O número de idosos a cumprir penas de prisão no Japão tem aumentado de forma alarmante nos últimos anos. Muitos destes reclusos, com mais de 65 anos, são condenados por pequenos furtos, cometidos não por ganância, mas por necessidade. A falta de apoio social e a solidão levam alguns a reincidir de propósito, pois na prisão encontram alimentação, cuidados médicos e companhia, algo que lhes falta no dia a dia.
De acordo com dados da CNN Internacional, a população carcerária idosa quadruplicou entre 2003 e 2022. Atualmente, cerca de metade dos furtos registados no país são cometidos por pessoas com mais de 65 anos, e mais de 80% das reclusas desta faixa etária estão presas por roubo. Em muitos casos, os próprios idosos apresentam-se voluntariamente à polícia, entregando os bens furtados, numa tentativa de acelerar o processo de detenção.
Um dos exemplos mais marcantes é o de Toshio Takata, um homem de 60 anos que roubou uma bicicleta e se entregou às autoridades. A sua história reflete a de muitos outros idosos que, ao cumprirem a pena, percebem que a vida na prisão é mais segura e confortável do que a realidade que enfrentam fora dela.
Segundo a Executive Digest, a pobreza e o isolamento social são as principais razões que levam muitos idosos a esta situação extrema. O Japão enfrenta um dos ritmos de envelhecimento mais acelerados do mundo, com uma taxa de natalidade extremamente baixa, o que tem criado um cenário de solidão e falta de suporte familiar. Sem apoio suficiente, muitos idosos sentem-se desamparados e procuram alternativas para sobreviver.
A questão financeira agrava ainda mais o problema. O sistema de pensões japonês não consegue garantir um rendimento digno a muitos reformados. Segundo a Bloomberg, muitos idosos continuam a trabalhar mesmo depois dos 70 e 80 anos para conseguirem pagar as suas despesas. Em 2019, um estudo da Universidade Metropolitana de Tóquio indicava que 44% das mulheres idosas solteiras viviam abaixo do limiar da pobreza.
O acesso limitado a recursos básicos leva muitos a ver a prisão como uma solução para os seus problemas. Lá, têm garantidos refeições, alojamento e assistência médica, algo que não conseguem assegurar no exterior. Para muitos, a prisão torna-se uma alternativa mais segura e digna do que a liberdade.
A história de Akiyo, uma mulher de 81 anos condenada por furtos repetidos, ilustra bem esta realidade. O seu próprio filho rejeitou-a, dizendo-lhe: “Gostava que te fosses embora”. Sentindo-se sem esperança, viu na prisão um refúgio. “Se tivesse estabilidade financeira e uma vida confortável, não teria feito isto”, confessou. “Talvez esta seja a vida mais estável para mim”.
O professor Andrés Losada Baltar, especialista em Psicologia Clínica, traça um paralelo com a realidade espanhola, onde também há pessoas que prolongam a estadia em hospitais ou lares por não terem apoio em casa. “Muitos idosos procuram nesses espaços a atenção e o carinho que não encontram nas suas famílias”, explicou ao ABC.
A reintegração dos idosos após a libertação também representa um grande desafio. Muitas vezes, ao saírem da prisão, não têm qualquer rede de apoio e acabam por voltar a cometer crimes para serem novamente encarcerados. “Mesmo depois de regressarem à sociedade, não têm ninguém que cuide deles”, afirmou uma guarda prisional à CNN.
O Japão enfrenta um problema estrutural que exige mudanças urgentes. O governo tem desenvolvido iniciativas para apoiar idosos em situação de vulnerabilidade, mas ainda há um longo caminho a percorrer. O preconceito contra os mais velhos, conhecido como “idadismo”, agrava a situação, levando-os a acreditar que são um fardo para a sociedade. Para resolver esta crise, será essencial garantir melhores condições de vida à população idosa e evitar que a prisão continue a ser vista como a única alternativa viável para muitos.
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