As agências de viagens viveram desde o seu início, em meados do século XIX, uma época dourada, sobretudo a partir do advento do turismo contemporâneo no final da década de cinquenta do século passado, tendo algumas delas evoluído para grossistas e, muitas outras, absorvidas e integradas em redes de retalhistas detidas por Operadores Turísticos.
A alteração das lógicas comerciais entretanto ocorridas, decorrentes do avanço das novas tecnologias de informação, criaram canais de distribuição de férias e hábitos de consumo que afectaram seriamente o modelo de negócio tradicional, com especial incidência ao nível da chamada intermediação, leia-se das agências de viagens, situação que levou mesmo ao encerramento, reconversão, falência e desaparecimento de muitos destes agentes turísticos.
Porém, ironia das ironias, o desmoronamento progressivo e acentuado do modelo de negócio turístico concentrado em grandes grupos, a requerer novas soluções empresariais, permitem às agências de viagens tradicionais reconquistar, através da implementação de novas estratégias de gestão e do recurso a novas técnicas de marketing, fatias de mercado e oportunidades de negócio nunca experimentadas anteriormente, o que vem relançar a sua importância na cadeia de valor do sector turístico e empresarial.
Conhecer quem vende e quem quer comprar é a condição “sine qua non” para se poder ser um bom intermediário
De facto, e para quem vaticinava até há pouco tempo, o desaparecimento das agências de viagens tradicionais, vulgo retalhistas, não pode deixar de assumir agora o potencial que estas estruturas empresariais, organizadas não raras vezes em empresas unifamiliares, podem desempenhar no negócio turístico no futuro.
A intermediação, no mundo dos negócios, quer para quem compra quer para quem quer vender, sempre foi considerada uma actividade mal vista, praticada por gente considerada de mau porte e sem escrúpulos, cujo enriquecimento fácil e rápido é conseguido à custa das fraquezas de terceiros.
O risco fica, normalmente, com quem produz e investe não só o que é seu como o que é dos outros, apresentando-se como o elo mais fraco na hora da distribuição da riqueza gerada. A parte mais substancial do lucro é, deste modo, deixada nas mãos dos habilidosos e “inteligentes”, quais intrusos oportunistas de rédea à solta nos mercados, comprando barato e vendendo caro, tirando para si as mais valias recolhidas à custa dos que ousando arriscar desconhecem as mais elementares regras daquilo a que pomposamente chamamos, na era moderna, de marketing ou políticas de marketing. Independentemente das designações, sempre assim foi e sempre assim será.
Conhecer quem vende e quem quer comprar é a condição “sine qua non” para se poder ser um bom intermediário e, por conseguinte, no caso em apreço, um bom agente de viagens. Esta ligação entre o produto e o consumo não só não é nociva como pode e deve ser incentivada e promovida, desde que respeitadora das boas regras comerciais e de relacionamento entre parceiros. Ou seja, cada galo no seu poleiro.
Daí que, as agências de viagens começassem por ser exclusivamente comissionistas, antes de se terem aventurado por outros caminhos, em alguns casos com resultados desastrosos. O regresso às origens apresenta-se, neste contexto, como uma alternativa credível, saudável, consistente e, muito principalmente, economicamente sustentada em termos de futuro, desde que atentas e salvaguardadas as necessárias e indispensáveis adaptações.
Os negócios deverão ficar com os chamados “donos do negócio”. Ou seja, as incursões em actividades económicas pouco conhecidas resultam quase sempre mal. O turismo constitui um bom exemplo nesta máxima.
É minha convicção pessoal que as agências de viagens tradicionais, enquanto agentes de intermediação no negócio turístico, dispõem hoje de um conjunto de ferramentas que, se devidamente utilizadas, podem relançar progressivamente estas empresas relegadas, durante anos, para um plano secundário na actividade turística, reposicionando-as, pelas suas características e especificidades, como importantes dinamizadores da economia do turismo.
O espírito que animou o primeiro agente de viagens mundial há mais de 180 anos (1841), Thomas Cook, persiste e continua mais vivo do que nunca. Por isso, e sendo certo que o futuro das agências de viagens não está num regresso ao passado, a verdade é que estas se encontram bem posicionadas para enfrentar e vencer os desafios decorrentes das transformações que se verificam nos mercados turísticos e nos hábitos dos consumidores de férias, desempenhando o papel decisivo e determinante que, apesar de tudo, sempre tiveram na afirmação e consolidação do sector turístico à escala mundial.
*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia
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