russos acusados de crimes financeiros ou com ligações ao Kremlin.
A amplitude da lavagem de dinheiro russa ficou ainda mais exposta em 2014, quando foi revelado o Projeto de Denúncia de Crime Organizado e Corrupção -designado “Lavandaria Russa” – e que revelou que entre 2011 e 2014, 19 bancos russos lavaram 20,8 biliões de dólares de mais de cinco empresas (5.140) em 96 países.
COMO É ESCONDIDO O DINHEIRO?
O modo mais comum é através de empresas fachada. “Os oligarcas contratam os melhores advogados, auditores, banqueiros e lobistas no mundo para desenvolver meios legais de ocultar e lavar os seus fundos”, diz o Atlantic Council.
“Um oligarca tem camadas de empresas de fachada anónimas em várias jurisdições offshore, e os seus fundos movem-se à velocidade da luz entre elas”, refere o think tank norte-americano.
Também em 2016, o Consórcio Internacional de Jornalistas publicou a investigação Panama Papers, que revelou que apenas uma empresa tinha criado mais de duas mil (2.071) empresas fachadas para cidadãos russos.
QUE MEDIDAS ESTÃO A SER TOMADAS?
Após a invasão russa da Ucrânia, os países anunciaram uma série de medidas para rastrear o dinheiro russo. Do outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos foi montada a operação KleptoCapture. O objetivo é atacar diretamente os oligarcas russos, apreendendo bens obtidos de forma ilícita.
No mesmo sentido, o governo britânico adotou o Unexplained Wealth Orders (UWOs), que obriga futuros investidores a provarem a proveniência do dinheiro para a compra de ativos no Reino Unido.
O Reino Unido suspendeu também o sistema de vistos gold, que atribuía direitos de residência a quem investisse grandes quantias no país.
Malta, outro dos destino favoritos do dinheiro russo, suspendeu este sistema, que permitia aos oligarcas comprar a cidadania. O mesmo fizeram, em 2020, o Chipre e a Bulgária.
- Texto: SIC Notícias, televisão parceira do POSTAL