A cidade de Tavira apresenta-se como uma das mais interessantes do Algarve, ainda protegida pela selvajaria do betão desordenado. Com o seu Rio Gilão a desaguar na Ria Formosa acaba por apresentar um encanto natural entre uma paisagem a norte mais rural e outra a sul mais marítima, mais ligada ao mar com todas as actividades inerentes do barrocal versus marítimo. A arquitectura é a grande imagem de marca desta encantadora cidade, com as suas fachadas de cariz clássico, com os seus telhados de tesoura ou tesouro tão típicos e característicos de Tavira, que aparecendo em tantas pinturas e postais ilustrados acabam por dar a grande imagem e relevo à cidade, reforçando esta original tradição arquitectónica.
Tavira encontra-se numa concha a nível topográfico, o que lhe confere uma imagem de presépio encantado e protegido!! No entanto, ao longo dos tempos, infelizmente este ambiente bucólico tem-se vindo a degradar gradualmente a nível das arquitecturas e soluções urbanísticas por falta de gosto e soluções desajustadas para a realidade de Tavira e seus arredores! Urbanizações desenvolvidas em continuidade da malha urbana existente ou mesmo separada/afastada desta denotam uma desconexão total com o existente e sem relação estética e ou formal cultural e mesmo social com o passado com a História com a tal imagem de marca, com a realidade e valores intrínsecos e estéticos do Algarve e mesmo com um certo equilíbrio lógico do chamado bom senso e bom gosto. Tudo começa a parecer mais uma manta de retalhos, onde cada promotor ou arquitecto vai deambulando as suas criatividades sem respeito ou mesmo sensibilidade e visualização do global do conjunto e de uma lógica de desenvolvimento sustentável e lógico /formal do conjunto.
A construção do grande centro comercial é um bom, ou diria, um mau exemplo desta situação aberrante que tende a piorar. Quem vai às salinas e olha para Tavira com a sua silhueta típica, logo se apercebe destes erros cometidos ao longo dos anos e que estranhamente continuam a persistir nesses mesmos devaneios, com soluções desajustadas feias e completamente desenquadradas na malha urbana existente não só a nível formal volumétrica estético e cultural. Tamanhos e estilos despropositados têm vindo a estragar e deturpar esse tal postal ilustrado do Algarve, na tentativa de importar estilos e imagens do estrangeiro, algumas de duvidoso gosto, mesmo nos países de sua origem e, claro, completamente desenquadradas do seu meio envolvente aqui dos “Algarves”. Essa tal Tavira romântica, que tantos apreciam e procuram, rapidamente se transforma e adquire uma imagem mais parecida com um subúrbio caótico e sem lógica de alguma qualquer cidade quase do terceiro mundo!
O que resta e começa a ser já escasso no cento histórico, que vale pequenas fortunas e só para alguns compradores endinheirados, tal como peças de museu raras e somente para algumas elites mais sofisticadas e estrangeiras. Sim ao desenvolvimento, sim aos centros comerciais, sim às marinas, sim às urbanizações, sim ao progresso, mas não assim desordenado, sem quase zonas verdes, com imagens de pseudo-vanguarda, com estilos minimalistas feitos à pressa de uma forma industrial pré-fabricado, sem estilo ou referências arquitectónicas quaisquer e tirados de qualquer computador numa manhã chuvosa e se calhar vendidas como obras de arte falsas como peças de arte do antigo Egipto feitas na China e vendidas num antiquário suspeito, num beco mais escondido da Medina do Cairo! Não andamos a fazer filmes do Indiana Jones nos desertos do sul de Espanha, pretendemos coisas serias com substância e conteúdo! “Não às falsificações”!
O que se tem feito e construído de uma forma geral, claro que tem havido excepções, não tem qualquer base e fundamento histórico, cultural e social com Tavira. Lamento dizer, mas há falta de imaginação, falta de gosto e falta uma verdadeira política de solos de PDM com substância e directivas, essas sim, fortes para tentar proteger e valorizar essa imagem de qualidade que se tem vindo a perder rapidamente aos olhos descarados de toda a gente. Um dia quando acordarmos de manhã já não iremos encontrar essa Tavira romântica que deixámos na noite anterior quando fomos para a cama dormir!
A maior parte das urbanizações não possui qualquer desenho ou verdadeira concepção urbana, geralmente com ruas no meio e casas ou prédios colocados ao longo dessas mesmas ruas, com poucas ou quase nenhumas zonas verdes, raramente são importantes, e com destaque nesses novos loteamentos. Não existe nenhuma tentativa de separar artérias viárias das zonas de lazer e comerciais e lúdicas, criando uma espécie de hierarquia de zonas e funções para um melhor equilíbrio e qualidade vivencial. Nem sequer se toma como referência os ensinamentos e filosofias da carta de Atenas, é tudo muito pobre repetitivo, sem imaginação ou estudo e uma real reflexão sobre todas as problemáticas que estão envolvidas na evolução das cidades É necessário parar, escutar, olhar e analisarmos para onde vamos e como queremos ir e quais os resultados e objectivos pretendidos. Qual a estratégia de solos e construção e renovação urbana e seus impactos positivos e ou negativos para a sociedade e futuro de Tavira? Pretendemos o postal ilustrado, a tal imagem romântica ou simplesmente um progresso desnorteado sem regras nem limites, sem essência, em suma, um estilo livre desordenado, desprovido de lógica e essência real, mais ligado pelo menos à tradição e história tão rica de Tavira? Em vez de procurar o idílico, parece que existe uma tendência para o abismo e para o caos, aprovam-se projectos de arquitectura de duvidoso gosto, minimalistas, como contentores pintados de branco, como um restaurante construído recentemente nas margens do Rio Gilão, simplesmente horrível, arquitectura fraca, sem gosto, sem nenhum contexto, tirada certamente de um arquivo-memória de um portátil tipo tablet enviado por email para a Câmara Municipal para aprovação. Ai, as novas tecnologias o que dão, o que conseguem enganar quando todos dormem ou estão anestesiados!
Persiste-se no conceito prédio / passeio em vez de se privilegiar as zonas verdes! Perdem-se oportunidades de alterar este estado de coisas, por exemplo com a nova ponte, mais uma vez completamente sem contexto e respeito por Tavira, mais tirada de um computador de um gabinete qualquer, que se calhar já fez uma série delas pelo país fora ou até para as Áfricas. Não há qualquer respeito ou bom gosto ou imaginação. Poderia ser uma ponte pedonal com uma praça no meio para se poder estar e apreciar Tavira. um pouco idêntica à ponte romana de cariz classicista, por cima de um grande espelho de água com iluminação e mesmo com estátuas em ambas as margens do Gilão, assim todo o conjunto faria um todo, uma grande sala de estar e de contemplação, a nova ponte seria como uma verdadeira obra de arte e não uma mera passagem para a outra margem. Uma ponte em ferro ou em pedra ou mesmo em madeira com formas geométricas mais arrojadas, como uma escultura ou simplesmente clássica, em suma, qualquer coisa parece ter sido melhor do que o que mais uma vez erradamente se vai fazer sem pensar. É a teoria do mais fácil, do que dá o dinheiro imediato na tal sociedade de consumo, rapidamente, sem olhar às consequências. Pergunto, será que Budapeste seria mais interessante com pontes como querem impingir agora aqui para Tavira? Claro que não, é óbvio não é preciso ser arquitecto para ver isso!!
Temos depois o velho quartel, o terminal da rodoviária, o terreno por baixo da ponte da 125, o jardim da Alagoa, enfim, outra margem do rio junto ao antigo Pingo Doce. Isto são vários exemplos de espaços e edifícios que estão desaproveitados e já desajustados às novas potenciais funções e que poderiam ser transformados em hotéis ou universidades ou mesmo na nova casa do município ou museus ou centros de convenção, etc., qualquer coisa menos o que lá existe neste momento. Os espaços exteriores que foram mencionados anteriormente poderiam tornar-se grandes zonas verdes junto ao rio, com anfiteatros com espelhos de água, zonas de lazer, estátuas etc, tudo com um grande potencial e completamente desaproveitado, muitas vezes por falta de imaginação ou birrinhas cooperativas, já que não seriam necessárias grandes verbas para recuperar estes espaços, dar-lhes dignidade, nova vida e utilidade pública, eles estão lá mas ninguém os consegue usar na sua plenitude. Temos, finalmente, e mais uma vez outro caso berrante o cinema novo, que vem substituir o antigo, aí temos outro grande mamarracho com uma torre que ninguém sabe para que efeito e o propósito, talvez para observar qualquer possível incêndio, ou será que vai ser o novo quartel dos bombeiros, não há contexto algum minimalista, é desconexo com o casco histórico envolvente, erro total na sua localização. Melhor teria sido junto às piscinas municipais ou mesmo perto do Plaza, mamaracho com mamarracho iriam bem os dois juntos. Uma arquitectura mais uma vez tirada de um computador portátil de uma playstation feita na China por uma empresa do sillicon valley! Questiono, onde estes arquitectos são formados? Alguém disse que depois da segunda guerra mundial a Europa se tornaria americanizada, agora passado tanto tempo começo a perceber! Só que existe uma nova ameaça é a China, a combinação dos dois vai ser devastadora! Em vez deste novo mamarracho talvez um hotel, já que parece que quem anda a comprar Tavira são os estrangeiros e precisam de alojamento temporário enquanto procuram casa para comprar nessa tal cidade romântica!
No futuro todas as cidades vão competir entre si para captar turistas investidores estudantes, etc… ciência, cultura, artes, e virem a fazer parte desse grande futuro da Europa da União Euroepia, mas esse futuro também se constrói com coisas do passado. Será que Tavira irá fazer parte desse futuro competitivo? Ou esta destruição com soluções aberrantes e mamarrachos irão transformá-la em mais um subúrbio de Lisboa??
Equilíbrio estético, ecológico, cultural e económico são os pilares de uma sociedade sustentável!!!!
É necessário parar e escutar e olhar!!! O futuro ou vem ter connosco ou nós vamos ter com ele!! Eu sou daqueles que pretendo ir ao encontro do futuro e quando o encontrar digo-lhe nos olhos que venho de uma terra distante e do passado onde outrora viveram “dinossauros e cavalos alados”.