Numa carta aberta em que procura esclarecer o que “testemunhou” no caso do padre acusado de abuso denunciado em 1999 ao anterior patriarca, José Policarpo, e revelado esta semana pelo jornal Observador, D. Manuel Clemente diz aceitar que “este caso e outros do conhecimento público e que foram tratados no passado, não correspondem aos padrões e recomendações que hoje” todos querem “ver implementados”.
Segundo Manuel Clemente, o seu antecessor “acolheu e tratou o caso em questão tendo em conta as recomendações canónicas e civis da época e o diálogo com a família da vítima. O sacerdote foi afastado da paróquia onde estava e nomeado para servir numa capelania hospitalar“.
Uma vez patriarca, marquei um encontro com a vítima, encontro esse que foi adiado a pedido da mesma. Em 2019, regressado do Encontro dos Presidentes das Conferências Episcopais da Europa sobre o tema ‘A proteção dos menores na Igreja’ promovida pelo Santo Padre em Roma, sobre a temática dos abusos, pedi um novo encontro à vítima, com quem conversei presencialmente. A sua preocupação era a não haver uma repetição do caso, sem desejar de forma expressa, a sua divulgação
Algo que, prossegue, “não entendi, como não entendo hoje, ter estado perante uma renovada denúncia da feita em 1999. Se assim tivesse sido, a mesma teria sido remetida à Comissão Diocesana, criada por essa altura, e teriam sido cumpridos todos os procedimentos recomendados à data. Recordo que as regras e recomendações de 16 de julho de 2020 são posteriores”.
E sobre o padre em questão, o que diz o cardeal patriarca? “Foi acompanhado e até à atualidade nunca houve qualquer denúncia ou reparo sobre o seu comportamento moral. Nunca ninguém comunicou, nem sob anonimato, qualquer acusação. Aliás, as medidas cautelares previstas para estes casos visam sobretudo a proteção de possíveis futuras vítimas, o que pode estar acautelado, em especial quando, passados anos, nunca mais houve denúncias nem indícios“, garante D. Manuel Clemente.
Sublinhando que “desde a primeira hora que no Patriarcado de Lisboa dei instruções para que a Tolerância Zero e a Transparência Total sejam regra conhecida de todos, aceito que este caso e outros do conhecimento público e que foram tratados no passado, não correspondem aos padrões e recomendações que hoje todos queremos ver implementados“.
Até à data foram encaminhadas à Comissão Diocesana do Patriarcado de Lisboa, por mim ou diretamente pelas vítimas, três denúncias. A primeira foi acompanhada pela diocese de Vila Real, a segunda está neste momento a corresponder ao que o Dicastério para a Doutrina da Fé decidiu, após as recomendações que a nossa Comissão me deu. Mal tenhamos o desfecho sobre a mesma, será divulgado. A terceira e mais recente que envolve mensagens inapropriadas e enviadas por WhatsApp está também em apreciação pela Comissão, que já me fez recomendações a que dei imediato seguimento.
D. Manuel Clemente deixa ainda um apelo: “Que ninguém tenha medo de denunciar. Nas Comissões Diocesanas, na Comissão Independente, na PGR, na PJ, aos media, onde e junto de quem se sentirem mais seguros“.
Leia na íntegra a carta de D. Manuel Clemente
O caso foi noticiado, esta quarta-feira, pelo jornal Observador, que dá conta de que o atual Cardeal Patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, “teve conhecimento de uma denúncia de abusos sexuais de menores relativa a um sacerdote do Patriarcado e chegou mesmo a encontrar-se pessoalmente com a vítima, mas optou por não comunicar o caso às autoridades civis e por manter o padre no ativo com funções de capelania”.
“Além disso, o sacerdote continuou a gerir uma associação privada onde acolhe famílias, jovens e crianças, com o conhecimento de D. Manuel Clemente. Tudo, porque, justifica o próprio Patriarcado ao Observador, a vítima, que alega ter sofrido os abusos na década de 1990, não quis que o seu caso fosse público e queria apenas que os abusos não se repetissem“, noticia o jornal.
- Texto: SIC Notícias, televisão parceira do POSTAL