A proposta para o Parque Marinho do Algarve, entre Lagoa, Armação de Pêra e Albufeira, a primeira área marinha protegida proposta pela comunidade, deverá ser apresentada ao Governo.
O projeto é considerado inovador e pioneiro no âmbito da cogestão, já que surge de um processo de consulta e participação de várias entidades, entre pescadores, câmaras municipais, universidade e instituições locais e centrais com a preocupação de criar uma zona de proteção da vida marinha.
Para o presidente da Associação de Pescadores de Armação de Pêra (APAP) a primeira área marinha protegida de interesse comunitário (AMPIC) a implementar na costa entre Lagoa, Armação de Pêra e Albufeira foi pensada “de baixo para cima”, sentando “toda a gente à mesa” já que a “última coisa que os pescadores querem” é mais uma reserva no contexto em que normalmente é feita.
“A gestão terá de ser participada e com atores locais porque fazer um quadrado no mapa e ser gerido em Lisboa, não leva a lado nenhum de certeza. Terá de ser com entidades da zona que aqui trabalham e que dependem do recife”, revelou à Lusa Miguel Rodrigues.
A intenção é salvaguardar uma zona conhecida como a Pedra do Valado, na Baía de Armação de Pêra que se prolonga por sete milhas náuticas (cerca de 12 quilómetros), sendo o maior recife rochoso costeiro de Portugal e onde podem ser encontradas cerca de 800 espécies marinhas.
Para além da biodiversidade, possui condições oceanográficas “únicas” que favorecem o “desenvolvimento e sobrevivência larvar de várias espécies de peixe, funcionando como a principal maternidade da região algarvia”.
Segundo a proposta elaborada ao longo de meses com várias reuniões participativas, procura-se criar uma área protegida com mais de 150 quilómetros quadrados, contemplando zonas de proteção total e parciais, com regras específicas.
A acontecer, este será o primeiro parque natural marinho a ser reconhecido em mais de 20 anos, após a criação da reserva Luiz Saldanha, junto à Serra da Arrábida, em Sesimbra, em outubro de 1998.
A “riqueza” da Pedra do Valado era já do “conhecimento geral” dos pescadores, mas para Miguel Rodrigues era necessário um estudo que o “comprovasse”, o foi possível com o mapeamento da costa sul portuguesa até aos 30 metros de profundidade, feito pelo Centro de Ciências do Mar (CCMAR) da Universidade do Algarve (UAlg) entre 2003 e 2012.
Um dos investigadores revelou à Lusa que o estudo permitiu reconhecer que a zona agora proposta para a AMPIC era “de longe a mais rica” da costa portuguesa e algarvia, um dado que pode ser “consolidado” por estudos posteriores.
“É dos maiores afloramentos rochosos costeiros portugueses e aquele que se situa na costa sul, que tem maior biodiversidade que o resto do país”, destaca Jorge Gonçalves.
O biólogo realçou que a experiência reunida na dinamização das Tertúlias do Polvo, que promoveram junto das várias comunidades piscatórias no Algarve entre 2014 e 2016, lhes permitiu perceber que “algo mais poderia ser feito com os processos participativos, sobretudo a nível das comunidades locais” realçou.
A delegação da Liga para a Proteção da Natureza (LPN) “foi das primeiras entidades a considerar uma zona de proteção, em 2014”, tendo dado os “primeiros passos para um processo participativo”, mas que entretanto foi interrompido, acabando por ser retomado em novembro de 2018 pela Fundação Oceano Azul (FAO), APAP e o município de Silves, ao qual se juntaram os de Lagos e Albufeira, notou.
Foi nessa altura que se realizaram várias sessões participativas, onde mais de 70 entidades interessadas se envolveram nos trabalhos preparatórios da AMPIC e foi possível chegar a uma proposta mais consensual de zonamento, em fevereiro deste ano.
Para a presidente da Câmara Municipal de Silves, o caráter “inovador e pioneiro” desta AMPIC decorre da sua construção por “iniciativa da própria comunidade, dos municípios e da universidade”, ou seja, “de baixo para cima”, ao contrário do que diz ter sido a prática comum quando surgem por “imposição do Estado, de cima para baixo”.
Rosa Palma apontou que é uma oportunidade imperdível para a melhoria das condições de trabalho da comunidade piscatória de Armação de Pêra e a valorização do seu pescado.
Já a vice-presidente da Câmara de Lagoa destacou o processo participativo que colocou em ”pé de igualdade instituições públicas, atividades recreativas, atividades marítimo-turísticas e pesca profissional” e salientou a necessidade de garantir as medidas de compensação aos pescadores, permitindo “alterar algumas das propostas iniciais”.
Para Anabela Simão, “é importante que a AMPIC surja”, mas num formato que classifica de “confluência de usos”, entre pescadores, mergulhadores e marítimo turísticas.