
Assessor do Instituto de Defesa do Consumidor;
Consultor do POSTAL
A obra de divulgação intitula-se “Saúde Digital, um sistema de saúde para o século XXI”, é escrita pelo gestor José Mendes Ribeiro, edição da Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2019. O autor enuncia os grandes desafios que se põe ao futuro da política de Saúde, relevando o fenómeno do envelhecimento, o imbróglio das inúmeras aplicações do sistema informático que dificultam a boa relação médico-doente. E escreve: “O sistema de saúde continua carregado de ineficiências e de desperdício devido em boa parte à complexidade da sua arquitetura funcional e ao modelo de financiamento do sistema obsoleto, que dificulta a integração de cuidados, esconde a espiral do aumento dos seus custos e gere níveis de insatisfação muito elevados. As listas de espera para consultas, exames e cirurgias são a brutal prova dessa ineficiência e o preço injusto pago pelo cidadão comum”. E somos lançados no espetro da saúde digital: o admirável novo mundo da conetividade; a oportunidade da revolução digital na Saúde; a moldura para uma nova visão para o sistema de saúde; um punhado de iniciativas para pôr em marcha a saúde digital.
Ninguém ignora, faz parte do nosso quotidiano, a conetividade está a mudar o mundo e o comportamento das pessoas, a maior evidência é o telemóvel. Em 2016 já ocupávamos o terceiro lugar na tabela da União Europeia quanto a taxa de assinatura do serviço de telemóvel por mil habitantes. E o autor recorda a importância ascensional da telemedicina, que cria a facilidade de acesso a uma consulta médica não presencial. “Em muitos países, permite o acesso direto do consumidor a um médico de cuidados primários, ou mesmo a um especialista qualificado, através de uma aplicação instalada no telemóvel, tablet ou computador. Em muitos casos, o serviço é promovido pelas seguradoras de saúde ou por reputados operadores de prestação de cuidados. Em Portugal, já se começam a disponibilizar algumas dessas ofertas”.
Iremos beneficiar da convergência crescente na partilha da informação e do conhecimento. “Segundo a consultora Accenture, há três tendências que guiam a inovação e criam oportunidades de gerar informação e conhecimento para investigadores no domínio da colaboração entre o humano e a máquina, na área dos cuidados de saúde: novos produtos e dispositivos inteligentes, novas funcionalidades para os aparelhos e novos desenvolvimentos da inteligência artificial”. Já estão em pleno funcionamento aplicações móveis que incentivam os pacientes a comprometerem-se com a personalização dos seus cuidados. “A possibilidade de monitorização remota é um dos grandes meios da medicina de precisão, ao permitir à equipa médica o ajusto permanente da terapêutica face à resposta individual do paciente, como resultados dos parâmetros que vai medindo através das aplicações a que o paciente fica ligado”. A grande reserva que se pode pôr ao sucesso desta monitorização é fazê-la depender de um elevado estado de responsabilização e de literacia do doente.
O autor também observa que a tecnologia digital poderá vir a contribuir para uma profunda mudança do sistema de saúde português e escreve: “A organização dos cuidados em volta do paciente é uma tendência obrigatória que vai acontecendo por todo o mundo, ajudando a quebrar as barreiras artificiais existentes entre os cuidados hospitalares e os cuidados primários, entre a saúde e a assistência social e entre os generalistas e os especialistas”. E destaca a crescente importância das doenças crónicas, já que estas são o maior sorvedouro dos gastos públicos em Saúde e adianta elementos: “Os principais tipos de doenças não-transmissíveis são doenças cardiovasculares, cancro, doenças respiratórias crónicas e a diabetes”. Todas elas com elevada dimensão mundial, como ele sublinha. Ora atuando sobre as doenças não-transmissíveis há que contar com a saúde digital, o que requer a mudança do foco na doença para o foco na saúde, com o concurso das ferramentas na saúde digital.
Aproveita a oportunidade para esboçar um modelo de arquitetura e governação do sistema de saúde. Começa por prever a concentração de todas as atividades de gestão do SNS num órgão de administração central, na criação de um órgão autónomo especializado no financiamento que assegure a gestão dos contratos-programa com as instituições do SNS. Disserta sobre o ecossistema digital de saúde, apresenta a inteligência artificial como ferramenta de prevenção de riscos e dá um exemplo: “Os médicos do SNS inglês usam calculadoras de risco, como parte do NHS Health Check, para avaliar o risco de, num prazo de dez anos, um paciente desenvolver problemas cardíacos ou circulatórios, embora essas calculadoras só considerem a saúde de um paciente no momento em que é consultado, em vez de incluir uma análise ao historial médico e familiar”. Volta a enfatizar o poder emergente da telemedicina e enuncia os pilares fundamentais para que se crie o ambiente necessário ao desenvolvimento digital da área da Saúde.
Este livrinho de divulgação remata com a exposição “Pôr em marcha a saúde digital”, ele considera da maior importância a criação do Centro de Excelência de Saúde Digital e traça uma previsão do que será o hospital em casa, bem como a telemedicina. E conclui: “Uma abordagem da saúde e bem-estar orientada para o cidadão é uma das grandes contribuições que a tecnologia digital poderá proporcionar aos sistemas de saúde, incorporando uma dimensão que tem sido muitas vezes esquecida, ou seja, a compreensão de que a perspetiva fundamental do sistema de saúde é servir o cidadão”.