Na madrugada de 12 de novembro de 2019, o agente da PSP, Eurico Santos, da esquadra de Trânsito da PSP de Beja, abordou de forma ríspida um grupo de imigrantes estrangeiros, que aguardava por transporte para irem trabalhar para o campo. Segundo a acusação do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Évora, a que o Expresso teve acesso, o agente parou o carro e “de forma exaltada e exalando um forte cheiro a álcool”, abordou o grupo para lhes pedir a sua identificação, “falando sempre em língua portuguesa”, e começou a chamar-lhes “cabrões”, “ciganos”, “filhos da puta” e “porcos”.
Poucos minutos depois, “sem que nada o fizesse prever”, agarrou em Oleksandr B., um imigrante ucraniano que se encontrava com o grupo, algemou-o e forçou-o a entrar no interior do carro patrulha. Quando chegou à esquadra parou o carro no recinto, vedado com muro e gradeamento e separado do exterior, e “de forma exaltada e descontrolada, utilizando a sua força muscular, puxou Oleksandr B. para o exterior da viatura policial e levou-o a ficar assente com os joelhos no chão deste recinto, mantendo-lhe as algemas colocadas nos pulsos”.
O agente interrogou o imigrante de forma “altiva”, “desferindo-lhe puxões encontrões”, circulando à sua volta, “atemorizando-o”. Oleksandr B. nunca reagiu. “Ficando cada vez mais exaltado e irritado, o arguido, utilizando a sua força muscular, sem que nada o justificasse, começou a bater no corpo de Oleksandr B., desferindo-lhe pontapés, pancadas com os seus punhos e utilizando um objeto rígido, com a forma de bastão, cujas demais características concretas não se lograram apurar, bateu-lhe na cabeça, face, tórax posterior, zona do abdómen e pernas”, descreve o DIAP de Évora.
Nessa altura, “também apertou e puxou fortemente as algemas de Oleksandr B. provocando-lhe dores nos pulsos”, e o imigrante ficou deitado no chão “a gemer” e a “contorcer-se sem oferecer resistência”, perdendo “o discernimento espácio-temporal”. Perguntando-lhe porque se queixava, o agente voltou a bater-lhe com as mãos, desferindo-lhe mais puxões.
Nessa altura chegaram mais três agentes, que auxiliaram o imigrante a levantar-se a dirigir-se para a entrada principal da esquadra, onde foi identificado, e fazendo acabar as agressões. Oleksandr B. foi libertado e queixando-se de dores foi para o hospital de Beja onde seria assistido.
Refere o DIAP de Évora que “como consequência direta da ação do arguido, com as pancadas, puxões, apertos e pontapés desferidos, Oleksandr B. veio a sofrer politraumatismos, edema e rubor em várias partes do corpo, mialgia paravertebral lombar e sagrada, fratura da apófise estiloideia do cúbito do membro superior esquerdo, decorrentede traumatismo, com colocação de tala gessada.” E foi obrigado a ficar 45 dias sem trabalhar.
O procurador Nuno Reboncho acusou o agente Eurico Santos, pelos crimes de tortura e outros tratamentos cruéis, degradantes ou desumanos graves. “O arguido quis causar lesões físicas, dor corporal, sofrimento moral agudo e causar receio a Oleksandr B., tratando-o de forma desumana e indigna”, “valendo-se da sua posição e autoridade policial”.
Os três colegas da PSP não foram acusados de cumplicidade mas foram admoestados pelo Ministério Público. “Poderiam ter tido uma atitude mais proativa, assegurando-se efetivamente que o ofendido não precisava mesmo de auxílio médico, afastando todas as dúvidas sobre a sua conduta.” O procurador de Évora defende que estes comportamentos dos agentes não acusados “deverem motivar adequada reflexão hierárquica por parte da PSP”.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL