A influência da atividade física sobre a depressão pode ser explicada por mecanismos biológicos e psicológicos. Para além dos benefícios no organismo, contribui também para uma maior autoestima e autoconfiança, ao mesmo tempo que potencia a interação social. «Uma das explicações tem a ver com a socialização. Se a atividade física for praticada em interação social, tanto melhor» esclarece Adilson Marques, autor principal do estudo. «Isto porque, quem sofre de depressão, passa demasiado tempo a pensar nos seus problemas. Quando damos uma atividade intensa a essa pessoa e um objetivo para cumprir, como ganhar um jogo, a pessoa alheia-se temporariamente desses pensamentos», acrescenta.
As perturbações depressivas, consideradas a principal causa de incapacidade e a segunda causa de perda de anos de vida saudáveis, caracterizam-se por uma tristeza profunda, pela diminuição da energia e pelo desinteresse nas atividades quotidianas. Alguns dos sintomas mais comuns são a falta de confiança e de autoestima, o sentimento injustificado de culpa, a diminuição da concentração e perturbações do sono e do apetite. Em casos extremos, pode mesmo levar ao suicídio.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que, em 2025, venham a existir cerca de 1,2 mil milhões de pessoas com mais de 60 anos a sofrer desta doença em todo o mundo. Contudo, há formas de a prevenir e tratar. Evitar o isolamento e manter hábitos de vida saudáveis, como uma alimentação equilibrada e a prática regular de atividade física, são essenciais para a prevenção da depressão no idoso.
O exercício é importante em qualquer idade, com comprovados benefícios para a saúde física e mental. Ajuda a prevenir doenças, tais como problemas cardíacos, obesidade, diabetes e cancro, para além de melhorar o humor e a autoestima. Existem recomendações específicas sobre a duração, frequência e intensidade da atividade física para cada faixa etária. No caso dos idosos, a OMS recomenda cerca de 30 minutos de atividade física de intensidade moderada – como caminhada, jardinagem ou tarefas domésticas – pelo menos cinco vezes por semana, ou três sessões semanais de 20 minutos de atividade física vigorosa – como caminhada rápida, ginástica ou transporte de pesos.
Contudo, como para grande parte dos idosos é necessário adequar o nível de esforço à respetiva condição física, nem sempre é possível atingir os níveis de exercício recomendados. Neste sentido, os resultados deste estudo tornam-se particularmente relevantes para os idosos mais vulneráveis, demonstrando que a sua saúde mental pode sair reforçada mesmo com a prática moderada de atividade física apenas uma vez por semana. É possível, portanto, obter benefícios através de algumas rotinas que impliquem movimento, como, por exemplo, a realização de tarefas domésticas, as deslocações ou a prática de exercício.
Neste estudo foram observadas algumas diferenças entre géneros. Tendo em conta que a depressão é mais prevalente nas mulheres (quase o dobro da incidência em relação aos homens), estas podem precisar de uma prática mais regular de atividade física (mais de uma vez por semana) para obterem os mesmos resultados que os homens.
Vencer a barreira da inércia
A inatividade física é um problema global e que afeta todas as faixas etárias, estimando-se que, em Portugal, atinja cerca de 77% da população, com óbvios custos para a saúde. De acordo com relatório do Programa Nacional para a Promoção da Atividade Física, 45% dos portugueses consideram que as principais barreiras à prática de exercício são a falta de motivação, a falta de acesso a infraestruturas, a falta de companhia e a falta de tempo.
As principais causas desta resistência parecem ser uma mistura de fatores sociodemográficos e estruturais. Em primeiro lugar, trata-se de uma questão de mentalidade, pois só muito recentemente se começou a valorizar a prática de exercício físico e a conotá-la com um certo estatuto. Em segundo lugar, as infraestruturas e o design arquitetónico não apelam a uma deslocação ativa. Ainda que esteja cada vez mais na moda ir a pé ou de bicicleta para o trabalho, até há pouco tempo tal era considerado um indicador de baixo estatuto socioeconómico. Em terceiro lugar, há um enorme desconhecimento das recomendações. Se uma pessoa achar que praticar exercício duas vezes por semana é suficiente, corre o risco de estar bem com a sua consciência e mal com o seu corpo. «Grande parte da atividade física dos adultos é feita nas deslocações», diz Adilson Marques, investigador do Instituto de Saúde Ambiental da Faculdade de Medicina de Lisboa. «Como nem toda a gente tem tempo para ir ao ginásio, durante as deslocações pode aumentar-se os níveis diários de atividade física. Mas nós quase não temos ciclovias nem passeios, e a calçada portuguesa é muito bonita, mas não é prática. Nos países em que as infraestruturas facilitam a deslocação ativa, o índice de atividade física sobe bastante.»
Perante este cenário, importa criar políticas dirigidas à saúde mental que ajudem a derrubar estes obstáculos e que incentivem a prática regular de atividade física. Não só entre os mais velhos, mas como parte integrante de uma estratégia global para a promoção da saúde. Neste domínio, Adilson Marques é perentório: «Precisamos de estratégias de mudança comportamental, e isso não é fácil. É importante passar a mensagem dos benefícios de uma vida ativa desde cada vez mais cedo, para que os hábitos se enraízem.»
Num país como Portugal, que começa a encarar esta questão com maior seriedade, a ação do médico de família poderá ser determinante, através da inclusão dos índices de atividade física na lista dos chamados «sinais vitais». Tal como mede a temperatura ou a tensão arterial, o médico poderia questionar o paciente sobre as suas rotinas de atividade física. Ao detetar situações de risco, a prescrição de exercício poderá contribuir para uma mudança de comportamento.
Por outro lado, sendo a solidão um dos fatores que mais contribui para a depressão nos idosos, manter a socialização com os amigos e a família, a par de uma integração na comunidade, é crucial, nomeadamente através de atividades aprazíveis e que estimulem novos relacionamentos. «O ideal era que as pessoas retirassem prazer da atividade física e que não tivessem de a fazer por obrigação», acrescenta o investigador, que é também professor na Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa. «É importante conhecer a oferta comunitária. Atividades de dança, de caminhada, um clube de marcha… seja o que for. Esse é o tipo de atividades que as pessoas mais desfrutam. E sabemos que quando as pessoas têm noção das várias atividades oferecidas pela vizinhança, aumentam os níveis de atividade física, com todos os benefícios associados.»
Inês Grosa – ISAMB – Instituto de Saúde Ambiental da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
(2020 – Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva)