A sociologia da cultura e das artes permitiria realizar diagnósticos das dinâmicas culturais em Portugal, caracterizar as formas organizativas e actividades dos profissionais das áreas culturais. No âmbito da economia da cultura verifica-se uma enorme carência de estudos fundamentados sobre a realidade nacional e regional, também sobre o tecido socioprofissional.
Entre as dezenas de profissões existentes na área de cultura (escritores, actores, cantores, artistas visuais, bibliotecários, editores, técnicos de conservação e restauro, cineastas, arqueólogos, documentalistas,…) surgiu nas últimas décadas do século XX em Portugal, sobretudo nos anos 90, consequência da construção de infraestruturas culturais e de um conjunto de iniciativas de grande projecção, a actividade de “programador”.
Sobre a programação artística ocorreu no final do último milénio uma tentativa de reflexão e questionamento da profissão envolvendo muitas dezenas de profissionais do sector público, privado e associativo ligados às artes do espectáculo (teatro, dança, música, festivais,..), dos quais muitos eram também directores ou responsáveis por estruturas artísticas profissionais.
Era desígnio do movimento a criação de uma Associação Portuguesa de Programadores, iniciativa vista com interesse pelo Ministério da Cultura / Instituto Português das Artes do Espectáculo – IPAE que esteve presente nas reuniões gerais realizadas em Montemor-o-Novo, Guimarães e Lisboa.
A figura do programador institucional surgiu por necessidade conjuntural, através de convite a especialistas e decisão da administração. A existência formal ou legal da profissão, permitiria estabelecer as condições de acesso, académicas, de formação profissional ou de experiências, sobretudo para as actividades regulares.
Nas estruturas actuais, salvo raras excepções, são estruturalmente reduzidas na sua composição, a mesma pessoa desenvolve várias funções, incluindo a de programador. É frequente nas pequenas estruturas, que são a maioria, que directores sejam também programadores, encenadores e até actores.
No mundo das artes existem genericamente dois grandes grupos profissionais: os criadores e os mediadores (curadores/comissários, directores, galeristas, programadores de teatros e centros culturais, …). Outras profissões técnicas participam no processo ligadas à realização, produtores, divulgadores, técnicos de som e luzes, vídeoplastas, cenógrafos, monitores de serviço educativo, assistentes de sala,…
A mediação ocorre numa primeira fase entre o(s) programador(es) que propõem, com critérios e razões que deverão ser explicitadas, e a administração que decide sobre a sua realização, orçamentos e meios a envolver.
A mediação do programa dirige-se a cidadãos/públicos, com objectivos diferenciados consoante se trate de áreas geridas com recursos públicos, que neste caso se deverão centrar prioritariamente na democratização do acesso, no desenvolvimento educativo e cultural, ou de iniciativa das indústrias culturais privadas ligadas aos mercados, à promoção dos produtos culturais com retorno nos sistemas de venda e bilheteiras.
Estes dois sistemas mediadores podem e devem articular-se sem adulterar a natureza de cada um.
Como em todas as actividades a programação não é neutra, pela análise atenta apercebemo-nos dos objectivos, das prioridades sociais, da coerência das linhas programáticas, dos meios envolvidos. A avaliação dos objectivos propostos e das actividades concretizadas são elementos insubstituíveis, introduzem a monitorização de resultados e eventuais desvios, de ponderação para melhoria ou substituição.
O que se programa? Para quem? À volta destas questões encontra-se o fundamento e equilíbrio da programação, a sociedade é heterogénea na sua composição etária, género, escolaridade, residência, emprego, interesses culturais e educativos… Não há “o público” mas públicos diversos.
No Algarve, “Faro-2005 Capital Nacional da Cultura” foi uma experiência importante, provavelmente única na região, porque se constituiu uma equipa de programação, com especialistas para as artes visuais, dança e novo circo, teatro, música, cinema e literatura, que se reuniam e trabalharam conjuntamente na permuta de informações e colaborações.
(Artigo publicado no Caderno Cultura.Sul de novembro)