Mauro Paulino, psicólogo clínico e forense, autor do livro “Violência Doméstica. Identificar, Avaliar, Intervir”, falou com o POSTAL acerca da violência doméstica em Portugal, o que se pode fazer para identificar potenciais agressores e quais as medidas que ainda faltam tomar.
O livro, escrito em parceira com Miguel Rodrigues, chefe da Polícia de Segurança Pública, pretende actuar em três grandes eixos: em primeiro lugar sensibilizar profissionais para algumas problemáticas da violência doméstica que passam em claro nos Tribunais e em órgãos de polícia criminal; em segundo sensibilizar o público em geral para esta temática; e em terceiro, visa ajudar tanto as vítimas, como os familiares e amigos das mesmas.
Isto porque, segundo o autor, o livro apresenta imagens e exemplos do que é que em concreto se vai passar em tribunal, ajudando, desta maneira, a preparar as vítimas para todo o processo que têm pela frente, sabendo à priori quais os seus direitos.
“Muitas das mulheres mortas pelos maridos já tinham ido oito vezes à polícia”
Mauro Paulino afirmou ao POSTAL que “infelizmente há uma atitude geral de desvalorização, de benevolência com as questões da violência doméstica, ou um adiar de reacção”. Na opinião deste psicólogo, a questão mais importante retratada no livro, é a avaliação de risco, ou seja, “todas as situações de violência doméstica que são reportadas às autoridades devem beneficiar de uma avaliação de risco para perceber o potencial de homicídio daquela situação”. Isto porque, ainda segundo o mesmo, citando um estudo internacional “muitas das mulheres mortas pelos maridos já tinham ido oito vezes, em média, à polícia denunciar a situação”.
Apesar de concordar que as leis têm vindo a sofrer alterações consoante a evolução da sociedade, Mauro Paulino acredita que o necessário é “mudar mentalidades, incentivar a aquisição de uma série de competências, de noções, de recursos psicológicos, para que as pessoas possam denunciar, possam dizer basta a uma situação violenta. Uma vítima demora em média 13 anos a pedir ajuda e 13 anos a sofrer violência é muito tempo”.
“O paradigma está errado: não há penas para agressores e as vítimas são postas em casas de abrigo”
Na opinião deste psicólogo forense o “paradigma está errado”, nomeadamente porque “em vez de se activarem medidas de coacção, de afastamento do agressor, faz-se aquilo que é mais fácil, que é colocar a vítima numa casa abrigo”.
Questionado sobre qual a sua maior preocupação, Mauro Paulino responde que são as denúncias que ficam sem pena e sem consequências. “As vítimas vão-se apercebendo da fragilidade do sistema e questionam-se se valerá a pena passarem por todo o processo e serem ainda afastadas de tudo e de todos”.
Muitas das vezes, este tipo de comportamentos violentos, são perceptíveis cedo, muitas vezes enquanto crianças e, nesses casos, é urgente uma intervenção psicológica precoce. “Há determinadas perturbações que não podemos diagnosticar numa criança, a personalidade ainda está num processo de desenvolvimento, mas quanto mais cedo nós intervirmos maior o potencial de mudar aquela realidade com que nos estamos a confrontar. Há uma necessidade urgente de termos uma intervenção mais precoce, mais preventiva”, afirma Mauro Paulino.
Visto o tratamento em idade precoce ter maior probabilidade de sucesso que em adulto, é importante conseguir identificar quais os comportamentos, que se encontram fora da norma numa criança. O psicólogo refere-os: “crianças que agridem, que têm frieza emocional, que não conseguem criar empatia com o outro e que demonstram défice emocional”. Ao detectar estes comportamentos, é importante que a criança seja acompanhada por um profissional, neste caso um psicólogo.
Neste sentido, Mauro Paulino elucida que o importante é determinar a causa para os comportamentos, uma vez que estes apenas se revelam ser sintomas de algo.
Mauro Paulino marcou presença na I Conferência intitulada “A vítima e a correlação da violência” que se realizou na passada segunda-feira, dia 28 de Maio no auditório da Biblioteca Municipal de Faro.
(Maria Simiris / Henrique Dias Freire)