Acho que nunca saio verdadeiramente sozinha. Por mais que sejamos só eu e ela, e mesmo em estradas desertas, trago sempre companhia. Por norma vêm três comigo, encavalitados num íntimo que me fomentaram forte, leve e resistente. Sim; os três motociclistas da minha vida instalam-se bem cá dentro de cada vez que pego no capacete e nas luvas e me dirijo à garagem.
O meu pai vem de anjo da guarda, creio, alternando a alegria que o som do icónico motor lhe desperta com um aberto sorriso de orgulho.
-Vamos Anutska? – desafiava sorridente quando queria companhia. E aprendi a ser pendura com ele, nem me lembro com que idade mas muito antes de, já adolescente, ao libertar do capacete a melena, insistir em sacudi-la assim como via nos filmes.
O meu marido vem de farol, escudo, porto seguro e exemplo pois conduz como um herói; vem a sussurrar “diverte-te” num constante mantra de apoio incondicional a quaisquer que sejam os novos voos a que sempre me proponho.
– Tens medo? – perguntava-me nos nossos primeiros passeios de mota.
– Não!
Mas depois eu apertava-lhe sempre a barriga, com ambas as mãos, quando ia depressa demais para o meu gosto.
O meu mentor e editor, o aventureiro francês Eric Lobo, vem de inspiração derradeira. Habituado a condições tão extremas que muitos o consideram louco, vem num misto de gozo face aos meus dóceis percursos e de conselheiro zeloso.
– Dá-me conselhos para a minha estreia, amanhã. – pedi na véspera de ir buscar a minha primeira mota ao stand.
– Os Buracos! Tu tem-me atenção aos buracos e desvia-te deles a tempo! – creio que na época ele se encontrava na Rússia profunda…
É, nunca ando de mota sozinha pois tenho a infinita sorte de ter, não um mas três, motociclistas soberbos na minha vida. E vêm sempre todos comigo. Protegendo, inspirando e instigando a serenidade, o prazer e a precaução.
Vêm sempre os três comigo e é assim mesmo que adoro.