O capitão do porto de Portimão em funções na altura da derrocada na praia Maria Luísa, em Albufeira, que provocou cinco mortos, disse esta sexta-feira em tribunal que as vítimas “se terão encostado demasiado” à rocha, presumivelmente para obter sombra.

Na penúltima sessão do julgamento, Pedro Marques Pereira declarou que a sua “noção”, baseada no que viu quando chegou ao local, é a de que as vítimas “estavam a dois ou três metros” do leixão (rocha grande) e “se terão encostado muito” a uma fenda existente na sua base.
Contudo, aquela testemunha, que tutelava a faixa marítima compreendida entre Alvor (Portimão) e Quarteira (Loulé), admitiu tratar-se de uma “presunção”, que não pode “sustentar”, uma vez que só chegou àquela praia de Albufeira após a derrocada, tendo acompanhado parte do processo de remoção dos corpos e dos escombros.
No que respeita à colocação da sinalética a alertar para o perigo de queda de pedras colocada no leixão, Pedro Marques Pereira não conseguiu confirmar ao tribunal se foi a capitania a ter essa iniciativa ou o dono da concessão de praia, afirmando que se lembra apenas de que o “sinal teve que ser recolocado várias vezes”.
À margem da sessão, o advogado Pedro Proença disse à Lusa que “ao contrário do que foi veiculado na altura pelo capitão do porto, as vítimas não estavam encostadas ao leixão”, sublinhando que aquele “leixão nunca produz sombra”.
O advogado, que representa a família de Manuel Marques Pereira, que perdeu quatro pessoas na derrocada: a filha, o genro e as duas únicas netas, disse ainda que, à data, já havia informação sobre as distâncias de segurança a manter relativamente às arribas.
“O cone de projeção da derrocada, quer da arriba, quer do leixão, é equivalente a uma altura e meia do leixão e da arriba, o que significa que uma pessoa que esteja a 10 ou 15 metros pode ser atingida”, referiu, sublinhando que essa informação consta do Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) do Algarve desde 1999.
Durante a tarde, o tribunal agendou uma visita de inspeção ao local mas, segundo o advogado, apesar de estarem convocados, o diretor da Administração Regional Hidrográfica (ARH) na altura e o atual diretor regional da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) não vão comparecer.
“Lamentavelmente, nenhum vai estar presente e podia ser importante para esclarecer dúvidas do tribunal”, concluiu.
Famílias das vítimas consideram que existiu omissão de deveres que competem ao Estado
O desabamento do leixão – com dez metros de altura, seis de diâmetro e um peso de várias toneladas -, causou há dez anos, na manhã de 21 de agosto de 2009, a morte de cinco pessoas que passavam férias no Algarve, quatro das quais da mesma família.
Naquele dia, morreram quatro pessoas da mesma família: António e Anabela Fonseca, de 59 e 57 anos, e as filhas Mariana, de 26 anos, e Ana Rita, de 31, residentes no Porto.
Maria Emília Dias, de 37 anos, foi a quinta vítima mortal do acidente, no seu último dia de férias em Albufeira com o marido, António Dias Salazar Freitas, e as filhas, Jennifer, na altura com 16 anos, e Gladys, com 11.
Quase dez anos depois do acidente, o Estado, único réu no processo, vai agora responder pelo pedido de indemnização civil de 911 mil euros apresentado pelos familiares das cinco pessoas que morreram.
O acidente causou ainda um ferido grave, Vítor Sousa, namorado de Mariana, à data com 24 anos, e que ficou soterrado durante aproximadamente quatro horas até ser resgatado.
As famílias das vítimas consideram que existiu “omissão de deveres que competem ao Estado, através de diversos institutos, porque havia uma falésia que tinha de ser monitorizada para não constituir risco”, de acordo com a petição inicial da ação.
Apesar da sinalização a indicar risco, de acordo com os autores da ação contra o Estado, “não foi avaliado o risco real do que poderia representar a queda da falésia”, que ocorreu, alegam, devido à instabilidade provocada pelo desgaste na sua base.